Sonetos sobre Amados de Luís de Camões

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Sonetos de amados de Luís de Camões. Leia este e outros sonetos de Luís de Camões em Poetris.

Transforma-se o Amador na Cousa Amada

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
NĂŁo tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois com ele tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que como o acidente em seu sujeito,
Assim co’a alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
E o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a matéria simples busca a forma.

O CĂ©u, A Terra, O Vento Sossegado

O cĂ©u, a terra, o vento sossegado…
As ondas, que se estendem pela areia…
Os peixes, que no mar o sono enfreia…
O nocturno silĂŞncio repousado…

O pescador AĂłnio, que, deitado
onde co vento a água se meneia,
chorando, o nome amado em vĂŁo nomeia,
que nĂŁo pode ser mais que nomeado:

Ondas (dezia), antes que Amor me mate,
torna-me a minha Ninfa, que tĂŁo cedo
me fizestes Ă  morte estar sujeita.

Ninguém lhe fala; o mar de longe bate;
move-se brandamente o arvoredo;
leva-lhe o vento a voz, que ao vento deita.

Fiou Se O Coração, De Muito Isento

Fiou se o coração, de muito isento,
de si cuidando mal, que tomaria
tĂŁo ilĂ­cito amor tal ousadia,
tal modo nunca visto de tormento.

Mas os olhos pintaram tĂŁo a tento
outros que visto tem na fantasia,
que a razĂŁo, temerosa do que via,
fugiu, deixando o campo ao pensamento.

Ă“ HipĂłlito casto, que, de jeito,
de Fedra, tua madrasta, foste amado,
que nĂŁo sabia ter nenhum respeito:

em mim vingou o amor teu casto peito;
mas está desse agravo tão vingado,
que se arrepende já do que tem feito.

VĂłs Que, D’olhos Suaves E Serenos

VĂłs que, d’olhos suaves e serenos,
com justa causa a vida cativais,
e que os outros cuidados condenais
por indevidos, baixos e pequenos;

se ainda do Amor domésticos venenos
nunca provastes, quero que saibais
que Ă© tanto mais o amor despois que amais,
quanto sĂŁo mais as causas de ser menos.

E não cuide ninguém que algum defeito,
quando na cousa amada s’apresenta,
possa deminuir o amor perfeito;

antes o dobra mais; e se atormenta,
pouco e pouco o desculpa o brando peito;
que Amor com seus contrairos s’acrescenta.

Se A Fortuna Inquieta E Mal Olhada

Se a Fortuna inquieta e mal olhada,
que a justa lei do CĂ©u consigo infama,
a vida quieta, que ela mais desama,
me concedera, honesta e repousada;

pudera ser que a Musa, alevantada
com luz de mais ardente e viva flama.
fizera ao Tejo lá na pátria cama
adormecer co som da lira amada.

Porém, pois o destino trabalhoso,
que me escurece a Musa fraca e lassa,
louvor de tanto preço não sustenta;

a vossa de louvar-me pouco escassa,
outro sujeito busque valeroso,
tal qual em vĂłs ao mundo se apresenta.