Mater Originalis
Forma vermicular desconhecida
Que estacionaste, mĂsera e mofina,
Como quase impalpável gelatina,
Nos estados prodrĂ´micos da vida;O hierofante que leu a minha sina
Ignorante Ă© de que Ă©s, talvez, nascida
Dessa homogeneidade indefinida
Que o insigne Herbert Spencer nos ensina.Nenhuma ignota uniĂŁo ou nenhum nexo
A contingência orgânica do sexo
A tua estacionária alma prendeu…Ah! de ti foi que, autĂ´noma e sem normas,
Oh! MĂŁe original das outras formas,
A minha forma lĂşgubre nasceu!
Sonetos sobre Originais
10 resultadosMetamorfose
A Carlos Ferreira
O sol em fogo pelo ocaso explode
Nesse estertor, que os crânios assoberba.
Vivo, o clarĂŁo, nuns frocos exacerba
Dos ideais a original nevrose.Da natureza os anafis mouriscos
Ante o cariz da atmosfera muda,
Soam queixosos, numa nota aguda,
Da luz que esvai-se aos derradeiros discos.O pensamento que flameja e luta
Nos ares rasga aprofundado sulco…
A sombra desce nos lisins da gruta;E a lua nova — a peregrina Onfale,
Como em um plaustro luminoso, hiulco,
Surge através dos pinheirais do vale.
Soneto 253 A Renato Russo
Embora original, gĂŞnio, perito,
do nosso rock um raro uirapuru,
vivia ensimesmado e jururu,
talvez por nĂŁo ser grego nem bonito.Entendo a sua angĂşstia e o seu conflito,
meu Ădolo, meu mártir, meu guru!
Causou vocĂŞ, primeiro, um sururu;
depois, tristeza, e entĂŁo calou seu grito.Respeito quem Ă© triste, ou aparenta.
Os outros grandes brincam: Raul, Rita,
ou cospem mera raiva barulhenta.Cazuza também brinca, mas medita.
Arnaldo Antunes testa, experimenta.
Renato faz da dor a dor: maldita!
Harpas Eternas
Hordas de Anjos titânicos e altivos,
Serenos, colossais, flamipotentes,
De grandes asas vĂvidas, frementes,
De formas e de aspectos expressivos.Passam, nos sĂłis da GlĂłria redivivos,
Vibrando as de ouro e de Marfim dolentes,
Finas harpas celestes, refulgentes,
Da luz nos altos resplendores vivosE as harpas enchem todo o imenso espaço
De um cântico pagão, lascivo, lasso,
Original, pecaminoso e brando…E fica no ar, eterna, perpetuada
A lânguida harmonia delicada
Das harpas, todo o espaço avassalando.
Salve! Rainha!
Ă“ sempre virgem Maria, concebida
sem pecado original, desde o
primeiro instante do teu ser…MĂŁe de MisericĂłrdia, sem pecado
Original, desde o primeiro instante!
Salve! Rainha da MansĂŁo radiante,
Virgem do Firmamento constelado…Teu coração de espadas lacerado,
Sangrando sangue e fel martirizante,
Escute a minha Dor, a torturante,
A Dor do meu soluço eternizado.A minha Dor, a minha Dor suprema,
A Dor estranha que me prende, algema
Neste Vale de lágrimas profundo…Salve! Rainha! por quem brado e clamo
E brado e brado e com angĂşstia chamo,
Chamo, atravĂ©s das convulsões do mundo!…
MĂşsica Da Hora
Habito a pausa no hábito da pauta
música de silêncios e soluços
a refrear desmandos dos impulsos
que se querem agudos sons de flauta.A vida Ă© toda mĂşsica em seu curso
do grito original em rima incauta
ao sussurro que se ouve em cama infausta
nesse fim dissonante do percurso.O tempo se encarrega do metrĂ´nomo
unido a dois ponteiros de um cronĂ´metro
em que o delgado veste-se de momopara alegrar as horas do pequeno
que dança a marcha gris em chão sereno
fugindo ao dois por quatro do abandono.
O Soneto
Nas formas voluptuosas o soneto
Tem fascinante, cálida fragrância
E as leves, langues curvas de elegância
De extravagante e mórbido esqueleto.A graça nobre e grave do quarteto
Recebe a original intolerância,
Toda a sutil, secreta extravagância
Que transborda terceto por terceto.E como um singular polichinelo
Ondula, ondeia, curioso e belo,
O Soneto , nas formas caprichosas.As rimas dĂŁo-lhe a pĂşrpura vetusta
E nas mais rara procissĂŁo augusta
Surge o Sonho das almas dolorosas…
PrĂł Pudor
Todas as noites ela me cingia
Nos braços, com brandura gasalhosa;
Todas as noites eu adormecia,
Sentindo-a desleixada a langorosa.Todas as noites uma fantasia
Lhe emanava da fronte imaginosa;
Todas as noites tinha uma mania,
Aquela concepção vertiginosa.Agora, há quase um mês, modernamente,
Ela tinha um furor dos mais soturnos,
Furor original, impertinente…Todas as noites ela, ah! sordidez!
Descalçava-me as botas, os coturnos,
E fazia-me cĂłcegas nos pĂ©s…
Bem Mostrou o Pintor Estilo Agudo
Bem mostrou o pintor estilo agudo
No retrato, senhora, que vos mando,
Pois nĂŁo sĂł o parecer foi retratando,
Mas os efeitos com mais alto estudo.Se vai mudo ante vĂłs, eu fico mudo;
Se surdo, e cego, bem cego, e surdo ando;
Se morto, a vida vai-se-me acabando;
Em fim que vai conforme a mim em tudo.Mas na ventura fica avantajado,
Que vai (com gosto vosso) Ă vossa mĂŁo,
Onde será melhor visto, e tratado:Mercês, que se deviam por razão
Ao prĂłprio original, porque o traslado
Não vê, nem sente de que preço são.
Dionysio
Ungido para o fado e a nova festa
Meu carnaval profano já celebra
As quarentenas dĂvidas da carne
Na cela de costelas das mulheres.Como devasso réu, confesso fauno,
No vinho das delĂcias me declaro
Sem culpa e sem pecado original
Pois nessa pena sou igual a tantos.Já disse certa vez em cantoria:
De nada me arrependo e reconfirmo
Agora que o meu tempo é só de gozo.A vida que me dou não dá guarida
Nem guarda desalentos de tristeza
Somente na alegria Ă© que me morro.