Contrariar as Contrariedades
Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inlcusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora da minha própria vida.
Passagens de Clarice Lispector
1250 resultadosQuem, como eu, estava chamando o medo de amor? E querer, de amor? E precisar, de amor?
Procuro me manter isolada contra a agonia de viver dos outros.
Há pessoas que têm vergonha de viver: são os tímidos, entre os quais me incluo. Desculpem, por exemplo, estar tomando lugar no espaço. Desculpem eu ser eu. «Quero ficar só!» grita a alma do tímido que só se liberta na solidão. Contraditoriamente quer o quente aconchego das pessoas.
E o mundo a me exigir decisões para as quais não estou preparada. Decisões não só a respeito de provocar o nascimento de fatos mas também decisões sobre a melhor forma de se ser.
Nada do que eu já fiz me agrada. E o que eu fiz com amor, estraçalhou-se. Nem amar eu sabia, nem amar eu sabia.
Eu não tenho uma só resposta. Mas tenho mais perguntas do que outro homem pudesse responder.
Não sei separar os fatos de mim, e daí a dificuldade de qualquer precisão, quando penso no passado.
Gastar a vida é usá-la ou não usá-la? Que é que estou exactamente querendo saber?
Divertir os outros, um dos modos mais emocionantes de existir.
O que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesmo.
Adiar o momento em que terei que começar a dizer, sabendo que nada mais me resta a dizer. Estou adiando o meu silêncio.
Sou vulnerável às menores bobagens, às mínimas palavras ditas, a olhares até, e sobretudo, a imaginações.
E aquela maldadezinha que é de quem tem um corpo
A direção é mais importante do que a velocidade.
Nunca Aprendi a Viver
De repente eu me vi e vi o mundo. E entendi: o mundo é sempre dos outros. Nunca meu. Sou o pária dos ricos. Os pobres de alma nada armazenam. A vertigem que se tem quando num súbito relâmpago-trovoada se vê o clarão do não entender. EU NÃO ENTENDO! Por medo da loucura, renunciei à verdade. Minhas idéias são inventadas. Eu não me responsabilizo por elas. O mais engraçado é que nunca aprendi a viver. Eu não sei nada. Só sei ir vivendo. Como o meu cachorro. Eu tenho medo do ótimo e do superlativo. Quando começa a ficar muito bom eu ou desconfio ou dou um passo para trás. Se eu desse um passo para a frente eu seria enfocada pelo amarelado de esplendor que quase cega.
Na arte, a inspiração tem um toque de magia, porque é uma coisa absoluta, inexplicável. Não creio que venha de fora pra dentro, de forças sobrenaturais. Suponho que emerge do mais profundo eu da pessoa, do inconsciente individual, coletivo e cósmico.
Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso, entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus.
O que me importa são instantâneos fotográficos da sensações pensadas, e não a pose imóvel dos que esperam que eu diga: olhe o passarinho! Pois não sou fotógrafo de rua.
Fique de vez em quando só, senão será submergido. Até o amor excessivo pode submergir uma pessoa.