Textos sobre Entendimento de Michel de Montaigne

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Textos de entendimento de Michel de Montaigne. Leia este e outros textos de Michel de Montaigne em Poetris.

Dificuldade de Leitura

Quando encontro alguma dificuldade no curso da leitura, não fico a roer as unhas; passo adiante, depois de ter feito uma ou duas tentativas de resolvê-la.
Se insistisse nela, iria perder-me, e ao meu tempo, pois tenho espírito resoluto e impaciente. O que não vejo da primeira vez, menos o vejo se insistir. Nada faço sem alegria; o esforço por demais seguido e obstinado ofusca, aflige e fatiga o meu entendimento. A minha vista confunde-se e cansa-se. É-me mister dar-lhe alguma distracção, do mesmo modo por que, para avaliar o lustro do escarlate, recomendam-nos que lhe passemos os olhos de relance, e que voltemos a fazê-lo diversas vezes, de modo súbito e reiterado.

As Influências no Estado de Espírito

Agora estou disposto a fazer tudo, agora a nada fazer; o que me é um prazer neste momento em alguma outra vez me será um esforço. Acontecem em mim mil agitações desarrazoadas e acidentais. Ou o humor melancólico me domina, ou o colérico; e, com a sua autoridade pessoal, neste momento a tristeza predomina em mim, neste momento a alegria. Quando pego em livros, terei captado em determinada passagem qualidades excelentes e que terão tocado a minha alma; quando uma outra vez volto a deparar com ela, por mais que a vire e revire, por mais que a dobre e apalpe, é para mim uma massa desconhecida e informe.
Mesmo nos meus escritos nem sempre reencontro o sentido do meu pensamento anterior: não sei o que quis dizer, e amiúde me esfalfo corrigindo e dando-lhe um novo sentido, por haver perdido o primeiro, que valia mais. Não faço mais que ir e vir: o meu julgamento nem sempre caminha para a frente; ele flutua, vagueia, Como um barquinho frágil surpreendido no vasto mar por uma tempestade violenta (Catulo).
Muitas vezes (como habitualmente me advém fazer), tendo tomado para defender, por exercício e por diversão, uma opinião contrária à minha,

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Disputas Empobrecedoras

As disputas deviam ser regulamentadas e punidas como outros crimes verbais. Que defeitos não suscitam e acumulam em nós, reguladas e governadas como são pela cólera! Começamos por ser inimigos das razões e acabamos por o ser dos homens. Só aprendemos a discutir para contraditar, e, à força de se contraditar e ser-se contraditado, vem a acontecer que o fruto do discutir é perder e aniquilar-se a verdade. Assim, Platão, na República, proíbe o seu exercício aos espíritos ineptos e mal formados.
Porque nos havemos de pôr a caminho, para descobrir a verdade, com quem não tem passo nem andamento que sirvam? Não se prejudica o assunto quando o deixamos para procurar o meio de o tratarmos; não falo dos meios escolásticos e artificiais, falo dos meios naturais, dum entendimento são. Que sucederá por fim? Cada um puxa para o seu lado; perdem de vista o essencial, põem-no de parte na confusão do acessório.
No fim de uma hora de tormenta já não sabem o que procuram; um está em cima, outro em baixo, outro para o lado. Uns demoram-se com as palavras e com as comparações; outros não entendem o que se lhes objecta, tanto se entusiasmam: só pensam neles,

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