Poemas sobre Temporais

14 resultados
Poemas de temporais escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Nua

I

Nua
como Eva.
A cabeleira
beija-lhe o rosto oval e flutua;
o corpo
é água de torrente…

Eva adolescente,
com reflexos de lua
e tons de aurora…!

Roseira que enflora…!

Desflorada por tanta gente…

II

Teu corpo,
mal o toquei…

Só te abracei
de leve…

Foi todo neve
o sonho que alonguei…

Asas em voo,
quem, um dia, as teve?

Os sonhos que eu sonhei!

III

Jeito de ave
e criança,
suave
como a dança
do ramo de árvore
que o vento beija e balança!

Nave
de sonho
no temporal medonho
silvando agoiro!

Quem destrançou os teus cabelos de oiro?

IV

Corpo fino,
delicado,
sereno, sem desejos…

Tão macio,
tão modelado…

Beijos… Beijos… Beijos…

V

No meu sono
ela flutua
a cada passo…

Nua,
riscando o espaço
numa névoa de outono…

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Amo-te Tanto

Amo-te tanto
nem sei porquê!
Que importa o quê
do meu espanto?

Que importa o riso
que me concedes?
Que me embebedes!
Que paraíso!

Indiferente
quero-te assim.
– Sê bem de mim,
de toda a gente…

Rasgou-se o véu
do temporal.
Nem bem nem mal.
Entras no céu.

Os Filhos São Figuras Estremecidas

Os filhos são figuras estremecidas
e, quando dormem, a felicidade
cerra-lhes as pálpebras, toca-lhes
os lábios, ama-os sobre as camas.
É por mim que chamam quando temem
o eclipse e o temporal. Trazem nos cabelos
o aroma do leite e da festa das rosas.
Voam-me por entre os dedos, por entre
as malhas da rede de espuma
que lanço a seus pés. Reinam
num sítio de penumbra onde não
me atrevo sequer a dizer quem sou.

Mensagem – Mar Português

MAR PORTUGUÊS

Possessio Maris

I. O Infante

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

II. Horizonte

Ó mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
’Splendia sobre as naus da iniciação.

Linha severa da longínqua costa —
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves,

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Os Semeadores

Vós os que hoje colheis, por esses campos largos,
O doce fruto e a flor,
Acaso esquecereis os ásperos e amargos
Tempos do semeador?

Rude era o chão; agreste e longo aquele dia;
Contudo, esses heróis
Souberam resistir na afanosa porfia
Aos temporais e aos sóis.

Poucos; mas a vontade os poucos multiplica,
E a fé, e as orações
Fizeram transformar a terra pobre em rica
E os centos em milhões.

Nem somente o labor, mas o perigo, a fome,
O frio, a descalcês,
O morrer cada dia uma morte sem nome,
O morrê-la, talvez,

Entre bárbaras mãos, como se fora crime,
Como se fora réu
Quem lhe ensinara aquela ação pura e sublime
De as levantar ao céu!

Ó Paulos do sertão! Que dia e que batalha!
Venceste-a; e podeis
Entre as dobras dormir da secular mortalha;
Vivereis, vivereis!

Adoração

Vi o teu rosto lindo,
Esse rosto sem par;
Contemplei-o de longe mudo e quedo,
Como quem volta de áspero degredo
E vê ao ar subindo
O fumo do seu lar!

Vi esse olhar tocante,
De um fluido sem igual;
Suave como lâmpada sagrada,
Benvindo como a luz da madrugada
Que rompe ao navegante
Depois do temporal!

Vi esse corpo de ave,
Que parece que vai
Levado como o Sol ou como a Lua
Sem encontrar beleza igual à sua;
Majestoso e suave,
Que surpreende e atrai!

Atrai e não me atrevo
A contemplá-lo bem;
Porque espalha o teu rosto uma luz santa,
Uma luz que me prende e que me encanta
Naquele santo enlevo
De um filho em sua mãe!

Tremo apenas pressinto
A tua aparição,
E se me aproximasse mais, bastava
Pôr os olhos nos teus, ajoelhava!
Não é amor que eu sinto,
É uma adoração!

Que as asas providentes
De anjo tutelar
Te abriguem sempre à sua sombra pura!
A mim basta-me só esta ventura
De ver que me consentes
Olhar de longe…

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O Que Eu Sou

Nocturna e dubia luz
Meu sêr esboça e tudo quanto existe…
Sou, num alto de monte, negra cruz,
Onde bate o luar em noite triste…

Sou o espirito triste que murmura
Neste silencio lúgubre das Cousas…
Eu é que sou o Espectro, a Sombra escura
De falecidas formas mentirosas.

E tu, Sombra infantil do meu Amôr,
És o Sêr vivo, o Sêr Espiritual,
A Presença radiosa…
Eu sou a Dôr,
Sou a tragica Ausencia glacial…

Pois tu vives, em mim, a vida nova,
E eu já não vivo em ti…
Mas quem morreu?
Fôste tu que baixaste á fria cova?
Oh, não! Fui eu! Fui eu!

Horrivel cataclismo e negra sorte!
Tu fôste um mundo ideal que se desfez
E onde sonhei viver apoz a morte!
Vendo teus lindos olhos, quanta vez,
Dizia para mim: eis o logar
Da minha espiritual, futura imagem…
E viverei á luz daquele olhar,
Divino sol de mistica Paisagem.

Era minha ambição primordial
Legar-lhe a minha imagem de saudade;
Mas um vento cruel de temporal,

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O Amor, um Dever de Passagem

Fui envenenado pela dor obscura do Futuro.
Eu sabia já que algo se preparava contra o meu corpo.
Agora torço-me de agonia
nos versos deste poema.
Esta é a terra outrora fértil que os meus dedos dilaceram.
Os meus lábios são feitos desta terra,
são lama quente.
Vou partir pelo teu rosto para mais longe.
A minha fome é ter-te olhado
e estar cego. Agora eu sei que te abres para o fogo
do relâmpago.
Tenho a convicção dos temporais.
já não sei nem o que digo nem o que isso importa. Guia
dos meus cabelos rasos, da melancolia,
da vida efémera dos gestos.
Nesse dia fui melhor actor do que a minha sinceridade.

A cesura enerva-me no estômago
Cortei de manhã as pontas dos dedos mas sei já que
elas crescerão de novo a proteger as unhas.
Talvez a vida seja estranha,
talvez a vida seja simples,
talvez a vida seja outra vida.
A linha branca da Beleza é a minha atitude que se transforma.

A violência do sono sobe
sobre o meu conhecimento.

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Purinha

O Espirito, a Nuvem, a Sombra, a Chymera,
Que (aonde ainda não sei) neste mundo me espera
Aquella que, um dia, mais leve que a bruma,
Toda cheia de véus, como uma Espuma,
O Sr. Padre me dará p’ra mim
E a seus pés me dirá, toda corada: Sim!
Ha-de ser alta como a Torre de David,
Magrinha como um choupo onde se enlaça a vide
E seu cabello em cachos, cachos d’uvas,
E negro como a capa das viuvas…
(Á maneira o trará das virgens de Belem
Que a Nossa Senhora ficava tão bem!)
E será uma espada a sua mão,
E branca como a neve do Marão,
E seus dedos serão como punhaes,
Fuzos de prata onde fiarei meus ais!
E os seus seios serão como dois ninhos,
E seus sonhos serão os passarinhos,
E será sua bocca uma romã,
Seus olhos duas Estrellinhas da Manhã!
Seu corpo ligeiro, tão leve, tão leve,
Como um sonho, como a neve,
Que hei-de suppor estar a ver, ao vel-a,
Cabrinhas montezas da Serra da Estrella…
E ha-de ser natural como as hervas dos montes
E as rolas das serras e as agoas das fontes…

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Certa Velhinha

1

Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Que triste velhinha que vae a passar!
Não leva candeia; hoje, o céu não tem luzes…
Cautella, velhinha, não vás tropeçar!

Os ventos entoam cantigas funestas,
Relampagos tingem de vermelho o Azul!
Aonde irá ella, n’uma noite d’estas,
Com vento da Barra puxado do sul?

Aonde irá ella, pastores! boieiras!
Aonde irá ella, n’uma noite assim?
Se for un phantasma, fazei-lhe fogueiras,
Se for uma bruxa, queimae-lhe alecrim!

Contava-me aquella que a tumba já cerra,
Que Nossa Senhora, quando a chama alguem,
Escolhe estas noites p’ra descer á Terra,
Porque em noites d’estas não anda ninguem…

Além, na tapada das Quatorze Cruzes,
Que linda velhinha que vem a passar!
E que olhos aquelles que parecem luzes!
Quaes velas accezas que a vêm a guiar…

Que pobre capinha que leva de rastros,
Tão velha, tão rôta! Que triste viuvez!
Mas se lhe dá vento, meu Deus! tantos astros!
É o céu estrellado vestido do envez…

Seu alvo cabello, molhado das chuvas,
Parece uma vinha de luar em flor…

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Ansiedade

Quero compor um poema
onde fremente
cante a vida
das florestas das águas e dos ventos.

Que o meu canto seja
no meio do temporal
uma chicotada de vento
que estremeça as estrelas
desfaça mitos
e rasgue nevoeiros — escancarando sóis!

Um Campo Batido pela Brisa

A tua nudez inquieta-me.

Há dias em que a tua nudez
é como um barco subitamente entrado pela barra.
Como um temporal. Ou como
certas palavras ainda não inventadas,
certas posições na guitarra
que o tocador não conhecia.

A tua nudez inquieta-me. Abre o meu corpo
para um lado misterioso e frágil.
Distende o meu corpo. Depois encurta-o e tira-lhe
contorno, peso. Destrói o meu corpo.
A tua nudez é uma violência
suave, um campo batido pela brisa
no mês de Janeiro quando sobem as flores
pelo ventre da terra fecundada.

Eu desgraço-me, escrevo, faço coisas
com o vocabulário da tua nudez.
Tenho «um pensamento despido»;
maturação; altas combustões.
De mão dada contigo entro por mim dentro
como em outros tempos na piscina
os leprosos cheios de esperança.
E às vezes sucede que a tua nudez é um foguete
que lanço com mão tremente desastrada
para rebentar e encher a minha carne
de transparência.

Sete dias ao longo da semana,
trinta dias enquanto dura um mês
eu ando corajoso e sem disfarce,

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Fado das queixas

P’ra que te queixas de mim
Se eu sou assim
como tu és,
Barco perdido no mar
Que anda a bailar

Com as marés?
Tu já sabias
Que eu tinha o queixume
Do mesmo ciúme
Que sempre embalei…
Tu já sabias
Que amava deveras;
Também quem tu eras,
Confesso, não sei!

Estribilho:
Não sei
Quem és
Nem quero saber,
Errei
Talvez,
Mas que hei-de fazer?
A tal paixão
Que jamais findará,
– Pura ilusão! –
Ninguém sabe onde está!
Dos dois,
Diz lá
O que mais sofreu!
Diz lá
Que o resto sei eu!

P’ra que me queixo eu também
Do teu desdem
Que me queimou
Se é eu queixar-me afinal
Dum temporal
Que já passou?
Tu nem calculas
As mágoas expressas
E a quantas promessas
Calámos a voz!
Tu nem calculas
As bocas que riam
E quantas podiam
Queixar-se de nós!

Estribilho

A Jovem Cativa

(André Chenier)

— “Respeita a foice a espiga que desponta;
Sem receio ao lagar o tenro pâmpano
Bebe no estio as lágrimas da aurora;
Jovem e bela também sou; turvada
A hora presente de infortúnio e tédio
Seja embora: morrer não quero ainda!

De olhos secos o estóico abrace a morte;
Eu choro e espero; ao vendaval que ruge
Curvo e levanto a tímida cabeça.
Se há dias maus, também os há felizes!
Que mel não deixa um travo de desgosto?
Que mar não incha a um temporal desfeito?

Tu, fecunda ilusão, vives comigo.
Pesa em vão sobre mim cárcere escuro,
Eu tenho, eu tenho as asas da esperança:
Escapa da prisão do algoz humano,
Nas campinas do céu, mais venturosa,
Mais viva canta e rompe a filomela.

Deve acaso morrer ? Tranqüila durmo,
Tranqüila velo; e a fera do remorso
Não me perturba na vigília ou sono;
Terno afago me ri nos olhos todos
Quando apareço, e as frontes abatidas
Quase reanima um desusado júbilo.

Desta bela jornada é longe o termo.

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