Sonetos sobre Festa

19 resultados
Sonetos de festa escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

XXXIII

Quando adivinha que vou vê-Ia, e à escada
Ouve-me a voz e o meu andar conhece,
Fica pálida, assusta-se, estremece,
E não sei por que foge envergonhada.

Volta depois. À porta, alvoroçada,
Sorrindo, em fogo as faces, aparece:
E talvez entendendo a muda prece
De meus olhos, adianta-se apressada.

Corre, delira, multiplica os passos;
E o chão, sob os seus passos murmurando,
Segue-a de um hino, de um rumor de festa

E ah! que desejo de a tomar nos braços,
O movimento rápido sustando
Das duas asas que a paixão lhe empresta.

Jovens Filhos Da Pátria, Em Vossos Peitos

Jovens filhos da pátria, em vossos peitos
Depõe a pátria seu porvir de glória:
Revolve sonhos de imortal de imortal memória,
Adejando inquieta em vossos leitos.

De vós espera sublimados feitos,
P’ra ornar de palmas a futura história;
Espera em vós, como espera em Dória,
Dória tão jovem, como vós, nos pleitos.

Atletas do porvir, marchai seguros
Da liberdade à festa sacrossanta,
A levantar-lhe mais altivos muros.

Marchai: – que aos livres nem o céu suplanta,
E o índio do Brasil, sem elmos duros,
No olhar sòmente os déspotas espanta.

Par Constante

Dia dois… uma festa… Era o mês de janeiro…
Festa da minha vida… A noite azul, brilhante…
Chegaste… E eu fui teu par… fui o teu par primeiro…
Dançamos… (como é bom lembrar aquele instante!)

Tu, tão linda, nem sei… Eu, feliz, petulante,
um pouco petulante, sim… mas cavalheiro…
Dançamos toda a noite… E fui teu par constante…
Nem só teu par constante… Eu fui teu par primeiro…

Quantas cousas te disse… E assim juntos, os dois,
com os meus olhos nos teus – afinal, quem diria
o mundo que ainda havia de surgir depois?

Quem diria ao nos ver, talvez, aquele instante,
que o nosso par feliz, constante aquele dia,
seria a vida inteira e sempre um par constante!

Renascimento

A Olegária Siqueira

Manhã de rosas. Lá no etéreo manto,
O sol derrama lúcidos fulgores,
E eu vou cantando pela estrada, enquanto
Riem crianças e desabrocham flores.

Quero viver! Há quanto tempo, quanto!
Não venho ouvir na selva os trovadores!
Quero sentir este consolo santo
De quem, voltando à vida, esquece as dores.

Ouves, minh’alma? Que prazer no ninhos!
Como é suave a voz dos passarinhos
Neste tranqüilo e plácido deserto!

Ah! entre os risos da Natura em festa,
Entoa o hino da alegria honesta,
Canta o Te Deum, meu coração liberto!

Com a Fortuna não Perde o Ser de Besta

Na carreira veloz, a deusa cega
Lança às vezes a mão a um feio mono
E o sobe, num instante, a um coche, a um trono,
Onde a Virtude com trabalho chega.

Porém se, louca, num jumento pega,
Por mais que o erga não lhe dá abono:
Bem se vê que foi sonho de seu sono,
Quando a vara ou bastão ela lhe entrega.

Pouco importa adornar asno casmurro
Com jaezes reais, mantas de festa,
Se a conhecer se dá no rouco zurro.

Quem, no berço, por vil se manifesta,
Quem nele baixo foi, quem nace burro,
Co’a Fortuna não perde o ser de besta.

Alma Serena

Alma serena, a consciência pura,
assim eu quero a vida que me resta.
Saudade não é dor nem amargura,
dilui-se ao longe a derradeira festa.

Não me tentam as rotas da aventura,
agora sei que a minha estrada é esta:
difícil de subir, áspera e dura,
mas branca a urze, de oiro puro a giesta.

Assim meu canto fácil de entender,
como chuva a cair, planta a nascer,
como raiz na terra, água corrente.

Tão fácil o difícil verso obscuro!
Eu não canto, porém, atrás dum muro,
eu canto ao sol e para toda a gente.

Cabelos Brancos

Cobrem-me as fontes já cabelos brancos,
Não vou a festas. E não vou, não vou.
Vou para a aldeia, com os meus tamancos,
Cuidar das hortas. E não vou, não vou.

Cabelos brancos, vá, sejamos francos,
Minha inocência quando os encontrou
Era um mistério vê-los: Tive espantos
Quando os achei, menino, em meu avô.

Nem caiu neve, nem vieram gelos:
Com a estranheza ingénua da mudança,
Castanhos remirava os meus cabelos;

E, atento à cor, sem ter outra lembrança,
Ruços cabelos me doía vê-los …
E fiquei sempre triste de criança.

Soneto De Intimidade

Nas tardes da fazenda há muito azul demais.
Eu saio às vezes, sigo pelo pasto agora
Mastigando um capim, o peito nu de fora
No pijama irreal de há três anos atrás.

Desço o rio no vau dos pequenos canais
Para ir beber na fonte a água fria e sonora
E se encontro no mato o rubro de uma amora
Vou cuspindo-lhe o sangue em torno dos currais.

Fico ali respirando o cheiro bom do estrume
Entre as vacas e os bois que me olham sem ciúme
E quando por acaso uma mijada ferve

Seguida de um olhar não sem malícia e verve
Nós todos, animais sem comoção nenhuma
Mijamos em comum numa festa de espuma.

De Martins Pena Foi Bem Triste A Sorte

De Martins Pena foi bem triste a sorte:
Moço, bem moço, quando o seu talento
Desabrochava n’um deslumbramento,
Caiu, ferido pela mão da morte!

Era, entretanto, um lutador, um forte,
E, como não merece o esquecimento,
Que a nossa festa, ao menos um momento,
O seu risonho espírito conforte.

Quem o amou e o leu em vão procura
O seu nome na placa de uma esquina
Ou sobre a pedra de uma sepultura!

Porém, voltando à brasileira cena,
Há de brilhar a estrela peregrina
Que se chamou Luiz Carlos Martins Pena!

Lindóia

Vem, vem das águas, mísera Moema,
Senta-te aqui. As vozes lastimosas
Troca pelas cantigas deleitosas,
Ao pé da doce e pálida Coema.

Vós, sombras de Iguaçu e de Iracema,
Trazei nas mãos, trazei no colo as rosas
Que o amor desabrochou e fez viçosas
Nas laudas de um poema e outro poema.

Chegai, folgai, cantai. É esta, é esta
De Lindóia, que a voz suave e forte
Do vate celebrou, a alegre festa.

Além do amável, gracioso porte,
Vede o mimo, a ternura que lhe resta.
Tanto inda é bela no seu rosto a morte

Vox Victiæ

Morto! Consciência quieta haja o assassino
Que me acabou, dando-me ao corpo vão
Esta volúpia de ficar no chão
Fruindo na tabidez sabor divino!

Espiando o meu cadáver resupino,
No mar da humana proliferação,
outras cabeças aparecerão
Para compartilhar do meu destino!

Na festa genetlíaca do Nada,
Abraço-me com a terra atormentada
Em contubérnio convulsionador …

E ai! Como é boa esta volúpia obscura
Que une os ossos cansados da criatura
Ao corpo ubiqüitário do Criador!

Amo!

Amo a terra! Amo o sol! Amo o céu! Amo o mar!
Amo a vida! Amo a luz! Amo as árvores! Amo
a poesia que escrevo e entusiasta declamo
aos que sentem como eu a alegria de amar!

Amo a noite! Amo a antiga palidez do luar!
A flor presa aos cabelos soltos de algum ramo!
Uma folha que cai! Um perfume no ar
onde um desejo extinto sem querer inflamo!

Amo os rios! E a estranha solidão em festa,
dessa alma que possuo multiforme e inquieta
como a alma multiforme e inquieta da floresta!

Amo a cor que há nos sons! Amo os sons que há na cor!
E em mim mesmo – amo a glória de sentir-me um Poeta
e amar imensamente o meu imenso amor!.

Realidade

Fomos longe demais, para voltar
Aos antigos canteiros onde há rosas.
Em nós, o ouvido, quase e, quase, o olhar
Buscam nas cores vozes misteriosas…

Mas o mistério é flor da juventude.
Não rima com poemas desumanos.
A idade — a nossa idade! — nunca ilude.
Só uma vez é que se tem vinte anos.

Quebrámos todos, todos os espelhos
E o sol que, neles, está hoje posto
Já não reflecte os lábios tão vermelhos
Que nos iluminam, sempre, o rosto.

Realidade? Há uma: apenas esta!
— Somos espectros na cidade em festa.

O Relógio

Ebúrneo é o mostrador: as horas são de prata
Lê-se a firma Breguet por baixo do gracioso
Rendilhado ponteiro; a tampa é enorme e chata:
Nela o esmalte produz um quadro delicioso.

Repara: eis um salão: casquilho malicioso
Das festas cortesãs o mimo, a flor, a nata,
Junto a um cravo sonoro a alegre voz desata.
Uma fidalga o escuta ébria de amor e gozo.

Rasga-se ampla a janela; ao longe o olhar descobre
O correto jardim e o parque extenso e nobre.
As nuvens no alto céu flutuam como espumas.

Da paisagem no fundo, em lago transparente,
Onde se espelha o azul e o laranjal frondente,
Um cisne à luz do sol estende as níveas plumas.

A Minha Mãe

Lembra alvuras de cisne sobre um lago
A minha vida imaculada e honesta…
Ouço bater meu coração em festa,
Pela bondade e amor que nele trago!

Do meu orgulho olímpico de mago
Só o desdém aos inimigos resta,
Maior que às folhas mortas da floresta,
Que nos meus dedos pálidos esmago.

Mas a piedade enche o meu peito, e vem,
Em vez de tão humano e vil desdém,
Ungir meus lábios de um perdão divino…

Julguei ser Deus! E choro de cansaço…
Oh, mãe piedosa, embala no regaço
Meu coração exausto de menino!…

7A Sombra – Dulce

Se houvesse ainda talismã bendito
Que desse ao pântano – a corrente pura,
Musgo – ao rochedo, festa – à sepultura,
Das águias negras – harmonia ao grito…,

Se alguém pudesse ao infeliz precito
Dar lugar no banquete da ventura…
E tocar-lhe o velar da insônia escura
No poema dos beijos – infinito…,

Certo. . . serias tu, donzela casta,
Quem me tomasse em meio do Calvário
A cruz de angústias que o meu ser arrasta!. . .

Mas ,se tudo recusa-me o fadário,
Na hora de expirar, ó Dulce, basta
Morrer beijando a cruz de teu rosário!…

Até que um Dia…

Meus versos eram rosas, lírios, heras,
borboletas, regatos, cotovias
cantando suas doces melodias,
anjos, sereias, ninfas e quimeras.

Meus versos eram pombas entre as feras
e, na festa das horas e dos dias,
ia dançando penas e alegrias
e o ano tinha quatro primaveras.

E a festa continua… é também festa
o cardo e a urze, o tojo, a murta, a giesta,
a chuva no beiral, o vento Norte,

o gosto a mar, a lágrimas, a sal,
até que um dia a vida, a bem ou mal,
exausta de cantar me empreste à morte.

Noite Escura

Noite escura do amor, em que me deito
com teu corpo de luz, eu assombrado
deste fantasma de repente alado
amplificando a jaula do meu peito.

Deixando-o infinito, maculado
de sangue e espuma (é mar este fantasma?
ou pássaro de mar que em onda espalma
seu corpo que é de luz e céu desfeito).

E a noite escura que era o amor se ajunta
em feixes de silêncio e de desmaio
para a festa defunta

de ver ressurreições: tempo em que caio
para em sombras cantar mais docemente
este sol que me põe preso e demente.

Dionysio

Ungido para o fado e a nova festa
Meu carnaval profano já celebra
As quarentenas dívidas da carne
Na cela de costelas das mulheres.

Como devasso réu, confesso fauno,
No vinho das delícias me declaro
Sem culpa e sem pecado original
Pois nessa pena sou igual a tantos.

Já disse certa vez em cantoria:
De nada me arrependo e reconfirmo
Agora que o meu tempo é só de gozo.

A vida que me dou não dá guarida
Nem guarda desalentos de tristeza
Somente na alegria é que me morro.