Textos sobre Europa de José Ortega y Gasset

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Textos de europa de José Ortega y Gasset. Leia este e outros textos de José Ortega y Gasset em Poetris.

A Vulgaridade Intelectual

Hoje, (…) o homem médio tem as «ideias» mais taxativas sobre quanto acontece e deve acontecer no universo. Por isso perdeu o uso da audição. Para quê ouvir, se já tem dentro de si o que necessita? Já não é época de ouvir, mas, pelo contrário, de julgar, de sentenciar, de decidir. Não há questão de vida pública em que não intervenha, cego e surdo como é, impondo as suas «opiniões».
Mas não é isto uma vantagem? Não representa um progresso enorme que as massas tenham «ideias», quer dizer, que sejam cultas? De maneira alguma. As «ideias» deste homem médio não são autenticamente ideias, nem a sua posse é cultura. A ideia é um xeque-mate à verdade. Quem queira ter ideias necessita antes de dispor-se a querer a verdade, e aceitar as regras do jogo que ela imponha. Não vale falar de ideias ou opiniões onde não se admite uma instância que as regula, uma série de normas às quais na discussão cabe apelar. Estas normas são os princípios da cultura. Não me importa quais são. O que digo é que não há cultura onde não há normas. A que os nossos próximos possam recorrer.
Não há cultura onde não há princípios de legalidade civil a que apelar.

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O Homem-Massa

Numa boa ordenação das coisas públicas, a massa é o que não actua por si mesma. Tal é a sua missão. Veio ao mundo para ser dirigida, influída, representada, organizada – até para deixar de ser massa, ou, pelo menos, aspirar a isso. Mas não veio ao mundo para fazer tudo isso por si. Necessita referir a sua vida à instância superior, constituída pelas minorias excelentes. Discuta-se quanto se queira quem são os homens excelentes; mas que sem eles – sejam uns ou outros – a humanidade não existiria no que tem de mais essencial, é coisa sobre a qual convém que não haja dúvida alguma, embora leve a Europa todo um século a meter a cabeça debaixo da asa, ao modo dos estrúcios para ver se consegue não ver tão radiante evidência. Porque não se trata de uma opinião fundada em factos mais ou menos frequentes e prováveis, mas numa lei da «física» social, muito mais incomovível que as leis da física de Newton. No dia em que volte a imperar na Europa uma autêntica filosofia – única coisa que pode salvá-la –, compreender-se-á que o homem é, tenha ou não vontade disso, um ser constitutivamente forçado a procurar uma instância superior.

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O Perigo da Extinção do Individualismo

Ao contemplar nas grandes cidades essas imensas aglomerações de seres humanos, que vão e vêm pelas suas ruas ou se concentram em festivais e manifestações políticas, incorpora-se em mim, obsedante, este pensamento: pode hoje um homem de vinte anos formar um projecto de vida que tenha figura individual e que, portanto, necessitaria realizar-se mediante as suas iniciativas independentes, mediante os seus esforços particulares? Ao tentar o desenvolvimento desta imagem na sua fantasia, não notará que é, senão impossível, quase improvável, porque não há à sua disposição espaço em que possa alojá-la e em que possa mover-se segundo o seu próprio ditame? Logo advertirá que o seu projecto tropeça com o próximo, como a vida do próximo aperta a sua. O desânimo leva-lo-á com a facilidade de adaptação própria da sua idade a renunciar não só a todo o acto, como até a todo o desejo pessoal e buscará a solução oposta: imaginará para si uma vida standard, composta de desideratos comuns a todos e verá que para consegui-la tem de a solicitar ou exigir em coletividade com os demais. Daí a acção em massa.
A coisa é horrível, mas não creio que exagera a situação efectiva em que se vão achando quase todos os europeus.

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