Os Deuses Reclinados

… Por todos os lados as estĂĄtuas de Buda, de Lorde Buda… As severas, verticais, carcomidas estĂĄtuas, com um dourado de resplendor animal, com uma dissolução como se o ar as desgastasse… Crescem-lhes nas faces, nas pregas das tĂșnicas, nos cotovelos, nos umbigos, na boca e no sorriso pequenas mĂĄculas: fungos, porosidades, vestĂ­gios excrementĂ­cios da selva… Ou entĂŁo as jacentes, as imensas jacentes, as estĂĄtuas de quarenta metros de pedra, de granito areento, pĂĄlidas, estendidas entre as sussurrantes frondes, inesperadas, surgindo de qualquer canto da selva, de qualquer plataforma circundante… Adormecidas ou nĂŁo adormecidas, estĂŁo ali hĂĄ cem anos, mil anos, mil vezes mil anos… Mas sĂŁo suaves, com uma conhecida ambiguidade ultraterrena, aspirando a ficar e a ir-se embora… E aquele sorriso de suavĂ­ssima pedra, aquela majestade imponderĂĄvel, mas feita de pedra dura, perpĂ©tua, para quem sorriem, para quem, sobre a terra sangrenta?… Passaram as camponesas que fugiam, os homens do incĂȘndio, os guerreiros mascarados, os falsos sacerdotes, os turistas devoradores…

E manteve-se no seu lugar a estĂĄtua, a imensa pedra com joelhos, com pregas na tĂșnica de pedra, com o olhar perdido e nĂŁo obstante existente, inteiramente inumana e de alguma forma tambĂ©m humana, de alguma forma ou de alguma contradição estatuĂĄria,

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