O Poeta Pede a Seu Amor que lhe Escreva
Meu entranhado amor, morte que Ă© vida,
tua palavra escrita em vĂŁo espero
e penso, com a flor que se emurchece
que se vivo sem mim quero perder-te.O ar Ă© imortal. A pedra inerte
nem a sombra conhece nem a evita.
Coração interior não necessita
do mel gelado que a lua derrama.Porém eu te suportei. Rasguei-me as veias,
sobre a tua cintura, tigre e pomba,
em duelo de mordidas e açucenas.Enche minha loucura de palavras
ou deixa-me viver na minha calma
e para sempre escura noite d’alma.Tradução de Oscar Mendes
Passagens sobre Mel
92 resultadosGénio, Talento e Celebridade
Pode-se supor que a presença no mesmo homem de mais de um elemento intelectual facilitaria a sua imediata celebridade. AtĂ© certo limite Ă© assim, mas o Ă© atĂ© um limite menor do que se poderia conjecturar na ociosidade da hipĂłtese. Um homem dotado ao mesmo tempo de grande gĂ©nio e de grande inteligĂȘncia (como Shakespeare), ou de grande gĂ©nio e grande talento (como Milton), nĂŁo acumula na sua Ă©poca ou na seguinte os resultados do gĂ©nio e os resultados de outra qualidade. Ă que estes diferentes elementos intelectuais estĂŁo misturados por coexistirem no homem, e derrama-se na substĂąncia da inteligĂȘncia ou do talento o sagrado veneno do gĂ©nio; a bebida Ă© amarga, embora retenha algo do seu gosto comum. Os antigos misturavam mel com vinho e achavam isso gostoso; mas o nĂ©ctar nĂŁo pode fazer qualquer vinho gostoso ao paladar da gente comum.
Um homem que pudesse ter em si prĂłprio, em certo grau, gĂ©nio, talento e inteligĂȘncia, estaria preparado para produzir impacto no seu tempo pela sua inteligĂȘncia, na sua Ă©poca pelo seu talento e na generalidade dos futuros tempos e Ă©pocas pelo seu gĂ©nio. Mas como o seu gĂ©nio afectaria o seu talento e o seu talento e o seu gĂ©nio a sua inteligĂȘncia –
A arte Ă© o mel da alma amassado nas asas da infelicidade e do trabalho.
Manhãs de Além-Tunel
I
um tĂșnel um tĂșnel um tĂșnel sem fim
ao fim do tĂșnel sem fim um tonel
um tonel de mel de AlĂ©m-TĂșnelum tonel de toneladas de mel
do mel de um dia melado de luz sem
fimque compus para ti
para mimII
te possuĂ aqui acolĂĄ
em tantos sĂtios
cantados semprencantadosâ mas nunca
te possuĂ ao fim de um tĂșnel
nunca te possuĂ ao fim
nunca te possuĂ
nuncamas quanto te desejei
vĂŁs manhĂŁs, jĂĄ nĂŁo sei
Amando
Amando
fazemos juntos
o presépio,
com musgo, pinhas,
ervilhaca.E ovelhas
procurando
pelos lĂĄbios
o campo
um do outro.E pĂŁo, mel,
courelas
que renascem
da geada,
semoventes.E o mesmo
hĂĄlito, calor
de dois animais,
nosso fazemos
aquele Filho.
Amor – Pois que Ă© Palavra Essencial
Amor â pois que Ă© palavra essencial
comece esta canção e toda a envolva.
Amor guie o meu verso, e enquanto o guia,
reĂșna alma e desejo, membro de vulva.Quem ousarĂĄ dizer que ele Ă© sĂł alma?
Quem nĂŁo sente no corpo a alma expandir-se
até desabrochar em puro grito
de orgasmo, num instante de infinito?O corpo noutro corpo entrelaçado,
fundido, dissolvido, volta Ă origem
dos seres, que PlatĂŁo viu completados:
é um, perfeito em dois; são dois em um.Integração na cama ou jå no cosmo?
Onde termina o quarto e chega aos astros?
Que força em nossos flancos nos transporta
a essa extrema região, etérea, eterna?Ao delicioso toque do clitóris,
jĂĄ tudo se transforma, num relĂąmpago.
Em pequenino ponto desse corpo,
a fonte, o fogo, o mel se concentraram.Vai a penetração rompendo nuvens
e devassando sĂłis tĂŁo fulgurantes
que nunca a vista humana os suportara,
mas, varado de luz, o coito segue.E prossegue e se espraia de tal sorte
que, além de nós,
Elegia dos Amantes LĂșcidos
Na girĂąndola das ĂĄrvores (e nĂŁo hĂĄ quem as detenha)
Deixa de fora a tarde o vermelho que a tinge.
Se ao menos tu ficasses na pausa que desenha
O contorno lunar da noite que te finge!Se ao menos eu gelasse uma corda do vento
para encontrar a forma exacta dum violino
Que fosse a sensibilidade deste pensamento
Com que a minha sombra vai pensando o meu destinoE nĂŁo houvesse o sono dum telhado
Entre ter de haver eu e haver o tecto;
E a eternidade nĂŁo estivesse ao lado
A colocar-nos nas costas as asas dum insectoMeu amor, meu amor, teu gesto nasce
Para partir de ti e ser ao longe
A cor duma cidade que nos pasce
Como a ausĂȘncia de deus pastando um mongeAh, se uma sĂșbita mĂŁo na hora a pique
Tangendo harpas geladas por segredos
Desprendesse uma aragem de repiques
Destes sinos parados pelo medo!Mas sĂł porque vieste fez-se tarde,
Ou Ă© a vida que nasce jĂĄ tardia
Como uma estrela que se acende e arde
Porque nĂŁo cabe na rapidez do dia?
A abelha, perto do monte e com fonte e casa abrigada, produz mel e cera dobrada.
A abelha perto do monte, com fonte e casa abrigada, produz mel e cera dobrada.
Frémito do Meu Corpo a Procurar-te
Frémito do meu corpo a procurar-te,
Febre das minhas mĂŁos na tua pele
Que cheira a Ăąmbar, a baunilha e a mel,
DoĂdo anseio dos meus braços a abraçar-te,Olhos buscando os teus por toda a parte,
Sede de beijos, amargor de fel,
Estonteante fome, ĂĄspera e cruel,
Que nada existe que a mitigue e a farte!E vejo-te tĂŁo longe! Sinto tua alma
Junto da minha, uma lagoa calma,
A dizer-me, a cantar que nĂŁo me amas…E o meu coração que tu nĂŁo sentes,
Vai boiando ao acaso das correntes,
Esquife negro sobre um mar de chamas…
Males de Anto
A Ares n’uma aldeia
Quando cheguei, aqui, Santo Deus! como eu vinha!
Nem mesmo sei dizer que doença era a minha,
Porque eram todas, eu sei lĂĄ! desde o odio ao tedio.
Molestias d’alma para as quaes nĂŁo ha remedio.
Nada compunha! Nada, nada. Que tormento!
Dir-se-ia accaso que perdera o meu talento:
No entanto, ĂĄs vezes, os meus nervos gastos, velhos,
Convulsionavam-nos relampagos vermelhos,
Que eram, bem o sentia, instantes de CamÔes!
Sei de cór e salteado as minhas afflicçÔes:
Quiz partir, professar n’um convento de Italia,
Ir pelo Mundo, com os pĂ©s n’uma sandalia…
Comia terra, embebedava-me com luz!
Extasis, spasmos da Thereza de Jezus!
Contei n’aquelle dia um cento de desgraças.
Andava, å noite, só, bebia a noite ås taças.
O meu cavaco era o dos mortos, o das loizas.
Odiava os homens ainda mais, odiava as Coizas.
Nojo de tudo, horror! Trazia sempre luvas
(Na aldeia, sim!) para pegar n’um cacho d’uvas,
Ou n’uma flor. Por cauza d’essas mĂŁos… Perdoae-me,
AldeÔes! eu sei que vós sois puros. Desculpae-me.Mas, atravez da minha dor,
As Pessoas Sensatas
PlatĂŁo comparava a vida a um jogo de dados, no qual devĂȘssemos fazer um lance vantajoso e, depois, bom uso dos pontos obtidos, quaisquer que fossem. O primeiro item, o lance vantajoso, nĂŁo depende do nosso arbĂtrio; mas receber de maneira apropriada o que a sorte nos conceder, assinalando a cada coisa um lugar tal que o que mais apreciamos nos cause o maior bem e o que mais aborrecemos o menor mal – isso nos incumbe, se formos sensatos. Os homens que defrontam a vida sem habilidade ou inteligĂȘncia sĂŁo como enfermos que nĂŁo podem tolerar nem o calor nem o frio; a prosperidade exalta-os e a adversidade desalenta-os. SĂŁo perturbados por uma e por outra, ou melhor, por si prĂłprios, numa ou noutra, nĂŁo menos na prosperidade que na adversidade.
Teodoro, chamado o Ateu, costumava dizer que oferecia os seus discursos com a mĂŁo direita, mas os seus ouvintes recebiam-nos com a esquerda; os ignaros frequentemente dĂŁo mostras da sua inĂ©pcia oferecendo Ă Fortuna uma recepção canhestra quando ela se apresenta de modo destro. Mas as pessoas sensatas agem como as abelhas, que extraem mel do tomilho, planta muito seca e azeda; similarmente, as pessoas sensatas muitas vezes obtĂȘm para si algo de Ăștil e aprazĂvel das mais adversas situaçÔes.