Poemas sobre Nascimento

10 resultados
Poemas de nascimento escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Pensando-vos Estou, Filha

Pensando-vos estou, filha;
vossa mãe me está lembrando;
enchem-se-me os olhos d’água,
nela vos estou lavando.
Nascestes, filha, entre mágoa,
para bem inda vos seja,
que no vosso nascimento
vos houve a fortuna inveja.
Morto era o contentamento,
nenhuma alegria ouvistes;
vossa mãe era finida,
nós outros éramos tristes.
Nada em dor, em dor crescida,
não sei onde isto há de ir ter;
vejo-vos, filha, formosa,
com olhos verdes crescer.
Não era esta graça vossa
para nascer em desterro;
mal haja a desaventura
que pôs mais nisto que o erro.
Tinha aqui sua sepultura
vossa mãe, e a mágoa a nós;
não éreis vós, filha, não,
para morrerem por vós.
Não houve em fados razão,
nem se consentem rogar;
de vosso pai hei mor dó,
que de si se há de queixar.
Eu vos ouvi a vós só,
primeiro que outrem ninguém;
não fôreis vós se eu não fora;
não sei se fiz mal, se bem.
Mas não pode ser, senhora,
para mal nenhum nascentes,
com este riso gracioso
que tendes sobr’olhos verdes.

Continue lendo…

Definição por Soma

Um consumir-se a cada instante
um escoar-se e um desperdício
um e contudo outro e diverso
um processar-se e um processo

Para tocar o que do vento
para prender o que da fuga
para morder o que do sono
para tão só há que esquecer

Combatido por trevas últimas
combatido por rostos pálidos
combatido por chuva e névoa
combatido e a dar combate

Chego ao inóspito do clima
chego ao vazio onde só o sexo
chego ao anónimo e mortal
chego ao agudo e seus recônditos

Essa unidade com o múltiplo
essa inclusão pelo abandono
essa causalidade absurda
essa e não outra que a disputa

Discórdia que se aceita íntegra
discórdia que mascara os pactos
discórdia dos estados físicos
discórdia e discórdia e insolúvel

Quando de cada nascimento
quando visível o invisível
quando o que há é só o agora
quando dissolução do tempo

Passo por fios de cabelo
passo por rápidos que fogem
passo por bons e maus momentos
passo e no entanto permaneço

Homem que sou e com memória
homem e póstumo e morrendo
homem que alto e sobrevive
homem e seco e secas lágrimas

Estão Todas as Verdades à Espera em Todas as Coisas

Estão todas as verdades
à espera em todas as coisas:
não apressam o próprio nascimento
nem a ele se opõem,
não carecem do fórceps do obstetra,
e para mim a menos significante
é grande como todas.
(Que pode haver de maior ou menor
que um toque?)

Sermões e lógicas jamais convencem
o peso da noite cala bem mais
fundo em minha alma.

(Só o que se prova
a qualquer homem ou mulher,
é que é;
só o que ninguém pode negar,
é que é.)

Um minuto e uma gota de mim
tranquilizam o meu cérebro:
eu acredito que torrões de barro
podem vir a ser lâmpadas e amantes,
que um manual de manuais é a carne
de um homem ou mulher,
e que num ápice ou numa flor
está o sentimento de um pelo outro,
e hão-de ramificar-se ao infinito
a começar daí
até que essa lição venha a ser de todos,
e um e todos nos possam deleitar
e nós a eles.

Tudo é Belo

Tudo é belo
Mulher e por exemplo uma água quando a gente bebe
ou uma água que a gente joga na cara
e fica deixando a frieza vir penetrando na pele;
a água que escorre da bica e cai no monjolo e o monjolo toca;
a água de um poço na mata.
A água quando a gente bebe é por exemplo como um beijo.

Mulher e por exemplo café, ou estrada quando o trem-de-ferro
atravessa um rio;
um rio que banha terras verdes, longe.

Tudo é belo.
Árvore de cedro e por exemplo um homem que está
preso injustamente, um homem que tem esperança
e que é mais forte que os risos e sevícias,
quando tentam matar nele a esperança…

Tudo é belo.
A cabeça fatigada de um homem.
As pernas solitárias. As mãos solidárias.
O peito largo como um tronco de árvore secular.

Tudo é belo.
Mulher e por exemplo, as canções.
O caminho do nascimento à morte de um homem.

Natal

Mais uma vez, cá vimos
Festejar o teu novo nascimento,
Nós, que, parece, nos desiludimos
Do teu advento!

Cada vez o teu Reino é menos deste mundo!
Mas vimos, com as mãos cheias dos nossos pomos,
Festejar-te, — do fundo
Da miséria que somos.

Os que à chegada
Te vimos esperar com palmas, frutos, hinos,
Somos — não uma vez, mas cada —
Teus assassinos.

À tua mesa nos sentamos:
Teu sangue e corpo é que nos mata a sede e a fome;
Mas por trinta moedas te entregamos;
E por temor, negamos o teu nome.

Sob escárnios e ultrajes,
Ao vulgo te exibimos, que te aclame;
Te rojamos nas lajes;
Te cravejamos numa cruz infane.

Depois, a mesma cruz, a erguemos,
Como um farol de salvação,
Sobre as cidades em que ferve extremos
A nossa corrupção.

Os que em leilão a arrematamos
Como sagrada peça única,
Somos os que jogamos,
Para comércio, a tua túnica.

Tais somos, os que, por costume,
Vimos, mais uma vez,

Continue lendo…

Cantar à Maneira de Solao

Pensando-vos estou, filha,
vossa mãi me está lembrando;
enchem-se-me os olhos d’ágoa,
nela vos estou lavando.
Nascestes, filha, antre mágoa,
para bem inda vos seja,
que no vosso nascimento
vos houve a furtuna enveja.
Morto era o contentamento,
nenhüa alegria ouvistes:
vossa mãi era finada,
nós outras éramos tristes.
Nada em dor, em dor criada,
não sei onde isto há-d’ir ter;
vejo-vos, filha, fermosa
c’os olhos verdes crecer.
Não era esta graça vossa
para nacer em desterro,
mal haja a desaventura
que pôs mais nisto que o erro!

Tinha aqui sua sepultura
vossa mãi, e a mágoa nós;
não éreis vós, filha, não,
para morrerem por vós.
Não houve em fados razão,
nem se consente rogar;
de vosso pai hei mor dó,
que de si s’há-de queixar.

Eu vos ouvi a vós só
primeiro que outrem ninguém,
não fôreis vós se eu não fora,
não sei se fiz mal, se bem.

Mas não pode ser, senhora,
para mal nenhum nacerdes,
com este riso gracioso
que tendes sobr’olhos verdes.

Continue lendo…

O Nascimento

Aí vem a estrela! Aí vem, sobre a montanha,
Rompendo a sombra etérea do crepúsculo!
A paisagem tornou-se mais estranha,
Mais cheia de silêncio e de mistério!
Dormem ainda as árvores e os homens,
E dorme, em alto ramo, a cotovia…
E, se ergue já seu canto, é porque sonha
julga ver, sonhando, a luz do dia!

E, pelos negros píncaros, a estrela
É divino sorriso alumiante.
Oh, que esplendor! Que formosura aquela!
É lírio de oiro aberto! É rosa a arder!

Aí vem a estrela! Aí vem, sobre a montanha,
Tão virginal, tão nova, que parece
Sair das mãos de Deus, a vez primeira!

E como, sobre os montes, resplandece!

Persegue-a o sol amado… No oriente,
Alastra um nimbo anímico de luz.
E a antiga dor das trevas, suavemente,
Ondula, em transparência e palidez.

Aí vem a estrela, alumiando a serra!
E os olhos encantados dos pastores
Voltam-se para a estrela… E cá na terra
Há mágoas e penumbras, a fugir…

Como ela voa, cintilando e rindo
Aos penhascos agrestes e desnudos!

Continue lendo…

Natal

Acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
Era gente a correr pela música acima.
Uma onda uma festa. Palavras a saltar.

Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima.
Guitarras guitarras. Ou talvez mar.
E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.

Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia.
No teu ritmo nos teus ritos.
No teu sono nos teus gestos. (Liturgia liturgia).
Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos.
E nos silêncios infinitos. Na tua noite e no teu dia.
No teu sol acontecia.

Era um sopro. Era um salmo. (Nostalgia nostalgia).
Todo o tempo num só tempo: andamento
de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia.
Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva
acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva
na cidade agitada pelo vento.

Natal Natal (diziam). E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.

Continue lendo…

Sugestão

Sede assim — qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

Flor que se cumpre,
sem pergunta.

Onda que se esforça,
por exercício desinteressado.

Lua que envolve igualmente
os noivos abraçados
e os soldados já frios.

Também como este ar da noite:
sussurrante de silêncios,
cheio de nascimentos e pétalas.

Igual à pedra detida,
sustentando seu demorado destino.
E à nuvem, leve e bela,
vivendo de nunca chegar a ser.

À cigarra, queimando-se em música,
ao camelo que mastiga sua longa solidão,
ao pássaro que procura o fim do mundo,
ao boi que vai com inocência para a morte.

Sede assim qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

Não como o resto dos homens.

Quem Falou em Crime?

Crime quem falou em crime
somos todos irmãos todos a mesma
carne incendiada

Quando houver um crime
o primeiro
todos seremos criminosos

Agora porém somos vivos e amamos
do nascimento à morte

Crime se o há já nos corria nas veias
quando éramos obscuros como o ventre
que nos concebeu

Não há veias que transbordem
neste corpo flexível
que nos eterniza