A Felicidade é uma Interrupção de Futilidade
É nas decisões fĂşteis, das quais nem a vida nem o estado de espĂrito depende, que reside a felicidade.
São estes os dias felizes, que Beckett invoca e amaldiçoa, por terem passado, na peça que tem o mesmo nome. Somos sobressaltados por ninharias, que conseguem fazer-se passar por importantes, como escolher entre uma camisa do verde do mar ou do azul do céu.
As decisões fĂşteis, quando a cabeça Ă© desocupada daquilo que a preocupa, para se ocupar de uma ninharia, como decidir entre o ruivo ou o rascasso ou entre a pĂŞra -pĂ©rola e a carapinheira, sĂŁo o indĂcio seguro da felicidade. Se a escolha primária Ă© entre continuar a viver e deixar de viver e as escolhas secundárias sĂŁo afluentes da primeira, devemos dar graças.
SĂŁo uma sorte temporária e alegre a oportunidade e a ocupação mental que nos permitem pensar mais naquilo que nos interessa, sem interessar, do que naquilo que nos deveria interessar, caso estivĂ©ssemos tĂŁo aflitos que nĂŁo conseguĂssemos pensar noutra coisa senĂŁo sobreviver.
Quanto mais tempo perdermos nas escolhas e nas questões de que nĂŁo dependem as nossas vidas ou as nossas almas – naquelas que nĂŁo interessam, a bem ver,
Textos sobre Camisas de Miguel Esteves Cardoso
2 resultadosO Amor PortuguĂŞs nĂŁo Ă© um FenĂłmeno Ternurento
Do carinho e do mimo, toda a gente sabe tudo o que há a saber — e mais um bocado. Do amor, ninguĂ©m sabe nada. Ou pensa-se que se sabe, o que Ă© um bocado menos do que nada. O mais que se pode fazer Ă© procurar saber quem se ama, sem querer saber que coisa Ă© o amor que se tem, ou de que sĂtio vem o amor que se faz.
Do amor Ă© bom falar, pelo menos naqueles intervalos em que nĂŁo Ă© tĂŁo bom amar. Todos os paĂses hĂŁo-de ter a sua prĂłpria cultura amorosa. A portuguesa Ă© excepcional. Nas culturas mais parecidas com a nossa, Ă© muito maior a diferença que se faz entre o amor e a paixĂŁo. Faz-se de conta que o amor Ă© uma coisa — mais tranquila e pura e duradoura — e a paixĂŁo Ă© outra — mais doĂda e complicada e efĂ©mera. Em Portugal, porĂ©m, nĂŁo gostamos de dizer que nos «enamoramos», e o «enamoramento» e outras palavras que contenham a palavra «amor» sĂŁo-nos sempre um pouco estranhas. Quando nĂłs nos perdemos de amores por alguĂ©m, dizemos (e nitidamente sentimos) que nos apaixonamos. Aqui, sabe-se lá por que atavismos atlânticos,