A Ira Ă© uma Loucura Breve
Alguns sábios afirmaram que a ira Ă© uma loucura breve; por nĂŁo se controlar a si mesma, perde a compostura, esquece as suas obrigações, persegue os seus intentos de forma obstinada e ansiosa, recusa os conselhos da razĂŁo, inquieta-se por causas vĂŁs, incapaz de discernir o que Ă© justo e verdadeiro, semelhante Ă s ruĂnas que se abatem sobre quem as derruba. Mas, para que percebas que estĂŁo loucos aqueles que estĂŁo possuĂdos pela ira, observa o seu aspecto; na verdade, sĂŁo claros indĂcios de loucura a expressĂŁo ardente e ameaçadora, a fronte sombria, o semblante feroz, o passo apressado, as mĂŁos trementes, a mudança de cor, a respiração forte e acelerada, indĂcios que estĂŁo tambĂ©m presentes nos homens irados: os olhos incendiam-se e fulminam, a cara cobre-se totalmente de um rubor, por causa do sangue que a ela aflui do coração, os lábios tremem, os dentes comprimem-se, os cabelos arrepiam-se e eriçam-se, a respiração Ă© ofegante e ruidosa, as articulações retorcem-se e estalam, entre suspiros e gemidos, irrompem frases praticamente incompreensĂveis, as mĂŁos entrechocam-se constantemente, os pĂ©s batem no chĂŁo e todo o corpo se agita ameaçador, a face fica inchada e deformada, horrenda e assutadora. Ficas sem saber se o que há de pior neste vĂcio Ă© ele ser detestável ou tĂŁo disforme.
Textos sobre Cara de Séneca
3 resultadosRegras de Conduta para Viver sem Sobressaltos
Vou indicar-te quais as regras de conduta a seguir para viveres sem sobressaltos. (…) Passa em revista quais as maneiras que podem incitar um homem a fazer o mal a outro homem: encontrarás a esperança, a inveja, o Ăłdio, o medo, o desprezo. De todas elas a mais inofenÂsiva Ă© o desprezo, tanto que muitas pessoas se tĂŞm sujeitado a ele como forma de passarem despercebidas. Quem despreza o outro calca-o aos pĂ©s, Ă© evidente, mas passa adiante; ninguĂ©m se afadiga teimosamente a fazer mal a alguĂ©m que despreza. É como na guerra: ninguĂ©m liga ao soldado caĂdo, combate-se, sim, quem se ergue a fazer frente.
Quanto Ă s esperanças dos desonestos, bastar-te-á, para evitá-las, nada possuĂres que possa suscitar a pĂ©rfida cobiça dos outros, nada teres, em suma, que atraia as atenções, porquanto qualquer objecto, ainda que pouco valioso, suscita desejos se for pouco usual, se for uma raridade. Para escapares Ă inveja deverás nĂŁo dar nas vistas, nĂŁo gabares as tuas propriedades, saberes gozar discretamente aquilo que tens. Quanto ao Ăłdio, ou derivará de alguma ofensa que tenhas feito (e, neste caso, bastar-te-á nĂŁo lesares ninguĂ©m para o evitares), ou será puramente gratuito, e entĂŁo será o senso comum quem te poderá proteger.
O Temor Combate-se com a Esperança
NĂŁo haverá razĂŁo para viver, nem termo para as nossas misĂ©rias, se fĂ´r mister temer tudo quanto seja temĂvel. Neste ponto, põe em acção a tua prudĂŞncia; mercĂŞ da animosidade de espĂrito, repele inclusive o temor que te acomete de cara descoberta. Pelo menos, combate uma fraqueza com outra: tempera o receio com a esperança. Por certo que possa ser qualquer um dos riscos que tememos, Ă© ainda mais certo que os nossos temores se apaziguam, quando as nossas esperanças nos enganam.
Estabelece equilĂbrio, pois, entre a esperança e o temor; sempre que houver completa incerteza, inclina a balança em teu favor: crĂŞ no que te agrada. Mesmo que o temor reuna maior nĂşmero de sufrágios, inclina-a sempre para o lado da esperança; deixa de afligir o coração, e figura-te, sem cessar, que a maior parte dos mortais, sem ser afectada, sem se ver seriamente ameaçada por mal algum, vive em permanente e confusa agitação. É que nenhum conserva o governo de si mesmo: deixa-se levar pelos impulsos, e nĂŁo mantĂ©m o seu temor dentro de limites razoáveis. Nenhum diz:
– Autoridade vĂŁ, espĂrito vĂŁo: ou inventou, ou lho contaram.
Flutuamos ao mĂnimo sopro. De circunstâncias duvidosas,