Poemas sobre Simples de Alberto Caeiro

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Poemas de simples de Alberto Caeiro. Leia este e outros poemas de Alberto Caeiro em Poetris.

Pensar em Deus Ă© Desobedecer a Deus

Pensar em Deus Ă© desobedecer a Deus,
Porque Deus quis que o nĂŁo conhecĂŞssemos,
Por isso se nos nĂŁo mostrou…
Sejamos simples e calmos,
Como os regatos e as árvores,
E Deus amar-nos-á fazendo de nós
Belos como as árvores e os regatos,
E dar-nos-á verdor na sua primavera,
E um rio aonde ir ter quando acabemos! …

Se Quiserem que Eu Tenha um Misticismo

Se quiserem que eu tenha um misticismo, está bem,
tenho-o.
Sou mĂ­stico, mas sĂł com o corpo.
A minha alma Ă© simples e nĂŁo pensa.
O meu misticismo Ă© nĂŁo querer saber.
É viver e não pensar nisso.
NĂŁo sei o que Ă© a Natureza: canto-a.
Vivo no cimo dum outeiro
Numa casa caiada e sozinha,
E essa é a minha definição.

Ontem Ă  Tarde um Homem das Cidades

Ontem Ă  tarde um homem das cidades
Falava Ă  porta da estalagem.
Falava comigo também.
Falava da justiça e da luta para haver justiça
E dos operários que sofrem,
E do trabalho constante, e dos que tĂŞm fome,
E dos ricos, que sĂł tĂŞm costas para isso.
E, olhando para mim, viu-me lágrimas nos olhos
E sorriu com agrado, julgando que eu sentia
O Ăłdio que ele sentia, e a compaixĂŁo
Que ele dizia que sentia.
(Mas eu mal o estava ouvindo.
Que me importam a mim os homens
E o que sofrem ou supõem que sofrem?
Sejam como eu — não sofrerão.
Todo o mal do mundo vem de nos importarmos uns com os
outros,
Quer para fazer bem, quer para fazer mal.
A nossa alma e o céu e a terra bastam-nos.
Querer mais Ă© perder isto, e ser infeliz.)
Eu no que estava pensando
Quando o amigo de gente falava
(E isso me comoveu até às lágrimas),
Era em como o murmĂşrio longĂ­nquo dos chocalhos
A esse entardecer
NĂŁo parecia os sinos duma capela pequenina
A que fossem Ă  missa as flores e os regatos
E as almas simples como a minha.

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Se Depois de Eu Morrer, Quiserem Escrever a Minha Biografia

Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples
Tem só duas datas — a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra cousa todos os dias sĂŁo meus.

Sou fácil de definir.
Vi como um danado.
Amei as cousas sem sentimentalidade nenhuma.
Nunca tive um desejo que nĂŁo pudesse realizar, porque nunca ceguei.
Mesmo ouvir nunca foi para mim senĂŁo um acompanhamento de ver.
Compreendi que as cousas sĂŁo reais e todas diferentes umas das outras;
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.
Fechei os olhos e dormi.
Além disso, fui o único poeta da Natureza.

Poder Crer em Santa Bárbara

Esta tarde a trovoada caiu
Pelas encostas do céu abaixo
Como um pedregulho enorme…
Como alguém que duma janela alta
Sacode uma toalha de mesa,
E as migalhas, por caĂ­rem todas juntas,
Fazem algum barulho ao cair,
A chuva chovia do céu
E enegreceu os caminhos …

Quando os relâmpagos sacudiam o ar
E abanavam o espaço
Como uma grande cabeça que diz que não,
Não sei porquê — eu não tinha medo —
pus-me a rezar a Santa Bárbara
Como se eu fosse a velha tia de alguĂ©m…

Ah! é que rezando a Santa Bárbara
Eu sentia-me ainda mais simples
Do que julgo que sou…
Sentia-me familiar e caseiro
E tendo passado a vida
TranqĂĽilamente, como o muro do quintal;
Tendo idéias e sentimentos por os ter
Como uma flor tem perfume e cor…

Sentia-me alguém que nossa acreditar em Santa
Bárbara…
Ah, poder crer em Santa Bárbara!

(Quem crê que há Santa Bárbara,
Julgará que ela é gente e visível
Ou que julgará dela?)

(Que artifĂ­cio!

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