Sonetos sobre Nuvens de Cruz e Souza

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Sonetos de nuvens de Cruz e Souza. Leia este e outros sonetos de Cruz e Souza em Poetris.

Deixai Que Deste Álbum Na Folha Delicada

Deixai que deste álbum na folha delicada
Eu venha difundir meus rudes pensamentos
Deixai que as pobres rimas, uns nadas poeirentos
Eu possa transudar da mente entrenublada!…

Deixai que de minh’alma na fibra espedaçada
Eu busque inda vibrar uns cantos tardos, lentos!…
Bem cedo os vendavais, aspérrimos, cruentos
Ai! Tudo arrojarão à campa amargurada!

Porém qu’importa isso! dos mares desta vida
Nos pávidos, estranhos, enormes escarcéus
Se alguma coisa val, és tu, ó luz querida!…

Rasguemos do porvir os áditos, os véus!…
Riamos sem cessar, embora em dor sentida!…
Também as nuvens negras conglobam-se nos céus!

Ambos

Vão pela estrada, à margem dos caminhos
Arenosos, compridos, salutares,
Por onde, a noite, os límpidos luares
Dão às verduras leves tons de arminhos.

Nuvens alegres como os alvos linhos
Cortam a doce compridão dos ares,
Dentre as canções e os tropos singulares
Dos inefáveis, meigos passarinhos.

Do céu feliz na branda curvidade,
A luz expande a inteira alacridade,
O mais supremo e encantador afago.

E com o olhar vibrante de desejos
Vão decifrando os trêmulos arpejos,
E as reticências que produz o vago.

Luar

Pelas esferas, nuvens peregrinas,
Brandas de toques, encaracoladas,
Passam de longe, tímidas, nevadas,
Cruzando o azul sereno das colinas.

Sombras da tarde, sombras vespertinas
Como escumilhas leves, delicadas,
Caem da serra oblonga nas quebradas,
Vão penumbrando as coisas cristalinas.

Rasga o silêncio a nota chã, plangente,
Da Ave-Maria, — e então, nervosamente,
Nuns inefáveis, espontâneos jorros

Esbate o luar, de forma admirável,
Claro, bondoso, elétrico, saudável,
Na curvilínea compridão dos mortos.

Hóstias

A Emílio de Menezes

Nos arminhos das nuvens do infinito
Vamos noivar por entre os esplendores,
Como aves soltas em vergéis de flores,
Ou penitentes de um estranho rito.

Que seja nosso amor — sidério mito! —
O límpido turíbulo das dores,
Derramando o incenso dos amores
Por sobre o humano coração aflito.

Como num templo, numa clara igreja,
Que o sonho nupcial gozado seja,
Que eu durma e sonhe nos teus níveos flancos.

Contigo aos astros fúlgidos alado,
Que sejam hóstias para o meu noivado
As flores virgens dos teus seios brancos!

Siderações

Para as Estrelas de cristais gelados
As ânsias e os desejos vão subindo,
Galgando azuis e siderais noivados
De nuvens brancas a amplidão vestindo…

Num cortejo de cânticos alados
Os arcanjos, as cítaras ferindo,
Passam, das vestes nos troféus prateados,
As asas de ouro finamente abrindo…

Dos etéreos turíbulos de neve
Claro incenso aromal, límpido e leve,
Ondas nevoentas de Visões levanta…

E as ânsias e os desejos infinitos
Vão com os arcanjos formulando ritos
Da Eternidade que nos Astros canta…

Auréola Equatorial

A Teodoreto Souto

Fundi em bronze a estrofe augusta dos prodígios,
Poetas do Equador, artísticos Barnaves;
Que o facho — Abolição — rasgando as nuvens graves
De raios e bulcões — triunfa nos litígios!

— O rei Mamoud, o Sol, vibrou p’raquelas bandas
do Norte — a grande luz — elétrico, explodindo,
Assim como quem vai, intrépido, subindo
À luz da idade nova — em claras propagandas.

— Os pássaros titãs nos seus conciliábulos,
— Chilreiam, vão cantando em místicos vocábulos,
Alargam-se os pulmões nevrálgicos das zonas;

Abri alas, abri! — Que em túnica de assombros,
Irá passar por vós, com a Liberdade aos ombros,
Como um colosso enorme o impávido Amazonas!

Ave! Maria

Ave! Maria das Estrelas, Ave!
Cheia de graça do luar, Maria!
Harmonia de cântico suave,
Das harpas celestiais branda harmonia…

Nuvem d’incensos através da nave
Quando o templo de pompas irradia
E em prantos o órgão vai plangendo grave
A profunda e gemente litania…

Seja bendito o fruto do teu ventre,
Jesus, mais belo dentre os astros e entre
As mulheres judaicas mais amado…

Ó Luz! Eucaristia da beleza,
Chama sagrada no Evangelho acesa,
Maravilha do Amor e do Pecado!

Quando Apareces, Fica-Se Impassível

Quando apareces, fica-se impassível
E mudo e quedo, trêmulo, gelado!…
Quer-se ficar com atenção, calado,
Quer-se falar sem mesmo ser possível!.

Anda-se c’o a alma n’um estado horrível
O coração completamente ervado!…
Quer-se dar palmas, mas sem ser notado,
Quer-se gritar, n’uma explosão temível!…

Sobe-se e desce-se ao país das fadas,
Vaga-se co’as nuvens das mansões douradas
Sob um esforço colossal, titânico!…

E as idéias galopando voam…
Então lá dentro sem parar, ressoam
As indomáveis convulsões do crânio!!…