O Teu CĂ©u
É em vida que tens o teu cĂ©u. Mas nĂŁo Ă© um cĂ©u prometido. Um cĂ©u prometido Ă© um cĂ©u precavido, um cĂ©u prevenido – um cĂ©u invertido. O que já sabes que vai ser cĂ©u Ă© um martĂrio. Se sabes que vai ser cĂ©u: entĂŁo Ă© porque nĂŁo Ă© cĂ©u. És tu que, todos os dias, tens de agarrar nas tuas perninhas e no monte de antĂteses de que Ă©s feito. És tu que tens de rezar pelo teu cĂ©u. Mas rezar nĂŁo Ă© de joelhos. Rezar nem sequer Ă© cruzar os dedos e olhar para o cĂ©u Ă espera de que de lá caia alguma coisa. O mais inusitado que podes esperar que caia do cĂ©u sĂŁo perdigotos de quem, como tu, pensa que rezar Ă© dizer meia dĂşzia de palavras com os joelhos dobrados e as mĂŁos unidas em forma de impotĂŞncia. Mas rezar nĂŁo Ă© nada disso. Vou-te explicar o que Ă© rezar. Oremos, irmĂŁo.
Rezar não é ajoelhar nem é falar nem é esperar. Rezar é lutar. Não é por acaso que depois de morrer alguém de quem se gosta se faz o luto. Luto. Ouve bem, lê bem: sente bem. Luto. Luto.
Textos sobre IlusĂŁo de Pedro Chagas Freitas
2 resultadosA Grande Vantagem da Vida
– A grande vantagem da vida Ă© ensinar-nos outra vez a chorar. A vida infantiliza. Fica-se maior no que nos faz ser mais pequenos. Cresce-se fora o que se vai perdendo por dentro. Passamos a infância a querer crescer, a adolescĂŞncia a querer crescer. E depois percebemos que sĂł quer crescer quem ainda se sente pequeno. Um adulto sente-se pequeno mas pensa ao contrário. Sente-se pequeno e quer ficar mais pequeno. Voltar ao tempo em que havia sonhos.
– Onde se perdem os sonhos?
– Todos os sonhos se perdem. Mesmo aqueles que vais ganhar, e vais ganhar muitos, se vão perder. Porque já deixaram de ser sonhos. Sonhaste aquilo, tiveste aquilo. E acabou. Lá se foi o sonho. O segredo é conseguir gerar novos sonhos. Sonhos que consigam ocupar o espaço em branco deixado pelo sonho perdido.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Queria ser como tu.
– E eu queria ser como tu. Queria olhar para a frente e ver que o caminho não acaba, o caminho a perder de vista.
– O teu não se perde de vista?
– O meu faz-me perder a vista.