Sonetos sobre Passos de Luís de CamÔes

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Sonetos de passos de Luís de CamÔes. Leia este e outros sonetos de Luís de CamÔes em Poetris.

Quando O Sol Encoberto Vai Mostrando

Quando o Sol encoberto vai mostrando
ao mundo a luz quieta e duvidosa,
ao longo de ĂŒa praia deleitosa,
vou na minha inimiga imaginando.

Aqui a vi, os cabelos concertando;
ali, co a mĂŁo na face tĂŁo fermosa;
aqui, falando alegre, ali cuidosa;
agora estando queda, agora andando.

aqui esteve sentada, ali me viu,
erguendo aqueles olhos tĂŁo isentos;
aqui movida um pouco, ali segura;

qui se entristeceu, ali se riu;
enfim, nestes cansados pensamentos
passo esta vida vĂŁ, que sempre dura.

Por Cima Destas Águas, Forte E Firme

Por cima destas ĂĄguas, forte e firme,
irei por onde as sortes ordenaram,
pois, por cima de quantas me choraram
aqueles claros olhos, pude vir me.

JĂĄ chegado era o fim de despedir me,
jĂĄ mil impedimentos se acabaram,
quando rios de amor se atravessaram
a me impedir o passo de partir me.

Passei os eu com Ăąnimo obstinado,
com que a morte forçada e gloriosa
faz o vencido jĂĄ desesperado.

Em que figura, ou gesto desusado,
pode jĂĄ fazer medo a morte irosa,
a quem tem a seus pés rendido e atado?

Nunca em amor danou o atrevimento

Nunca em amor danou o atrevimento;
Favorece a Fortuna a ousadia;
Porque sempre a encolhida cobardia
De pedra serve ao livre pensamento.

Quem se eleva ao sublime Firmamento,
A Estrela nele encontra que lhe Ă© guia;
Que o bem que encerra em si a fantasia,
São u~as ilusÔes que leva o vento.

Abrir-se devem passos Ă  ventura;
Sem si próprio ninguém serå ditoso;
Os princĂ­pios somente a Sorte os move.

Atrever-se Ă© valor e nĂŁo loucura;
PerderĂĄ por cobarde o venturoso
Que vos vĂȘ, se os temores nĂŁo remove.

Quanto Mais me Paga, Mais me Deve

Passo por meus trabalhos tĂŁo isento
De sentimento grande nem pequeno,
Que sĂł por a vontade com que peno
Me fica Amor devendo mais tormento.

Mas vai-me Amor matando tanto a tento,
Temperando a triaga c’o veneno,
Que do penar a ordem desordeno,
Porque nĂŁo mo consente o sofrimento.

Porém se esta fineza o Amor sente
E pagar-me meu mal com mal pretende,
Torna-me com prazer como ao sol neve.

Mas se me vĂȘ co’os males tĂŁo contente,
Faz-se avaro da pena, porque entende
Que quanto mais me paga, mais me deve.

O Dia Em Que Eu Nasci, Moura E Pereça

O dia em que eu nasci, moura e pereça,
nĂŁo o queira jamais o tempo dar,
nĂŁo torne mais ao mundo, e, se tornar,
eclipse nesse passo o sol padeça.

luz lhe falte, o sol se [lhe] escureça,
mostre o mundo sinais de se acabar,
nasçam-lhe monstros, sangue chova
o ar, a mãe ao próprio filho não conheça.

s pessoas pasmadas de ignorantes,
as lĂĄgrimas no rosto, a cor perdida,
cuidem que o mundo jĂĄ se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
que este dia deitou ao mundo a vida
mais desgraçada que jamais se viu!

Olhos Fermosos, Em Quem Quis Natura

Olhos fermosos, em quem quis Natura
mostrar do seu poder altos sinais,
se quiserdes saber quanto possais,
vede-me a mim, que sou vossa feitura.

Pintada em mim se vĂȘ vossa figura,
no que eu padeço retratada estais;
que, se eu passo tormentos desiguais,
muito mais pode vossa fermosura.

De mim nĂŁo quero mais que o meu desejo:
ser vosso; e sĂł de ser vosso me arreio,
porque o vosso penhor em mim se assele.

!TĂŁo me lembro de mim quando vos vejo,
nem do mundo; e nĂŁo erro, porque creio,
que, em lembrar-me de vĂłs, cumpro com ele.

O dia em que nasci moura e pereça,

O dia em que nasci moura e pereça,
NĂŁo o queira jamais o tempo dar;
NĂŁo torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o Sol padeça.

A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lĂĄgrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo jĂĄ se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao Mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!

De Um TĂŁo Felice Engenho, Produzido

De um tĂŁo felice engenho, produzido
de outro, que o claro Sol nĂŁo viu maior,
Ă© trazer cousas altas no sentido,
todas dinas de espanto e de louvor.

Museu foi antiquĂ­ssimo escritor,
filĂłsofo e poeta conhecido,
discĂ­pulo do MĂșsico amador
que co som teve o Inferno suspendido.

Este pĂŽde abalar o monte mudo,
cantando aquele mal, que eu jĂĄ passei,
do mancebo de Abido mal sisudo.

Agora contam jĂĄ (segundo achei),
Passo, e o nosso BoscĂŁo, que disse tudo
dos segredos que move o cego Rei.