Sonetos sobre Esquecimento

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Sonetos de esquecimento escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Em Memória de Angélica

Quantas vidas possíveis já descansam
Nesta bem pobre e diminuta morte,
Quantas vidas possíveis que outra sorte
Daria ao esquecimento ou à lembrança!

Quando eu morrer, morrerá um passado;
Com esta flor, morreu só um futuro
Nas águas que o ignoram, o mais puro
Porvir hoje pios astros arrasado.

Eu, como ela, morro em infinitos
Destinos que já não me oferece o acaso;
Procura a minha sombra os gastos mitos

De uma pátria que sempre deu a face.
Um breve mármore diz a sua memória;
Sobre nós todos cresce, atroz, a história.

Amar sem Possuir é um Tormento

Se a ti, onde Amor leva o pensamento,
Meu triste coração levar pudesse,
Dó terias, cruel, do que padece,
S’inda em teu peito cabe sentimento.

Amar sem possuir é um tormento
Que só quem o suporta é que o conhece.
Não o conheces tu, pois te arrefece
Sempre, na ausência, o frio esquecimento.

Tu tens um coração que se persuade
Dever amar só quando se deleita
Na posse do prazer, da sociedade.

O meu segue outra estrada mais direita,
Ama distante, ferem-no a Saudade
O Ciúme infernal, a vil Suspeita.

Os Meus Versos

Rasga esses versos que te fiz, Amor!
Deita-os ao nada, ao pó, ao esquecimento,
Que a cinza os cubra, que os arraste o vento,
Que a tempestade os leve aonde for!

Rasga-os na mente, se os souberes de cor,
Que volte ao nada o nada de um momento!
Julguei-me grande pelo sentimento,
E pelo orgulho ainda sou maior!…

Tanto verso já disse o que eu sonhei!
Tantos penaram já o que eu penei!
Asas que passam, todo o mundo as sente…

Rasga os meus versos…Pobre endoidecida!
Como se um grande amor cá nesta vida
Não fosse o mesmo amor de toda a gente!…

Oração Da Noite

Ajoelhada, ó meu Deus, e as duas mãos unidas,
Olhos fitos na Cruz, imploro a tua graça…
Esconde-me, Jesus! da treva que esvoaça
Na tristeza e no horror das noites mal dormidas,

Maria! Virgem mãe das almas compungidas,
Sorriso no prazer, conforto na desgraça…
Recolhe essa oração que nos meus lábios passa
Em palavras de fé no teu amor ungidas.

Anjo de minha guarda, ó doce companheiro!
Tu que levas do berço ao porto derradeiro
O lúrido batel de meu sonhar sem fim,

Dá-me o sono que traz o bálsamo ao tormento,
Afoga o coração no mar do esquecimento…
Abre as asas, meu anjo, e estende-as sobre mim.

Consolo Amargo

Mortos e mortos, tudo vai passando,
Tudo pelos abismos se sumindo…
Enquanto sobre a Terra ficam rindo
Uns, e já outros, pálidos, chorando…

Todos vão trêmulos finalizando,
Para os gelados túmulos partindo,
Descendo ao tremedal eterno, infindo,
Mortos e mortos, num sinistro bando.

Tudo passa espectral e doloroso,
Pulverulentamente nebuloso
Como num sonho, num fatal letargo…

Mas, de quem chora os mortos, entretanto,
O Esquecimento vem e enxuga o pranto,
E é esse apenas o consolo amargo!

Evocação

Oh Lua voluptuosa e tentadora,
Ao mesmo tempo trágica e funesta,
Lua em fundo revolto de floresta
E de sonho de vaga embaladora.

Langue visão mortal e sedutora,
Dos Vergéis sederais pálida giesta,
Divindade sutil da morna sesta
Da lasciva paixão fascinadora.

Flor fria, flor algente, flor gelada
Do desconsolo e dos esquecimentos
E do anseio, da febre atormentada.

Tu que soluças pelos céus nevoentos
Longo soluço mágico de fada,
Dá-me os teus doces acalentamentos!

Quando A Suprema Dor Muito Me Aperta

Quando a suprema dor muito me aperta,
se digo que desejo esquecimento,
é força que se faz ao pensamento,
de que a vontade livre desconserta.

Assi, de erro tão grave me desperta
a luz do bem regido entendimento,
que mostra ser engano ou fingimento
dizer que em tal descanso mais se acerta.

Porque essa própria imagem, que na mente
me representa o bem de que careço,
faz-mo de um certo modo ser presente.

Ditosa é, logo, a pena que padeço,
pois que da causa dela em mim se sente
um bem que, inda sem ver-vos, reconheço.

O autor aos seus versos

Chorosos versos meus desentoados,
Sem arte, sem beleza e sem brandura,
Urdidos pela mão da Desventura,
Pela baça Tristeza envenenados:

Vede a luz, não busqueis, desesperados,
No mudo esquecimento a sepultura;
Se os ditosos vos lerem sem ternura,
Ler-vos-ão com ternura os desgraçados:

Não vos inspire, ó versos, cobardia
Da sátira mordaz o furor louco,
Da maldizente voz e tirania:

Desculpa tendes, se valeis tão pouco,
Que não pode cantar com melodia
Um peito de gemer cansado e rouco.