A Arte da RetĂłrica Floresce nas Sociedades Decadentes
Um retĂłrico do passado dizia que o seu ofĂcio era fazer que as coisas pequenas parecessem grandes e como tais fossem julgadas. Dir-se-ia um sapateiro que, para calçar pĂ©s pequenos, sabe fazer sapatos grandes. Em Esparta ter-lhe-iam dado a experimentar o azorrague por professar uma arte trapaceira e mentirosa. E creio que Arquidamo, que foi seu rei, nĂŁo terĂĄ ouvido sem espanto a resposta de TucĂdides, ao qual perguntara quem era mais forte na luta, se PĂ©ricles, se ele: «Isso serĂĄ difĂcil de verificar, pois quando o deito por terra, ele convence os espectadores que nĂŁo caiu, e ganha». Os que, com cosmĂ©ticos, caracterizam e pintam as mulheres fazem menos mal, pois Ă© coisa de pouca perda nĂŁo as ver ao natural, ao passo que estoutros fazem tenção de enganar, nĂŁo jĂĄ os olhos, mas o nosso juĂzo, e de abastardar e corromper a essĂȘncia das coisas. Os Estados que longamente se mantiveram em boa ordem e bem governados, como o cretense e o lacedemĂłnio, nĂŁo tinham em grande conta os oradores.
ArĂston definiu sabiamente a retĂłrica como a ciĂȘncia de persuadir o povo; SĂłcrates e PlatĂŁo, como a arte de enganar e lisonjear; e aqueles que isto negam na sua definição genĂ©rica,
Textos sobre Estupidez de Michel de Montaigne
3 resultadosA Inépcia é Pior que a Falsidade
Toda a gente pode falar com verdade; mas falar com ordem, com prudĂȘncia e capazmente, poucos o podem. Por isso, a falsidade que vem da ignorĂąncia nĂŁo me ofende; a inĂ©pcia, sim. Quebrei vĂĄrias negociaçÔes que me eram Ășteis, por causa da estupidez que punham nas discussĂ”es aqueles com quem negociava. Nem uma vez por ano me irrito com as faltas dos meus subordinados; mas, no que respeita Ă idiotice e teimosia das suas alegaçÔes, Ă s desculpas e defesas asininas e brutas, andamos todos os dias Ă s turras. NĂŁo entendem nem o que se lhes diz nem a razĂŁo das coisas e respondem na mesma; Ă© de desesperar.
SĂł outra cabeça Ă© capaz de impressionar fortemente a minha e acomodo-me melhor com os erros dos meus do que com a sua leviandade, impertinĂȘncia e estupidez. Que façam menos, contanto que façam bem alguma coisa; vive-se na esperança de lhes excitar a vontade, mas de estĂșpidos nĂŁo hĂĄ que esperar nem que lucrar coisa que valha.
O Saber como Ceptro ou como Folia
Amo e honro o saber, tanto como aqueles que o tĂȘm; dando-se-lhe o verdadeiro uso, Ă© a mais nobre e poderosa aquisição dos homens. Mas aqueles, e sĂŁo em nĂșmero infinito, que nele alicerçam o seu valor e a sua fundamental capacidade, que abdicam da inteligĂȘncia na memĂłria, acolhidos Ă sombra alheia, e nada podem senĂŁo pelos livros – nesses aborreço-o eu, se ouso dizĂȘ-lo, um pouco mais do que a estupidez. Na minha terra e no meu tempo, a sabedoria melhora bastante as bolsas, raramente os espĂritos. Se os encontra obtusos, pesa sobre eles e sufoca-os com a sua massa informe e indigesta; se lestos, logo os purifica, clarifica e subtiliza atĂ© o esgotamento. Ă coisa de qualidade quase indecisa; instrumento muito Ăștil Ă s almas bem formadas, pernicioso e daninho Ă s outras; ou antes, coisa de preciosĂssima utilidade que se nĂŁo obtĂ©m barata; em certas mĂŁos Ă© um ceptro, noutras uma folia.