Anjo És
Anjo és tu, que esse poder
Jamais o teve mulher,
Jamais o há-de ter em mim.
Anjo és, que me domina
Teu ser o meu ser sem fim;
Minha razĂŁo insolente
Ao teu capricho se inclina,
E minha alma forte, ardente,
Que nenhum jugo respeita,
Covardemente sujeita
Anda humilde a teu poder.
Anjo és tu, não és mulher.Anjo és. Mas que anjo és tu?
Em tua fronte anuviada
NĂŁo vejo a c’roa nevada
Das alvas rosas do céu.
Em teu seio ardente e nu
Não vejo ondear o véu
Com que o sĂ´frego pudor
Vela os mistĂ©rios d’amor.
Teus olhos tĂŞm negra a cor,
Cor de noite sem estrela;
A chama Ă© vivaz e Ă© bela,
Mas luz nĂŁo tĂŞm. – Que anjo Ă©s tu?
Em nome de quem vieste?
Paz ou guerra me trouxeste
De Jeová ou Belzebu?NĂŁo respondes – e em teus braços
Com frenéticos abraços
Me tens apertado, estreito!…
Isto que me cai no peito
Que foi?… – Lágrima? – Escaldou-me…
Queima,
Poemas sobre Fortes
67 resultadosHá Palavras que Nos Beijam
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraĂdo
No papel abandonado)Palavras que nos transportam
Aonde a noite Ă© mais forte,
Ao silĂŞncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
Praia
Minha praia ardorosa e solitária
aberta ao grande vento e ao largo mar
tu me viste querer-lhe com a doce
piedade das sombras do luarteus cabos se adiantam como braços
para abraçar as ninfas receosas
que fugindo oferecem sobre as vagas
suas nĂtidas formas amorosasbraços paralisados por desejo
que o mundo e sua lei nĂŁo permitiu
ou suspendeu amor que livre jogo
maior que posse em fugaz tempo viue como vĂłs me alongo e como tu
areia me ofereço a toda sorte
por sua liberdade ou por destino
que por sĂł dela seja belo e forte.
Culpabilidade
O que Ă© o perdĂŁo?
Vivi na esperança
de o ter entre os dedos.
Quem diz que o alcança
sĂł vive de enredos…Fiz mal? Mas a quem?
Que venham contar-me
as mágoas geradas
por meu vil desdém
e as feridas mostrar-me
na carne rasgadas.Fiz mal? Mas a quem?
Fui pedra lançada
no vosso caminho?
Barrei-vos a estrada
com traves de pinho?SĂł sei que
há vozes gritando
a culpa que sinto
pesar-me na alma,
há ecos cavando
a dor que pressinto
em noites de calma…SĂł sei que
suspensos enredos
da minha agonia,
urdida ao serĂŁo
em grande segredo,
tornaram vazia
a minha intuição.Fiz mal? Sim ou não?
Onde e quando?
Dizei-mo, dizei-mo!Eu sou como a rocha
virada prò norte,
que acolhe a rajada
em concha bem forte
e a atira prò nada…Fiz mal? Sim ou nĂŁo?
Até os duendes,
escondidos e aduncos,
me negam razĂŁo.
Attracção
Meus olhos sempre inquietos
Que posso até dizer,
SĂł acham n’alma objectos
Que os possam entreter;Meus olhos… coisa rara!
Porque hĂŁo de em ti parar
Como a corrente pára
Em encontrando o mar!?E penso n’isto, scismo…
Mas Ă© tĂŁo natural
Cahir-se no abysmo
D’uma belleza tal!…Olhei!… Foi indiscreta
A vista que te puz.
A pobre borboleta
Viu luz… cahiu na luz!Uma attracção mais forte
Que toda a reflexĂŁo,
(É fado, é sina, é sorte!)
Me arrasta o coração…
Alcool
Guilhotinas, pelouros e castelos
Resvalam longamente em procissĂŁo;
Volteiam-me crepĂşsculos amarelos,
Mordidos, doentios de roxidĂŁo.Batem asas d’aurĂ©ola aos meus ouvidos,
Grifam-me sons de cĂ´r e de perfumes,
Ferem-me os olhos turbilhões de gumes,
Desce-me a alma, sangram-me os sentidos.Respiro-me no ar que ao longe vem,
Da luz que me ilumina participo;
Quero reunir-me, e todo me dissipo –
Luto, estrebucho… Em vĂŁo! Silvo pra alĂ©m…Corro em volta de mim sem me encontrar…
Tudo oscila e se abate como espuma…
Um disco de ouro surge a voltear…
Fecho os meus olhos com pavor da bruma…Que droga foi a que me inoculei?
Ă“pio d’inferno em vez de paraĂso?…
Que sortilégio a mim próprio lancei?
Como Ă© que em dor genial eu me eterizo?Nem Ăłpio nem morfina. O que me ardeu,
Foi alcool mais raro e penetrante:
É sĂł de mim que eu ando delirante –
ManhĂŁ tĂŁo forte que me anoiteceu.
Alegria
De passadas tristezas, desenganos
amarguras colhidas em trinta anos,
de velhas ilusões,
de pequenas traições
que achei no meu caminho…,
de cada injusto mal, de cada espinho
que me deixou no peito a nĂłdoa escuraduma nova amargura…
De cada crueldade
que pĂ´s de luto a minha mocidade…
De cada injusta pena
que um dia envenenou e ainda envenena
a minha alma que foi tranquila e forte…
De cada morte
que anda a viver comigo, a minha vida,
de cada cicatriz,
eu fiz
nem tristeza, nem dor, nem nostalgia
mas herĂłica alegria.Alegria sem causa, alegria animal
que nenhum mal
pode vencer.
Doido prazer
de respirar!
VolĂşpia de encontrar
a terra honesta sob os pés descalços.Prazer de abandonar os gestos falsos,
prazer de regressar,
de respirar
honestamente e sem caprichos,
como as ervas e os bichos.
Alegria voluptuosa de trincar
frutos e de cheirar rosas.Alegria brutal e primitiva
de estar viva,
feliz ou infeliz
mas bem presa Ă raĂz.