Sonetos sobre Clarões de Cruz e Souza

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Sonetos de clarões de Cruz e Souza. Leia este e outros sonetos de Cruz e Souza em Poetris.

Entre Chamas

Sonhei que de astros no Infinito presa
Vagavas, brandamente adormecida,
Nas chamas siderais resplandecida,
A carne, em chamas, no Infinito, acesa…

E eu pasmava de encanto e de surpresa
Vendo a constelação indefinida
Da tua carne flamejando vida,
Dentre os íris radiantes da beleza…

E o teu corpo, nas chamas palpitando,
Os astros em redor maravilhando,
Por entre a auréola dos clarões cantava…

Então, de sonho em sonho, absorto, mudo,
Eu senti alastrar, vibrar por tudo
Toda a infinita sensação da lava!…

Sonhador

Por sóis, por belos sóis alvissareiros,
Nos troféus do teu Sonho irás cantando
As púrpuras romanas arrastando,
Engrinaldado de imortais loureiros.

Nobre guerreiro audaz entre os guerreiros,
Das Idéias as lanças sopesando,
Verás, a pouco e pouco, desfilando
Todos os teus desejos condoreiros…

Imaculado, sobre o lodo imundo,
Há de subir, com as vivas castidades,
Das tuas glórias o clarão profundo.

Há de subir, além de eternidades,
Diante do torvo crocitar do mundo,
Para o branco Sacrário das Saudades!

Eternidade Retrospectiva

Eu me recordo de já ter vivido,
Mudo e só, por olímpicas Esferas,
onde era tudo velhas primaveras
E tudo um vago aroma indefinido.

Fundas regiões do Pranto e do Gemido
Onde as almas mais graves, mais austeras
Erravam como trêmulas quimeras
Num sentimento estranho e comovido.

As estrelas, longínquas e veladas,
Recordavam violáceas madrugadas,
Um clarão muito leve de saudade.

Eu me recordo d’imaginativos
Luares liriais, contemplativos
Por onde eu já vivi na Eternidade!

Só!

Muito embora as estrelas do Infinito
Lá de cima me acenem carinhosas
E desça das esferas luminosas
A doce graça de um clarão bendito;

Embora o mar, como um revel proscrito,
Chame por mim nas vagas ondulosas
E o vento venha em cóleras medrosas
O meu destino proclamar num grito,

Neste mundo tão trágico, tamanho,
Como eu me sinto fundamente estranho
E o amor e tudo para mim avaro…

Ah! como eu sinto compungidamente,
Por entre tanto horror indiferente,
Um frio sepulcral de desamparo!

Luar

Ao longo das louríssimas searas
Caiu a noite taciturna e fria…
Cessou no espaço a límpida harmonia
Das infinitas perspectivas claras.

As estrelas no céu, puras e raras,
Como um cristal que nítido radia,
Abrem da noite na mudez sombria
O cofre ideal de pedrarias caras.

Mas uma luz aos poucos vai subindo
Como do largo mar ao firmamento — abrindo
Largo clarão em flocos d’escomilha.

Vai subindo, subindo o firmamento!
E branca e doce e nívea, lento e lento,
A lua cheia pelos campos brilha…

Réquiem Do Sol

Águia triste do Tédio, sol cansado,
Velho guerreiro das batalhas fortes!
Das ilusões as trêmulas coortes
Buscam a luz do teu clarão magoado…

A tremenda avalanche do Passado
Que arrebatou tantos milhões de mortes
Passa em tropel de trágicos Mavortes
Sobre o teu coração ensangüentado…

Do alto dominas vastidões supremas
Águia do Tédio presa nas algemas
Da Legenda imortal que tudo engelha…

Mas lá, na Eternidade, de onde habitas,
Vagam finas tristezas infinitas,
Todo o mistério da beleza velha!

Beleza Morta

De leve, louro e enlanguescido helianto
Tens a flórea dolência contristada…
Há no teu riso amargo um certo encanto
De antiga formosura destronada.

No corpo, de um letárgico quebranto,
Corpo de essência fina, delicada,
Sente-se ainda o harmonioso canto
Da carne virginal, clara e rosada.

Sente-se o canto errante, as harmonias
Quase apagadas, vagas, fugidias
E uns restos de clarão de Estrela acesa…

Como que ainda os derradeiros haustos
De opulências, de pompas e de faustos,
As relíquias saudosas da beleza.

Supremo Desejo

Eternas, imortais origens vivas
Da Luz, do Aroma, segredantes vozes
Do mar e luares de contemplativas,
Vagas visões volúpicas, velozes…

Aladas alegrias sugestivas
De asa radiante e branca de albornozes,
Tribos gloriosas, fulgidas, altivas,
De condores e de águias e albatrozes…

Espiritualizai nos Astros louros,
Do sol entre os clarões imorredouros
Toda esta dor que na minh’alma clama…

Quero vê-la subir, ficar cantando
Na chama das Estrelas, dardejando
Nas luminosas sensações da chama.