Caminho da ManhĂŁ
Vais pela estrada que Ă© de terra amarela e quase sem nenhuma sombra. As cigarras cantarĂŁo o silĂȘncio de bronze. Ă tua direita irĂĄ primeiro um muro caiado que desenha a curva da estrada. Depois encontrarĂĄs as figueiras transparentes e enroladas; mas os seus ramos nĂŁo dĂŁo nenhuma sombra. E assim irĂĄs sempre em frente com a pesada mĂŁo do Sol pousada nos teus ombros, mas conduzida por uma luz levĂssima e fresca. AtĂ© chegares Ă s muralhas antigas da cidade que estĂŁo em ruĂnas. Passa debaixo da porta e vai pelas pequenas ruas estreitas, direitas e brancas, atĂ© encontrares em frente do mar uma grande praça quadrada e clara que tem no centro uma estĂĄtua. Segue entre as casas e o mar atĂ© ao mercado que fica depois de uma alta parede amarela. AĂ deves parar e olhar um instante para o largo pois ali o visĂvel se vĂȘ atĂ© ao fim. E olha bem o branco, o puro branco, o branco da cal onde a luz cai a direito. TambĂ©m ali entre a cidade e a ĂĄgua nĂŁo encontrarĂĄs nenhuma sombra; abriga-te por isso no sopro corrido e fresco do mar. Entra no mercado e vira Ă tua direita e ao terceiro homem que encontrares em frente da terceira banca de pedra compra peixes.
Textos sobre SilĂȘncio de Sophia de Mello Breyner Andresen
2 resultadosRetrato de MĂłnica
MĂłnica Ă© uma pessoa tĂŁo extraordinĂĄria que consegue simultaneamente: ser boa mĂŁe de famĂlia, ser chiquĂssima, ser dirigente da «Liga Internacional das Mulheres InĂșteis», ajudar o marido nos negĂłcios, fazer ginĂĄstica todas as manhĂŁs, ser pontual, ter imensos amigos, dar muitos jantares, ir a muitos jantares, nĂŁo fumar, nĂŁo envelhecer, gostar de toda a gente, gostar dela, dizer bem de toda a gente, toda a gente dizer bem dela, coleccionar colheres do sĂ©c. XVII, jogar golfe, deitar-se tarde, levantar-se cedo, comer iogurte, fazer ioga, gostar de pintura abstracta, ser sĂłcia de todas as sociedades musicais, estar sempre divertida, ser um belo exemplo de virtudes, ter muito sucesso e ser muito sĂ©ria.
Tenho conhecido na vida muitas pessoas parecidas com a MĂłnica. Mas sĂŁo sĂł a sua caricatura. Esquecem-se sempre ou do ioga ou da pintura abstracta.
Por trås de tudo isto hå um trabalho severo e sem tréguas e uma disciplina rigorosa e constante. Pode-se dizer que Mónica trabalha de sol a sol.
De facto, para conquistar todo o sucesso e todos os gloriosos bens que possui, MĂłnica teve que renunciar a trĂȘs coisas: Ă poesia, ao amor e Ă santidade.A poesia Ă© oferecida a cada pessoa sĂł uma vez e o efeito da negação Ă© irreversĂvel.