Poemas sobre Ouro

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Poemas de ouro escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Enterro de Luxo

Lá vai o enterro de luxo
puxado por sete cavalos
lá vai a rosa de plástico
na lapela do cadáver.

Lá vai o defunto imberbe
boiando em madeira nobre
lá vai a língua bilingue
com seu sotaque podre.

Lá vai o queixo amarrado
lá vai a gravata oblíqua
montada na escorreguenta
garupa da metafísica.

Lá vai o enterro de luxo
lá vai a conta bancária
lá vai a calva engomada
lá vai o ouro da cárie.

Lá vai o enterro de luxo
levado por ventos negros
lá vão os pendões de luto
com seus narizes alegres.

Lá vai o enterro de luxo
lá vai o perfil de árabe
tangido pra correnteza
volúvel da eternidade.

Romance

Para as Festas da Agonia
Vi-te chegar, como havia
Sonhado já que chegasses:
Vinha teu vulto tão belo
Em teu cavalo amarelo,
Anjo meu, que, se me amasses,
Em teu cavalo eu partira
Sem saudade, pena, ou ira;
Teu cavalo, que amarraras
Ao tronco de minha glória
E pastava-me a memória,
Feno de ouro, gramas raras.
Era tão cálido o peito
Angélico, onde meu leito
Me deixaste então fazer,
Que pude esquecer a cor
Dos olhos da Vida e a dor
Que o Sono vinha trazer.
Tão celeste foi a Festa,
Tão fino o Anjo, e a Besta
Onde montei tão serena,
Que posso, Damas, dizer-vos
E a vós, Senhores, tão servos
De outra Festa mais terrena —

Não morri de mala sorte,
Morri de amor pela Morte.

Última Folha

Musa, desce do alto da montanha
Onde aspiraste o aroma da poesia,
E deixa ao eco dos sagrados ermos
A última harmonia.

Dos teus cabelos de ouro, que beijavam
Na amena tarde as virações perdidas,
Deixa cair ao chão as alvas rosas
E as alvas margaridas.

Vês? Não é noite, não, este ar sombrio
Que nos esconde o céu. Inda no poente
Não quebra os raios pálidos e frios
O sol resplandecente.

Vês? Lá ao fundo o vale árido e seco
Abre-se, como um leito mortuário;
Espera-te o silêncio da planície,
Como um frio sudário.

Desce. Virá um dia em que mais bela,
Mais alegre, mais cheia de harmonias,
Voltes a procurar a voz cadente
Dos teus primeiros dias.

Então coroarás a ingênua fronte
Das flores da manhã, — e ao monte agreste,
Como a noiva fantástica dos ermos,
Irás, musa celeste!

Então, nas horas solenes
Em que o místico himeneu
Une em abraço divino
Verde a terra, azul o céu;

Quando, já finda a tormenta
Que a natureza enlutou,

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Há Metafísica Bastante em não Pensar em Nada

Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

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Requiescat

Por que me vens, com o mesmo riso,
Por que me vens, com a mesma voz,
Lembrar aquele Paraíso,
Extinto para nós?

Por que levantas esta lousa?
Por que, entre as sombras funerais,
Vens acordar o que repousa,
O que não vive mais?

Ah! esqueçamos, esqueçamos
Que foste minha e que fui teu:
Não lembres mais que nos amamos,
Que o nosso amor morreu!

O amor é uma árvore ampla, e rica
De frutos de ouro, e de embriaguez:
Infelizmente, frutifica
Apenas uma vez…

Sob essas ramas perfumadas,
Teus beijos todos eram meus:
E as nossas almas abraçadas
Fugiam para Deus.

Mas os teus beijos esfriaram.
Lembra-te bem! lembra-te bem!
E as folhas pálidas murcharam,
E o nosso amor também.

Ah! frutos de ouro, que colhemos,
Frutos da cálida estação,
Com que delícia vos mordemos,
Com que sofreguidão!

Lembras-te? os frutos eram doces…
Se ainda os pudéssemos provar!
Se eu fosse teu… se minha fosses,
E eu te pudesse amar…

Em vão,

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Pouco Usamos do Pouco que Mal Temos

Cuidas, ínvio, que cumpres, apertando
Teus infecundos, trabalhosos dias
Em feixes de hirta lenha,
Sem ilusão a vida.
A tua lenha é só peso que levas
Para onde não tens fogo que te aqueça,
Nem sofrem peso aos ombros
As sombras que seremos.
Para folgar não folgas; e, se leoas,
Antes legues o exemplo, que riquezas,
De como a vida basta
Curta, nem também dura.
Pouco usamos do pouco que mal temos.
A obra cansa, o ouro não é nosso.
De nós a mesma fama
Ri-se, que a não veremos
Quando, acabados pelas Parcas, formos,
Vultos solenes, de repente antigos,
E cada vez mais sombras,
Ao encontro fatal —
O barco escuro no soturno rio,
E os novos abraços da frieza estígia
E o regaço insaciável
Da pátria de Plutão.

Litoral

Estávamos um diante do outro
como um só espelho de ouro.
Entre nós corria o rio rubro
e era tempo de despedida.
Portugal, Espanha ou as ciciadas,
é tempo, mas de frutas cítricas
para ter nas mãos a colhida,
ácida, consentida, súplice vida.

ESPERO

Espero sempre por ti o dia inteiro,
Quando na praia sobe, de cinza e oiro,
O nevoeiro
E há em todas as coisas o agoiro
De uma fantástica vinda.

Tu? Eu?

Não morres satisfeito.
A vida te viveu
sem que vivesses nela.
E não te convenceu
nem deu qualquer motivo
para haver o ser vivo.

A vida te venceu
em luta desigual.
Era todo o passado
presente presidente
na polpa do futuro
acuando-te no beco.
Se morres derrotado,
não morres conformado.

Nem morres informado
dos termos da sentença
de tua morte, lida
antes de redigida.
Deram-te um defensor
cego surdo estrangeiro
que ora metia medo
ora extorquia amor.

Nem sabes se és culpado
de não ter culpa. Sabes
que morres todo o tempo
no ensaiar errado
que vai a cada instante
desensinando a morte
quanto mais a soletras,
sem que, nascido, more
onde, vivendo, morres.

Não morres satisfeito
de trocar tua morte
por outra mais (?) perfeita.
Não aceitas teu
como aceitaste os muitos
fins em volta de ti.

Testemunhaste a morte
no privilégio de ouro
de a sentires em vida
através de um aquário.
Eras tu que morrias
nesse,

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Entre Dentes

Deitado sobre ti
ensinas-me a sair
da treva.

Com a boca dorida
por tanta palavra
ensanguentada
devoro o teu cabelo
ouro que se desfaz
por entre os dentes.

E o teu sorriso
quando te penetro
ilumina súbito
a noite do meu corpo

Véspera

Amor: em teu regaço as formas sonham
o instante de existir: ainda é bem cedo
para acordar, sofrer. Nem se conhecem
os que se destruirão em teu bruxedo.

Nem tu sabes, amor, que te aproximas
a passo de veludo. És tão secreto,
reticente e ardiloso, que semelhas
uma casa fugindo ao arquitecto.

Que presságios circulam pelo éter,
que signos de paixão, que suspirália
hesita em consumar-se, como flúor,
se não a roça enfim tua sandália?

Não queres morder célere nem forte.
Evitas o clarão aberto em susto.
Examinas cada alma. É fogo inerte?
O sacrifício há de ser lento e augusto.

Então, amor, escolhes o disfarce.
Como brincas (e és sério) em cabriolas,
em risadas sem modo, pés descalços,
no círculo de luz que desenrolas!

Contempla este jardim: os namorados,
dois a dois, lábio a lábio, vão seguindo
de teu capricho o hermético astrolábio,
e perseguem o sol no dia findo.

E se deitam na relva; e se enlaçando
num desejo menor, ou na indecisa
procura de si mesmos,

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Os Cavalleiros

– Onde vaes tu, cavalleiro,
Pela noite sem luar?
Diz o vento viajeiro,
Ao lado d’elle a ventar…
Não responde o cavalleiro,
Que vae absorto a scismar.
– Onde vaes tu, torna o vento,
N’esse doido galopar?
Vaes bater a algum convento?
Eu ensino-te a rezar.
E a lua surge, um momento,
A lua, convento do Ar.
– Vaes levar uma mensagem?
Dá-m’a que eu vou-t’a entregar:
Irás em meia viagem
E eu já de volta hei-de estar.
E o cavalleiro, á passagem,
Faz as arvores vergar.
– Vaes escalar um mosteiro?
Eu ajudo-t’o a escalar:
Não ha no mundo pedreiro
Que a mim se possa egualar!
Não responde o cavalleiro
E o vento torna a fallar:
– Dize, dize! vaes p’ra guerra?
Monta em mim, vou-te levar:
Não ha cavallo na Terra
Que tenha tão bom andar…
E os trovões rolam na serra
Como vagas a arrolar!
– E as guerras has-de ganhal-as,
Que por ti hei-de velar:
Ponho-me á frente das balas
Para a força lhes tirar!

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A Mulher Inspiradora

Mulher, não és só obra de Deus;
os homens vão-te criando eternamente
com a formosura dos seus corações,
e os seus anseios
vestiram de glória a tua juventude.

Por ti o poeta vai tecendo
a sua imaginária tela de oiro:
o pintor dá às tuas formas,
dia após dia,
nova imortalidade.

Para te adornar, para te vestir,
para tornar-te mais preciosa,
o mar traz as suas pérolas,
a terra o seu oiro,
sua flor os jardins do Verão.

Mulher, és meio mulher,
meio sonho.

Tradução de Manuel Simões

16

Esta inconstancia de mim próprio em vibração
É que me ha de transpôr às zonas intermédias,
E seguirei entre cristais de inquietação,
A retinir, a ondular… Soltas as rédeas,
Meus sonhos, leões de fogo e pasmo domados a tirar
A tôrre d’ouro que era o carro da minh’Alma,
Transviarão pelo deserto, muribundos de Luar –
E eu só me lembrarei num baloiçar de palma…
Nos oásis, depois, hão de se abismar gumes,
A atmosfera ha de ser outra, noutros planos:
As rãs hão de coaxar-me em roucos tons humanos
Vomitando a minha carne que comeram entre estrumes…

*       *       *

Há sempre um grande Arco ao fundo dos meus olhos…
A cada passo a minha alma é outra cruz,
E o meu coração gira: é uma roda de côres…
Não sei aonde vou, nem vejo o que persigo…
Já não é o meu rastro o rastro d’oiro que ainda sigo…
Resvalo em pontes de gelatina e de bolôres…
Hoje, a luz para mim é sempre meia-luz…

. . . . . . . . . . .

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Ó Meus Irmãos Contrários

Ó meus irmãos contrários que guardais nas vossas
[pupilas
A noite infusa e o seu horror
Onde vos deixei eu
Com vossas pesadas mãos no azeite preguiçoso
Dos vossos actos antigos
Com tão pouca esperança que’a morte tem razão
Ó meus irmãos perdidos
Eu vou para a vida tenho aparência de homem
Para provar que o mundo é feito à minha medida

E não estou só
Mil imagens de mim multiplicam a luz
Mil olhares semelhantes igualam a carne
É a ave é a criança é a rocha é a planície
Que se misturam a nós
O ouro desata a rir ao ver-se fora do abismo
A água o fogo despem-se por uma única estação
Já não há eclipse na fronte do universo.

Tradução de António Ramos Rosa

Aleluia

Se cantas, nasce o dia;
A luz segreda à flor: Ave, Maria!

Tudo é silêncio, espanto,
Quando vaga no Azul o teu encanto…

Passas e deixas no ar
O perfume das rosas de toucar!

Creio em ti, como em Deus;
Viver à tua luz é estar nos Céus!

Verdes enleios de hera
Cingem de amor teu vulto, ó Primavera!

Nos perdidos caminhos,
Voam gorjeios, músicas dos ninhos…

A Terra em névoas de ouro
Ascende a Deus em teu olhar de choro!

Senhora da Harmonia,
Em ti a minha vida principia!

Se voas pela Altura,
Gravas no Azul a tua formosura!

Teu voo é um longo adeus:
O caminho das almas para os Céus…

Longe, saudosa, adejas,
E pairas sobre mim… bendita sejas!

Trevas

De dia não se via nada, mas p’la tardinha já se apercebia gente que vinha de punhaes na mão, devagar, silenciosamente, nascendo dos pinheiros e morrendo nelles. E os punhaes não brilhavam: eram luzes distantes, eram guias de lençoes de linho escorridos de hombros franzinos. E a briza que vinha dava gestos de azas vencidas aos lençoes de linho, azas brancas de garças caídas por faunos caçadores. E o vento segredava por entre os pinheiros os mêdos que nasciam.

E vinha vindo a Noite por entre os pinheiros, e vinha descalça com pés de surdina por môr do barulho, de braços estendidos p’ra não topar com os troncos; e vinha vindo a noite céguinha como a lanterna que lhe pendia da cinta. E vinha a sonhar. As sombras ao vê-la esconderam os punhaes nos peitos vazios.

A lua é uma laranja d’oiro num prato azul do Egypto com perolas desirmanadas. E as silhuetas negras dos pinheiros embaloiçados na briza eram um bailado de estatuas de sonho em vitraes azues. Mãos ladras de sombra leváram a laranja, e o prato enlutou-se.

Por entre os pinheiros esgalgados, por entre os pinheiros entristecidos, havia gemidos da briza dos tumulos,

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Ruinas

Pandeiros rôtos e côxas táças de crystal aos pés da muralha.

Heras como Romeus, Julietas as ameias. E o vento toca, em bandolins distantes, surdinas finas de princezas mortas.

Poeiras adormecidas, netas fidalgas de minuetes de mãos esguias e de cabelleiras embranquecidas.

Aquellas ameias cingiram uma noite peccados sem fim; e ainda guardam os segredos dos mudos beijos de muitas noites. E a lua velhinha todas as noites réza a chorar: Era uma vez em tempo antigo um castello de nobres naquelle lugar… E a lua, a contar, pára um instante – tem mêdo do frio dos subterraneos.

Ouvem-se na sala que já nem existe, compassos de danças e rizinhos de sêdas.

Aquellas ruinas são o tumulo sagrado de um beijo adormecido – cartas lacradas com ligas azues de fechos de oiro e armas reais e lizes.

Pobres velhinhas da côr do luar, sem terço nem nada, e sempre a rezar…

Noites de insonia com as galés no mar e a alma nas galés.

Archeiros amordaçados na noite em que o côche era de volta ao palacio pela tapada d’El-rei. Grande caçada na floresta–galgos brancos e Amazonas negras.

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Portugal

Maior do que nós, simples mortais, este gigante
foi da glória dum povo o semideus radiante.
Cavaleiro e pastor, lavrador e soldado,
seu torrão dilatou, inóspito montado,
numa pátria… E que pátria! A mais formosa e linda
que ondas do mar e luz do luar viram ainda!
Campos claros de milho moço e trigo loiro;
hortas a rir; vergéis noivando em frutos de oiro;
trilos de rouxinóis; revoadas de andorinhas;
nos vinhedos, pombais: nos montes, ermidinhas;
gados nédios; colinas brancas olorosas;
cheiro de sol, cheiro de mel, cheiro de rosas;
selvas fundas, nevados píncaros, outeiros
de olivais; por nogais, frautas de pegureiros;
rios, noras gemendo, azenhas nas levadas;
eiras de sonho, grutas de génios e de fadas:
riso, abundância, amor, concórdia, Juventude:
e entre a harmonia virgiliana um povo rude,
um povo montanhês e heróico à beira-mar,
sob a graça de Deus a cantar e a lavrar!
Pátria feita lavrando e batalhando: aldeias
conchegadinhas sempre ao torreão de ameias.
Cada vila um castelo. As cidades defesas
por muralhas, bastiões, barbacãs, fortalezas;
e, a dar fé, a dar vigor,

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Marília de Dirceu

(excerto)

Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
que viva de guardar alheio gado,
de tosco trato, de expressões grosseiro,
dos frios gelos e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal e nele assisto;
dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
das brancas ovelhinhas tiro o leite
e mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela, graças à minha estrela!

Eu vi o meu semblante numa fonte:
dos anos inda não está cortado;
os pastores que habitam este monte
respeitam o poder do meu cajado.
Com tal destreza toco a sanfoninha,
que inveja até me tem o próprio Alceste:
ao som dela concerto a voz celeste,
nem canto letra que não seja minha.
Graças, Marília bela,
graças à minha estrela!

Mas tendo tantos dotes da ventura,
só apreço lhes dou, gentil pastora,
depois que o teu afeto me segura
que queres do que tenho ser senhora.
E bom, minha Marília, é bom ser dono
de um rebanho, que cubra monte e prado;
porém, gentil pastora, o teu agrado
vale mais que um rebanho e mais que um trono.

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