O Amor em Portugal
Mesmo que Dom Pedro nĂŁo tenha arrancado e comido o coração do carrasco de Dona InĂŞs, JĂşlio Dantas continua a ter razĂŁo: Ă© realmente diferente o amor em Portugal. Basta pensar no incĂłmodo fonĂ©tico de dizer «Eu amo-o» ou «Eu amo-a». Em Portugal aqueles que amam preferem dizer que estĂŁo apaixonados, o que nĂŁo Ă© a mesma coisa, ou entĂŁo embaraçam seriamente os eleitos com as versões estrangeiras: «I love you» ou «Je t’aime». As perguntas «Amas-me?» ou «Será que me amas?» estĂŁo vedadas pelo bom gosto, senĂŁo pelo bom senso. Por isso diz-se antes «Gostas mesmo de mim?», o que tambĂ©m nĂŁo Ă© a mesma coisa.
O mesmo pudor aflige a palavra amante, a qual, ao contrário do que acontece nas demais lĂnguas indo-europeias, nĂŁo tem em Portugal o sentido simples e bonito de «aquele que ama, ou Ă© amado». Diz-se que nĂŁo sei-quem Ă© amante de outro, e entende-se logo, maliciosamente, o biscate por fora, o concubinato indecente, a pouca vergonha, o treco-lareco machista da cervejaria, ou o oprĂłbio galináceo das reuniões de «tupperwares» e de costura.
Amoroso nĂŁo significa cheio de amor, mas sim qualquer vago conceito a leste de levemente simpático, porreiro, ou girĂssimo.
Textos sobre Opostos de Miguel Esteves Cardoso
2 resultadosA Vida Ă© Triste
A vida é triste por uma só razão. Não é a primeira (o ser curta). É comprida. Só parece curta a quem não sofre; a quem não quer que acabe.
A vida Ă© triste por ser muito mais fácil iludirmo-nos do que somos capazes de nos desiludir. A ilusĂŁo, sem qualquer esforço da nossa parte, põe-nos nos pĂncaros. Estamos programados para isso. NĂŁo nos custa. Sabe-nos bem. Gostamos de ser enganados, desde que nos sintamos mais bem por causa disso.
Já a desilusĂŁo nĂŁo sĂł Ă© difĂcil como custa muito mais. Nunca Ă© bem-vinda. É uma força destruidora, a realidade. A morte, sendo inesperada — seja a morte intelectual, emotiva, sensĂvel, amorosa ou fĂsica —, Ă© sempre mais violenta do que a esperada, que raramente se adianta.
Cada vez que acordamos e lamentamos ter acordado; cada vez que adormecemos e agradecemos ter adormecido; estamos a rejeitar alegremente a vida. Não há outra maneira de a rejeitar. Viver, apesar de tudo, ainda é uma espécie de glória, sendo a glória o oposto do prazer.
Esperar muito — tanto no sentido louco da esperança como no sentido (cuja raiz latina vem de sofrer) masoquista de paciência – é pormo-nos a jeito para o sofrimento.