À Sua Velhice
Meu corpo assaz tem sido espicaçado
Com buídos punhais, por mão da Morte,
Que arrebatado tem, da minha corte,
Grande rancho de quanto tenho amado.Não me poupa a cruel no triste estado
Do caduco viver da minha Sorte:
Quando era vigoroso, moço forte,
Suportava com mais valor meu Fado.Então as minhas ásperas feridas
Não tinham para mim tardias curas,
Porque o Tempo receitas tem, sabidas.Mas velho e c’o vapor das sepulturas,
Como posso curar as desabridas
Chagas, das minhas novas amarguras?
Sonetos sobre Tristes de Francisco Joaquim Bingre
3 resultadosInverno
Já na quarta estação final da vida
Estou, do triste Inverno rigoroso.
Fustigado do tempo borrascoso,
Co’a saraiva das asas sacudida.Gelada tenho a fronte encanecida,
O sangue frio, pálido e soroso.
Compresso está o físico nervoso
E a máquina de todo enfraquecida.Nesta quadra da fúnebre tristeza,
Que alegria terei na sombra escura,
Se enlutada se vê a Natureza?Só, c’os frutos da má agricultura,
Vago triste no espaço da incerteza
De que a Morte me dê melhor ventura.
Amar sem Possuir é um Tormento
Se a ti, onde Amor leva o pensamento,
Meu triste coração levar pudesse,
Dó terias, cruel, do que padece,
S’inda em teu peito cabe sentimento.Amar sem possuir é um tormento
Que só quem o suporta é que o conhece.
Não o conheces tu, pois te arrefece
Sempre, na ausência, o frio esquecimento.Tu tens um coração que se persuade
Dever amar só quando se deleita
Na posse do prazer, da sociedade.O meu segue outra estrada mais direita,
Ama distante, ferem-no a Saudade
O Ciúme infernal, a vil Suspeita.