Passagens sobre Mármore

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Frases sobre mármore, poemas sobre mármore e outras passagens sobre mármore para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

A Luta de Classes Acabou

A luta de classes esfumou-se, dissolveu-se, a democracia tem funcionado como um diluente social: toda a gente vive, compra e acorre ao hipermercado, ao balcão do bar e aos concertos pagos pelo município na praça central, e todos falam ao mesmo tempo, vozes que se misturam como nas tumultuosas reuniões no cine Tivoli evocadas pelo meu pai, já não se distingue o que está em cima do que está em baixo, está tudo enredado, confuso, e, porém, reina uma misteriosa ordem, eis a democracia. Mas, de súbito, desde há um par de anos, parece desenhar-se uma ordem mais explícita, menos insidiosa. A nova ordem é bem visível, com os níveis superior e inferior bem definidos: alguns transportam com orgulho sacos repletos de compras e cumprimentam sorridentes os vizinhos à porta do centro comercial, outros remexem nos contentores onde os empregados do hipermercado lançaram as embalagens de carne fora de prazo, a fruta e as verduras pisadas, os pastéis industriais caducados. Lutam entre si por esses alimentos.

(…) Trivial, a luta de classes? Então não era isso que determinava, que impregnava e condicionava tudo? O grande motor da história universal? Não era nisso que acreditavam o meu pai e os seus camaradas,

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Uma Nação só Vive porque Pensa

Uma nação só vive porque pensa. Cogitat ergo est. A força e a riqueza não bastam para provar que uma nação vive duma vida que mereça ser glorificada na História – como rijos músculos num corpo e ouro farto numa bolsa não bastam para que um homem honre em si a Humanidade. Um reino de África, com guerreiros incontáveis nas suas aringas e incontáveis diamantes nas suas colinas, será sempre uma terra bravia e morta, que, para lucro da Civilização, os civilizados pisam e retalham tão desassombradamente como se sangra e se corta a rês bruta para nutrir o animal pensante. E por outro lado se o Egipto ou Tunis formassem resplandescentes centros de ciências, de literaturas e de artes, e, através de uma serena legião de homens geniais, incessantemente educassem o mundo – nenhuma nação mesmo nesta idade do ferro e de força, ousaria ocupar como um campo maninho e sem dono esses solos augustos donde se elevasse, para tornar as almas melhores, o enxame sublime das ideias e das formas.
Só na verdade o pensamento e a sua criação suprema, a ciência, a literatura, as artes, dão grandeza aos Povos, atraem para eles universal reverência e carinho,

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Estátua

Cansei-me de tentar o teu segredo:
No teu olhar sem cor, de frio escalpelo,
O meu olhar quebrei, a debatê-lo,
Como a onda na crista dum rochedo.

Segredo dessa alma e meu degredo
E minha obsessão! Para bebê-lo
Fui teu lábio oscular, num pesadelo,
Por noites de pavor, cheio de medo.

E o meu ósculo ardente, alucinado,
Esfriou sobre o mármore correto
Desse entreaberto lábio gelado…

Desse lábio de mármore, discreto,
Severo como um túmulo fechado,
Sereno como um pélago quieto.

Velho Tema III

Belas, airosas, pálidas, altivas,
Como tu mesma, outras mulheres vejo:
São rainhas, e segue-as num cortejo
Extensa multidão de almas cativas.

Tem a alvura do mármore; lascivas
Formas; os lábios feitos para o beijo;
E indiferente e desdenhoso as vejo
Belas, airosas, pálidas, altivas…

Por quê? Porque lhes falta a todas elas,
Mesmo às que são mais puras e mais belas,
Um detalhe sutil, um quase nada:

Falta-lhes a paixão que em mim te exalta,
E entre os encantos de que brilham, falta
O vago encanto da mulher armada.

O Amor e a Morte

Canção cruel

Corpo de ânsia.
Eu sonhei que te prostrava,
E te enleava
Aos meus músculos!

Olhos de êxtase,
Eu sonhei que em vós bebia
Melancolia
De há séculos!

Boca sôfrega,
Rosa brava
Eu sonhei que te esfolhava
Pétala a pétala!

Seios rígidos,
Eu sonhei que vos mordia
Até que sentia
Vómitos!

Ventre de mármore,
Eu sonhei que te sugava,
E esgotava
Como a um cálice!

Pernas de estátua,
Eu sonhei que vos abria,
Na fantasia,
Como pórticos!

Pés de sílfide,
Eu sonhei que vos queimava
Na lava
Destas mãos ávidas!

Corpo de ânsia,
Flor de volúpia sem lei!
Não te apagues, sonho! mata-me
Como eu sonhei.