Poemas sobre Visita

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Poemas de visita escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Saudade SĂł

Hoje vieste ver-me
a troco de um pensamento
que nĂŁo se esconde
na ressonância adormecida
num olimpo.

Vieste e trazias
um ramo de palavras cintilantes,
flores que pacientemente
escorrem entre o alfa e o omega
como um perfume de tempo.

Hoje a tua visita
apareceu Ă  janela do tempo
que a paisagem do nosso olhar
incendeia num vespertino silĂŞncio.

De corpo cansado
das pedras que colhi
na paisagem transparente erguida
adormeci na pausa
tĂŁo perfeitamente adormecida
do nosso paraĂ­so
que tarda a acontecer.

Hoje vieste ver-me
E, sem ter de tocar
no mármore da paixão,
contigo fui devagar
ver o tempo passado para nele escrever
o tempo do amor
voz da nossa idade
que nossos olhos cantam
no canto do nosso olhar.

Tempo Revisitado

O tempo a que sempre regressamos
e nos visita um instante

O tempo que depois destruĂ­mos
construĂ­mos e ali-
mentamos se nos
alimenta

O tempo onde a luz buscamos e
a morte sempre
encontramos

Sociedade

O homem disse para o amigo:
— Breve irei a tua casa
e levarei minha mulher.

O amigo enfeitou a casa
e quando o homem chegou com a mulher,
soltou uma dĂşzia de foguetes.

O homem comeu e bebeu.
A mulher bebeu e cantou.
Os dois dançaram.
O amigo estava muito satisfeito.

Quando foi hora de sair,
o amigo disse para o homem:
— Breve irei a tua casa.
E apertou a mĂŁo dos dois.

No caminho o homem resmunga:
— Ora essa, era o que faltava.
E a mulher ajunta: — Que idiota.

— A casa é um ninho de pulgas.
— Reparaste o bife queimado?
O piano ruim e a comida pouca.

E todas as quintas-feiras
eles voltam Ă  casa do amigo
que ainda nĂŁo pĂ´de retribuir a visita.

Poesia

Ă© a visita do tempo nos teus olhos,
Ă© o beijo do mundo nas palavras
por onde passa o rio do teu nome;
é a secreta distância em que tocas
o princĂ­pio leve dos meus versos;
é o amor debruçado no silêncio
que te cerca e que te esconde:
como num bosque, lento, ouvimos
o coração de uma fonte nĂŁo sei onde…

W.C.

Neste país onde ninguém sabe
como obram as musas,
já dizia o outro,
fazer versos realmente versos,
que sigam o espasmo do ânus provecto
dessas criaturas fĂşteis, decantadas,
ainda é e será muito difícil.

Existe sempre um braço etéreo
que puxa o autoclismo
no momento exacto da defecação.
Ouve-se um ruĂ­do,
alguém pergunta ao outro o que se passa:
«É o som das águas que bate na garganta.»
Aliviados então os corações repousam
na sala de visitas da casa devassada
a que chamam d’alma.

Sem outra Palavra para Mantimento

Sem outra palavra para mantimento
Sem outra força onde gerar a voz
Escada entre o poço que cavaste em mim e a sede
Que cavaste no meu canto, amo-te
Sou cĂ­tara para tocar as tuas mĂŁos.
Podes dizer-me de um fĂ´lego
Frase em silĂŞncio
Homem que visitas
Ă“ seiva aspergindo as partĂ­culas do fogo
O lume em toda a casa e na paisagem
Fora da casa
Pedra do edifĂ­cio aonde encontro
A porta para entrar
Candelabro que me vens cegando.
Sol
Que quando Ă©s nocturno ando
Com a noite em minhas mĂŁos para ter luz.

Queixas de um Utente

Pago os meus impostos, separo
o lixo, já não vejo televisão
há cinco meses, todos os dias
rezo pelo menos duas horas
com um livro nos joelhos,
nunca falho uma visita Ă  famĂ­lia,
utilizo sempre os transportes
públicos, raramente me esqueço
de deixar água fresca no prato
do gato, tento ser correcto
com os meus vizinhos e nĂŁo cuspo
na sombra dos outros.

Já não me lembro se o médico
me disse ser esta receita a indicada
para salvar o mundo ou apenas
ser feliz. Seja como for,
nĂŁo estou a ver resultado nenhum.

A Vida Ă© LĂ­quida

É crua a vida. Alça de tripa e metal.
Nela despenco: pedra mĂłrula ferida.
É crua e dura a vida. Como um naco de víbora.
Como-a no livro da lĂ­ngua
Tinta, lavo-te os antebraços, Vida, lavo-me
No estreito-pouco
Do meu corpo, lavo as vigas dos ossos, minha vida
Tua unha pĂşmblea, me casaco rosso
E perambulamos de coturno pela rua
Rubras, gĂłticas, altas de corpo e copos.
A vida Ă© crua. Faminta como o bico dos corvos.
E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima
Olho d’água, bebida. A vida é liquída.

Também são cruas e duras as palavras e as caras
Antes de nos sentarmos Ă  mesa, tu e eu, Vida
Diante do coruscante ouro da bebida. Aos poucos
Vão se fazendo remansos, lentilhas d’água, diamantes
Sobre os insultos do passado e do agora. Aos poucos
Somos duas senhoras, encharcadas de riso, rosadas
De um amora, um que entrevi no teu hálito, amigo
Quando me permitiste o paraĂ­so. O sinistro das horas
Vai se fazendo olvido. Depois deitadas, a morte
É um rei que nos visita e nos cobre de mirra.

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Primeira Casa

Muitas vezes, por outras casas
e noutros paĂ­ses sonhava
com o soalho antigo e a varanda
onde um entardecer de plátanos
enchia o peito de uma secreta
ansiedade, sem motivo. O quarto
da Mãe, esse lugar de mistérios
fixara-se na sua memĂłria, como
um quadro de autor irremediavelmente
perdido. Sempre que regressava
minguava-lhe a coragem adiada
para pedir aos ocasionais locatários,
a permissĂŁo provavelmente estranha de
uma visita. Um dia a velha casa
debruçada sobre os telhados,
apareceu-lhe quase demolida e agora
avultava como um dente postiço, com
uma loja de lingerie barata no
rés-do-chão e um par de janelas
com alumínio e sem mistério
onde os plátanos, há muito ceifados
pelo asfalto, recusariam entardecer.

Primeira Palavra

Aproxima o teu coração
e inclina o teu sangue
para que eu recolha
os teus inacessĂ­veis frutos
para que prove da tua água
e repouse na tua fronte
Debruça o teu rosto
sobre a terra sem vestĂ­gio
prepara o teu ventre
para a anunciada visita
até que nos lábios humedeça
a primeira palavra do teu corpo

Já Velho e Doente

«Seja a terra da Terceira
A minha coberta de alma»,
Disse eu na idade fagueira,
Em que tudo é força e calma.

Mas hoje, já velho e doente,
Em que as almas nĂŁo se cobrem,
Hoje sim, peço seriamente
Que os sinos por mim lá dobrem.

Até já me aconselharam
Um quarto lá no Hospital,
Tanto caipora me acharam,
Escaveirado, mal, mal…

Ali visitas teria
Por obra de misericĂłrdia,
Embora comida fria,
Alguma vez, que mixĂłrdia!

Mas sempre era doce ao peito
Ir acabar os meus dias
Na Praia, de qualquer jeito,
Perto da casa das tias.

Tive o exemplo resignado
Que me deu a prima Alzira
Num lençolinho lavado
Com rendas limpas na vira.

Ali matámos saudades,
Ela alegre e penteadinha,
Mal pensando eu que as idades
NĂŁo perdoam. Hoje Ă© a minha.

Também cheguei a pensar
No Asilo, talvez com um biombo.
Sou biqueiro. Mas jantar?
Todos ali, lombo a lombo.

Como outrora o Tintaleis,
TrĂŞs-Quinze, Manuel de Deus
Eram duas vezes seis,

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