Amor, Co A Esperança Já Perdida
Amor, co a esperança já perdida,
teu soberano templo visitei;
por sinal do naufrágio que passei,
em lugar dos vestidos, pus a vida.Que queres mais de mim, que destruída
me tens a glória toda que alcancei?
Não cuides de forçar me, que não sei
tornar a entrar onde não há saída.Vês aqui alma, vida e esperança,
despojos doces de meu bem passado,
enquanto quis aquela que eu adoro:nelas podes tomar de mim vingança;
e se inda não estás de mim vingado,
contenta te com as lágrimas que choro.
Sonetos sobre Sinais
22 resultadosMe Vejo com Memórias Perseguido
Se quando vos perdi, minha esperança,
A memória perdera juntamente
Do doce bem passado e mal presente,
Pouco sentira a dor de tal mudança.Mas Amor, em quem tinha confiança,
Me representa mui miudamente
Quantas vezes me vi ledo e contente,
Por me tirar a vida esta lembrança.De cousas de que apenas um sinal
Havia, porque as dei ao esquecimento,
Me vejo com memórias perseguido.Ah dura estrela minha! Ah grão tormento!
Que mal pode ser mor, que no meu mal
Ter lembranças do bem que é já passado?
Este Retrato Vosso é o Sinal
Este retrato vosso é o sinal
ao longe do que sois, por desamparo
destes olhos de cá, porque um tão claro
lume não pode ser vista mortal.Quem tirou nunca o sol por natural?
Nem viu, se nuvens não fazem reparo,
em noite escura ao longe aceso um faro?
Agora se não vê, ora vê mal.Para uns tais olhos, que ninguém espera
de face a face, gram remédio fora
acertar o pintor ver-vos sorrindo.Mas inda assim não sei que ele fizera,
que a graça em vós não dorme em nenhuma hora.
Falando que fará? Que fará rindo?
Lamento do Poeta Objectivo
Anda-me o amor tomando a própria vida,
como se, amando, eu existisse mais.
E leva-me o Destino em voz traída,
como se houvera encontros desiguais.A multidão me cerca, e, renascida,
já dela terei fome de sinais.
E, mal a noite se demora ardida,
o medo e a solidão me esfriam taisas cinzas desse amor que sacrifico.
Não é futura a só miséria. A queixa
também não é: e apenas aconteceno vácuo imenso que este amor me deixa,
quando maior, quando de si mais rico,
se dá de mundo em mundo, e lá me esquece.
XIV
Viver não pude sem que o fel provasse
Desse outro amor que nos perverte e engana:
Porque homem sou, e homem não há que passe
Virgem de todo pela vida humana.Por que tanta serpente atra e profana
Dentro d’alma deixei que se aninhasse?
Por que, abrasado de uma sede insana,
A impuros lábios entreguei a face?Depois dos lábios sôfregos e ardentes,
Senti duro castigo aos meus desejos
O gume fino de perversos dentes…E não posso das faces poluídas
Apagar os vestígios desses beijos
E os sangrentos sinais dessas feridas!
Pecadores
Ali – no canto escuro do jardim
não havia o menor sinal de gente…
Só nós dois… E eu então, sensualmente
beijei-te a boca… o seio… tudo enfim…Nem eu sei bem dizer o que se sente,
quando estreitei teu corpo junto a mim…
– Embriaguei-me talvez… completamente…
– naquele canto escuro do jardim…Fui ousado, bem sei… Dizias: – não!
– mas não pude te ouvir sentindo aquela
tão louca e indescritível sensaçãoE pequei. . . – Pecaria outro qualquer
– Foi mais culpado o Deus que te fez bela
e ele – o Demônio – que te fez mulher!
Se me Comovesse o Amor
Se me comovesse o amor como me comove
a morte dos que amei, eu viveria feliz. Observo
as figueiras, a sombra dos muros, o jasmineiro
em que ficou gravada a tua mão, e deixo o diacaminhar por entre veredas, caminhos perto do rio.
Se me comovessem os teus passos entre os outros,
os que se perdem nas ruas, os que abandonam
a casa e seguem o seu destino, eu saberia reconhecero sinal que ninguém encontra, o medo que ninguém
comove. Vejo-te regressar do deserto, atravessar
os templos, iluminar as varandas, chegar tarde.Por isso não me procures, não me encontres,
não me deixes, não me conheças. Dá-me apenas
o pão, a palavra, as coisas possíveis. De longe.
Dor
Há de ser uma estrada de amarguras
a tua vida. E andá-la-ás sozinho,
vendo sempre fugir o que procuras
disse-me um dia um pálido adivinho.“No entanto, sempre hás de cantar venturas
que jamais encontraste… O teu caminho,
dirás que é cheio de alegrias puras,
de horas boas, de beijos, de carinho…”E assim tem sido… Escondo os meus lamentos:
É meu destino suportar sorrindo
as desventuras e os padecimentos.E no mundo hei de andar, neste desgosto,
a mentir ao meu íntimo, cobrindo
os sinais destas lágrimas no rosto!
Casou-Se Nesta Terra Esta E Aquele
Casou-se nesta terra esta e aquele.
Aquele um gozo filho de cadela,
Esta uma donzelíssima donzela,
Que muito antes do parto o sabia ele.Casaram por unir pele com pele;
E tanto se uniram, que ele com ela
Com seu mau parecer ganha para ela,
com seu bom parecer ganha para ele.Deram-lhe em dote muitos mil cruzados,
Excelentes alfaias, bons adornos,
De que estão os seus quartos bem ornados:Por sinal que na porta e seus contornos
Um dia amanheceram, bem contados,
Três bacias de trampa e doze cornos.
A Minha Mãe
Vermelho foi o teu cabelo, Mãe!
— sinal de já ser minha a liberdade.
E quanto embranqueceu! Mas haja alguém
que chame desistência ao que é Vontade,ao que é brandir ao vento a felicidade
e defendê-la… que nem cor já tem.
Vermelho foi o teu cabelo, Mãe!
Não temas quanto venha: a luz que há-deiluminar este combate justo,
se a mim me aniquilar, a todo o custo,
é que eu lhe dei qualquer verdade a mais.Olha, ó minha Mãe! tanta bandeira!
Tanta justiça a mais! — E a vida inteira
só as aceita se ainda forem mais.
O Dia Em Que Eu Nasci, Moura E Pereça
O dia em que eu nasci, moura e pereça,
não o queira jamais o tempo dar,
não torne mais ao mundo, e, se tornar,
eclipse nesse passo o sol padeça.luz lhe falte, o sol se [lhe] escureça,
mostre o mundo sinais de se acabar,
nasçam-lhe monstros, sangue chova
o ar, a mãe ao próprio filho não conheça.s pessoas pasmadas de ignorantes,
as lágrimas no rosto, a cor perdida,
cuidem que o mundo já se destruiu.Ó gente temerosa, não te espantes,
que este dia deitou ao mundo a vida
mais desgraçada que jamais se viu!
Quem Jaz no Grão Sepulcro
Quem jaz no grão sepulcro, que descreve
Tão ilustres sinais no forte escudo?
Ninguém, que nisso, enfim, se torna tudo;
Mas foi quem tudo pôde e quem tudo teve.Foi Rei? Fez tudo quanto a Rei deve:
Pôs na guerra e na paz devido estudo.
Mas quão pesado foi ao Mouro rudo,
Tanto lhe seja agora a terra leve.Alexandre será? Ninguém se engane:
Mais que o adquirir, o sustentar estima.
Será Adriano grão senhor do mundo?Mais observante foi da Lei de cima.
É Numa? Numa não, mas é Joane
De Portugal Terceiro sem Segundo.
Doces Despojos de meu Bem Passado
Amor, co’a esperança já perdida
Teu soberano templo visitei;
Por sinal do naufrágio que passei,
Em lugar dos vestidos, pus a vida.Que mais queres de mim, pois destruída
Me tens a glória toda que alcancei?
Não cuides de render-me, que não sei
Tornar a entrar onde não há saída.Vês aqui vida, alma e esperança,
Doces despojos de meu bem passado,
Enquanto o quis aquela que eu adoro.Nelas podes tomar de mim vingança;
E se te queres ainda mais vingado,
Contenta-te co’as lágrimas que choro.
Sorrio
Ah! vieste me falar de antigamente
desse tempo em que fui sentimental,
quando o amor era um sonho puro e ardente
vestido em véu de espumas, nupcial…Quando me dava, perdulariamente,
vivendo o mal sem conhecer o mal,
a levar a alma inquieta de quem sente
e de quem busca uma conquista ideal…Era sestro da idade essa existência…
Sinal de pouca vida e muito sonho,
de muito sonho… e pouca experiência…Hoje, no entanto, se a pensar me ponho:
– sorrio… Um vão sorriso de indulgência…
…Sinal de muita vida… e pouco sonho…
Olhos Fermosos, Em Quem Quis Natura
Olhos fermosos, em quem quis Natura
mostrar do seu poder altos sinais,
se quiserdes saber quanto possais,
vede-me a mim, que sou vossa feitura.Pintada em mim se vê vossa figura,
no que eu padeço retratada estais;
que, se eu passo tormentos desiguais,
muito mais pode vossa fermosura.De mim não quero mais que o meu desejo:
ser vosso; e só de ser vosso me arreio,
porque o vosso penhor em mim se assele.!Tão me lembro de mim quando vos vejo,
nem do mundo; e não erro, porque creio,
que, em lembrar-me de vós, cumpro com ele.
Só
Este, que um deus cruel arremessou à vida,
Marcando-o com o sinal da sua maldição,
– Este desabrochou como a erva má, nascida
Apenas para aos pés ser calcada no chão.De motejo em motejo arrasta a alma ferida…
Sem constância no amor, dentro do coração
Sente, crespa, crescer a selva retorcida
Dos pensamentos maus, filhos da solidão.Longos dias sem sol! noites de eterno luto!
Alma cega, perdida à toa no caminho!
Roto casco de nau, desprezado no mar!E, árvore, acabará sem nunca dar um fruto;
E, homem, há de morrer como viveu: sozinho!
Sem ar! sem luz! sem Deus! sem fé! sem pão! sem lar!
Era a Memória Ardente a Inclinar-se
Era a memória ardente a inclinar-se
à giesta do tempo por frescura
mas o que em seu espelho se figura
vê que está só e a mesma dor foi dar-senoite e dia e silente de amargura
uma saudade em febre o viu queimar-se
até vir por um “sim” a consolar-se
e do perdão mudo hino lhe asseguralevando imagens e sinais de vez
O olhar liberto penetrou no assento
do alto luto onde da palidezdos invernos se erguia outro rebento
de cálices que embalam as sementes
dando ao nome louvado descendentes.Tradução de Vasco Graça Moura
Terceiro Canto
Cajás! Não é que lembra à Laura um dia
(Que dia claro! esplende o mato e cheira!)
Chamar-me para em sua companhia
Saboreá-los sob a cajazeira!– Vamos sós? perguntei-lhe. E a feiticeira:
– Então! tens medo de ir comigo? – E ria.
Compõe as tranças, salta-me ligeira
Ao braço, o braço no meu braço enfia.– Uma carreira! – Uma carreira! – Aposto!
A um sinal breve dado de partida,
Corremos. Zune o vento em nosso rosto.Mas eu me deixo atrás ficar, correndo,
Pois mais vale que a aposta da corrida
Ver-lhe as saias a voar, como vou vendo.
O dia em que nasci moura e pereça,
O dia em que nasci moura e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar;
Não torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o Sol padeça.A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo já se destruiu.Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao Mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!
Dialética
Quando não se queima lenha
na casa de palha e taipa,
sinal de fome que escapa
à saga que se faz senha.Rio, termômetro da várzea,
geografia de sol e chuva;
linha d’água, arco em curva,
elementos dessa faina.Um pássaro risca na tarde
a cambraia do seu canto;
o fado da sarça, que arde,queimando encardidos lírios
e a tua palidez palustre
em febre acendendo círios.