Exercitar a Vontade Naquilo que Podemos Ter de Melhor
Ponho-me a pensar na quantidade dos que exercitam o físico, e na escassez dos que ginasticam a inteligência; na afluência que têm os gratuitos espectáculos desportivos, e na ausência de público durante as manifestações culturais; enfim, na debilidade mental desses atletas de quem admiramos as espáduas musculadas. E penso sobreutdo nisto: se o corpo pode, à força de treino, atingir um grau de resistência tal que permite ao atleta suportar a um tempo os murros e pontapés de vários adversários, que o torna apto a aguentar um dia inteiro sob um sol abrasador, numa arena escaldante, todo coberto de sangue – não será mais fácil ainda dar à alma uma tal robustez que a torne capaz de resistir sem ceder aos golpes da fortuna, capaz de erguer-se de novo ainda que derrubada e espezinhada?! De facto, enquanto o corpo, para se tornar vigoroso, depende de muitos factores materiais, a alma encontra em si mesma tudo quanto necessita para se robustecer, alimentar, exercitar. Os atletas precisam de grande quantidade de comida e bebida, de muitos unguentos, sobretudo de um treino intensivo: tu, para atingires a virtude, não precisarás de dispender um tostão em equipamento! Aquilo que pode fazer de ti um homem de bem existe dentro de ti.
Textos sobre Dia
590 resultadosSe a Sua Vida Acabasse Amanhã
Quando foi a última vez que se riu com um amigo ao ponto de lhe doer a cara ou deixou as crianças com uma baby-sitter e foi passar todo o fim de semana fora? Vamos diretos ao assunto: se a sua vida acabasse amanhã, o que é que lamentaria não ter feito? Se este fosse o último dia da sua vida, passava-o da forma como o está a passar hoje? Uma vez passei por um outdoor que me chamou a atenção. Dizia: «Quem morrer com mais brinquedos morre na mesma.»
Qualquer pessoa que já tenha estado perto da morte lhe dirá que no fim da vida o mais provável é não se lembrar das diretas que fez a trabalhar no escritório ou quanto vale a sua conta-poupança. Os pensamentos que surgem são questões do tipo «e se», como por exemplo: Onde teria chegado se tivesse realmente feito as coisas que sempre quis fazer?
O dom de decidir encarar a mortalidade sem fugir nem virar a cara é o dom de reconhecer que, pelo facto de morrermos um dia, temos de viver agora. Se vai estagnar ou se vai crescer, isso depende sempre de si — você é quem mais influencia a sua vida.
As Atitudes Mentais são mais Importantes que a Capacidade Mental
Tudo, na sua vida, depende da sua atitude. A felicidade não depende de coisas à sua volta, mas da sua atitude. É uma lei que importa recordar. As nossas atitudes controlam as nossas vidas. São uma força secreta a labutar vinte e quatro horas por dia, para o bem ou para o mal. É importante sabermos como domesticar e controlar essa grande força. As atitudes mentais são mais importantes que a capacidade mental. As atitudes afectam o corpo; criamos um clima dentro de nós e à nossa volta com as nossas atitudes. Tenha uma atitude agradável, afectuosa e amistosa.
Séneca, o sábio romano, afirmou: – «Um homem pode governar o mundo inteiro e continuar infeliz, se não sentir que é supremamente feliz».
Que beleza existe no mundo em que vive? Ora bem, é tão belo como a sua atitude mental. Resolva ter uma atitude feliz, confiante, enérgica, positiva, entusiástica. A disposição interior, mais que qualquer outra coisa, pode dar a perspectiva adequada e a faculdade para resolver qualquer situação. Cada pessoa tem uma tendência para uma atitude construtiva ou negativa. Manter pensamentos positivos requer vigilância constante e desenvolvimento do carácter através do estudo e da experiência.
Confissão
Trinta e nove anos. Meia vida passada, se isto se for aguentando, tomba daqui, tomba dali. E tudo por fazer! Comecei tarde, sem nenhuma preparação, e com defeitos horríveis, que tenho ido limando pouco a pouco, mas que resistem como fortalezas. Nasci afirmativo demais, puritano demais, uno demais, apesar duma timidez confrangedora, duma aceitação natural da volúpia e duma dispersão aflitiva a cada instante. Tenho medo dum polícia e sou capaz de enfrentar um exército; passo a vida a praticar virtudes que proíbo terminantemente aos outros; escrevo um poema, a dar uma consulta. De maneira que nunca consegui encontrar aquele equilíbrio criador onde julgo existir o pomar das grandes obras. Debato-me entre forças contraditórias, e ao cabo de cada livro sinto-me insatisfeito e culpado como um pecador que não cumpriu bem a sua penitência. Não tenho ambições fora da arte, e, dentro dela, só desejo conquistar a glória de a ter servido humilde e totalmente; mas não consegui ainda dar-lhe tudo, jogar a vida e a morte por ela. Para isso era preciso calcar aos pés o homem civil que sou, e não posso. Necessito de ter as minhas contas em dia como qualquer mortal honrado, e afligem-me os assuntos do mundo como casos pessoais.
Memória doutro Rio
São muito vastas as noites de insónia, quase sempre atravessadas por um rio. Quando não chove, confusamente dispo-me atrás dos amieiros e abandono-me à corrente. Sigo para o sul, que é para onde correm todos os rios, pelo menos os meus.
Um dia, numa língua de areia, avistei dois corpos que se penetravam exasperados. Fiquei aterrado: primeiro pensei que ele a estava a matar, a seguir que ambos estivessem a morrer, só depois percebi o que se passava, e o meu próprio corpo se exasperou. Quando acabaram, a mulher chorava e o homem quase lhe mijava em cima. Afastaram-se cada um para seu lado, sem trocarem palavra.
Contei o que vira a um pastor que encontrei mais abaixo. Pouco mais velho era do que eu, mas mostrou-me como o prazer não tem forçosamente que ver com a culpa.
Amizade Condicionada
A amizade é menos frequente entre pessoas azedas e entre os mais velhos, porque quanto pior for o feitio das pessoas, menor é o prazer que têm no convívio. Ora o bom feitio e o convívio social são marcas de amizade e motivos criadores de amizade. Por este motivo, os jovens depressa se tornam amigos, os velhos, não. É que não se podem tornar amigos daqueles na presença dos quais não sentem prazer; de modo semelhante se passa com os que estão sempre mal dispostos. Estes também podem ser benevolentes entre si porque desejam o bem ao outro e vão ao encontro das necessidades do outro. Contudo, não são completamente amigos uma vez que não passam juntos o dia nem sentem prazer na companhia um do outro, coisas que parecem ser marcas distintivas de amizade.
Agora, parece que não é possível ser-se amigo de muitas pessoas, pelo menos no sentido pleno da amizade, do mesmo modo que não é possível amar ao mesmo tempo muitas pessoas (tal parece que, na realidade, seria excessivo; e o amor costuma nascer naturalmente em relação a uma única pessoa), porque não é fácil de agradar de modo totalmente satisfatório a muitos ao mesmo tempo.
O Amor é a Nossa Essência Primordial
Teria a vida algum encanto sem o amor? Acredito que o amor é o mistério invisível que nos envolve. Tal como escreveu o grande poeta indiano Rabindranath Tagore: «O amor não é um mero impulso. Deve conter a verdade, que é a lei.» Nem todos nós somos capazes de o exprimir por palavras tão eloquentes mas a intensidade do nosso desejo de amar e de sermos amados é uma característica exclusivamente humana.
Na sua forma mais elevada, o amor transforma a nossa natureza. Gera ternura e afeto. Substitui a raiva pela compaixão. Quando as pessoas procuram o meu conselho, o amor e os relacionamentos são o principal tema das questões que me colocam. Repare bem: a paixão talvez seja a experiência mais profunda que qualquer um de nós poderá viver – mas também a mais enigmática. Porque será o amor tão doloroso quando nos proporciona tamanho êxtase? O que o tornará tão extremo ao ponto de se transformar em ódio e ciúme quando nos sentimos traídos?
No nosso dia a dia confrontamo-nos com toda a espécie de pequenos imprevistos mas, no que diz respeito ao amor, a nossa própria vida parece estar em jogo. Os nossos relacionamentos amorosos e os laços de família são as forças mais poderosas que influenciam a nossa vida.
O Porto é Só…
O Porto é só uma certa maneira de me refugiar na tarde, forrar-me de silêncio e procurar trazer à tona algumas palavras, sem outro fito que não seja o de opor ao corpo espesso destes muros a insurreição do olhar.
O Porto é só esta atenção empenhada em escutar os passos dos velhos, que a certas horas atravessam a rua para passarem os dias no café em frente, os olhos vazios, as lágrimas todas das crianças de S. Victor correndo nos sulcos da sua melancolia.
O Porto é só a pequena praça onde há tantos anos aprendo metodicamente a ser árvore, procurando assim parecer-me cada vez mais com a terra obscura do meu próprio rosto.
Desentendido da cidade, olho na palma da mão os resíduos da juventude, e dessa paixão sem regra deixarei que uma pétala poise aqui, por ser tão branca.1979
Estar Sozinho
Tornei-me um homem da multidão. Nunca confiei em mim próprio o bastante para estar sozinho. Dia e noite caminhava lestamente através das multidões, acotovelando, agarrando-me ansioso a quem pudesse. Muitos pensavam que eu era ladrão. Mas comprimia o meu corpo contra o corpo dos outros como uma criança se agarra à mãe durante uma tempestade. Procurava tapar os olhos à minha consciência como uma criança procura não avistar o relâmpago; esforçava-me por tapar os meus ouvidos mentais, como uma criança procura esconder-se no regaço da mãe para não ouvir o som dos trovões. E se houvesse uma clareira nessa multidão, apressava-me, corria, os braços esticados, ansioso pelo toque do corpo de alguém, o meu próprio corpo ansioso pelo contacto fugaz. E sempre, sempre, entre a confusão e o ruído das passadas, tremia a ouvir esses passos constantes, inexoráveis.
Crónica de Natal
Todos os anos, por esta altura, quando me pedem que escreva alguma coisa sobre o Natal, reajo de mau modo. «Outra vez, uma história de Natal! Que chatice!» — digo. As pessoas ficam muito chocadas quando eu falo assim. Acham que abuso dos direitos que me são conferidos. Os meus direitos são falar bem, assim como para outros não falar mal. Uma vez, em Paris, um chauffeur de táxi, desses que se fazem castiços e dizem palavrões para corresponder à fama que têm, aborreceu-me tanto que lhe respondi com palavrões. Ditos em francês, a mim não me impressionavam, mas ele levou muito a mal e ficou amuado. Como se eu pisasse um terreno que não era o meu e cometesse um abuso. Ele era malcriado mas eu – eu era injusta. Cada situação tem a sua justiça própria, é isto é duma complexidade que o código civil não alcança.
Mas dizia eu: «Outra vez o Natal, e toda essa boa vontade de encomenda!» Ponho-me a percorrer as imagens que são de praxe, anjos trombeteiros, pastores com capotes de burel e meninos pobres do tempo da Revolução Industrial inglesa. Pobres e explorados, mas, entretanto, não excluídos do trato social através dos seus conflitos próprios,
Nós é Que Não Estamos Prontos
Nós é que não estamos prontos. Os objectos da nossa felicidade existem há dias, anos, talvez séculos; esperam que a luz se faça em nossos olhos para os vermos, e que o vigor chegue aos nossos braços para os agarrarmos. Eles esperam e espantam-se de há tanto tempo ali estarem inúteis. Sofremos, sofremos de cada vez que duvidamos de alguém ou de qualquer coisa, mas o nosso sofrimento transforma-se em alegria logo que apreendemos, nessa pessoa ou nessa coisa, a beleza imortal que nos fazia amá-la.
A Necessidade da Metafísica
A razão humana tem este destino singular, numa parte dos seus conhecimentos, de sucumbir ao peso de certas questões que não pode evitar. Com efeito, tais questões impõem-se à razão devido à sua mesma natureza, mas ela não pode responder-lhes porque de todo ultrapassam a sua capacidade.
Não devemos contar que o espírito humano renuncie um dia por completo às indagações metafísicas: seria o mesmo que aguardar que, em vez de respirar sempre um ar viciado, suspendêssemos um belo dia a respiração. Por conseguinte, haverá sempre no mundo, ou, melhor, em todo homem, sobretudo se ele reflecte, uma metafísica, que, na ausência de uma norma comum, cada qual talhará a seu grado; ora o que até aqui se tem denominado metafísica não pode satisfazer nenhum espírito reflectido, mas renunciar a ela por completo é também impossível; é necessário, pois, empreender enfim uma crítica da razão pura em si, ou, se alguma existe, perscrutá-la e examiná-la em conjunto; na verdade, não há outro meio de satisfazer esta exigência imperiosa, que é coisa muito diferente de um simples desejo de saber.
A Mentira é mais Interessante que a Verdade
«O que é a verdade»? Perguntava Pilatos gracejando, talvez que não esperasse pela resposta. Há quem se delicie com a inconstância, e considere servidão o fixar-se numa crença; há quem se afeiçoe ao livre-arbítrio tanto no pensar como no agir. E se bem que as seitas de filósofos desta espécie hajam desaparecido, sobrevivem alguns representantes da mesma família, apesar de nas veias não lhes correr tanto sangue como nas dos antigos. Não é somente a dificuldade e a canseira que o homem experimenta ao perseguir a verdade, nem sequer o facto de, uma vez encontrada, se impor aos pensamentos humanos, o que leva a conceder às mentiras os maiores favores; é sim, um natural mas corrompido amor da própria mentira. Uma das últimas escolas dos Gregos examinou esta questão, mas deteve-se a pensar no que leva o homem a armar as mentiras, quando não o faz por prazer, como os poetas, ou por utilidade, como os mercadores, mas pelo próprio mentir.
Não sei como dizê-lo, mas a verdade é uma luz nua e crua que não mostra as máscaras, as cegadas e os cortejos do mundo com metade da altivez e da graciosidade com que aparecem iluminados pelos candelabros.
As Canseiras Destinam-se a Satisfazer os Luxos
Nos dias de hoje, quem consideras tu como sábio? O técnico que sabe montar repuxos de água perfumada através de canalizações invisíveis, o que é capaz de encher ou esvaziar num instante os canais artificiais, o que sabe dar diversas disposições aos caixotões móveis do tecto de modo a que o salão de banquetes vá mudando de decoração à medida que vão surgindo os vários pratos? Ou antes aquele que demonstra, a si mesmo e aos outros, que a natureza nos não impõe nada que seja duro e difícil, que para termos uma casa não carecemos de marmoristas ou de marceneiros, que para nos vestirmos não dependemos do comércio da seda, em suma, que para dispormos do essencial à vida quotidiana nos basta aquilo que a terra nos apresenta à superfície? Se a humanidade se dispusesse a seguir os conselhos de um tal homem imediatamente perceberia que tão inútil é o cozinheiro como o soldado!
Os antigos, esses homens que satisfaziam sem quaisquer excessos as suas necessidades físicas, eram de facto sábios, ou pelo menos muito próximo de o serem. Para se obter o indispensável não é preciso muito esforço; as canseiras destinam-se a satisfazer os luxos. Tu podes dispensar todos os técnicos: basta que sigas a natureza!
Sensibilidade e Maturidade
Uma certa vivacidade de impressões, mais directamente dependentes da sensibilidade física, decresce com a idade. Ao chegar aqui, e sobretudo depois de ter aqui passado alguns dias, não senti, desta vez, essas vagas de tristeza ou de entusiasmo que este local me costumava comunicar, e cuja recordação, depois, me era tão doce.
Deixá-lo-ei, se calhar, sem a pena que outrora sentia. O meu espírito, por seu turno, tem hoje uma segurança muito maior, uma maior capacidade de fazer associações e de se exprimir; a inteligência cresceu, mas a alma perdeu parte da sua elasticidade e irritabilidade. E porque é que, ao fim e ao cabo, não partilhará o homem o destino comum de todos os outros seres?
Ao pegarmos num fruto delicioso, será justo pretender respirar ao mesmo tempo o perfume da flor? Foi preciso passar pela subtil delicadeza da nossa sensibilidade juvenil para chegar a esta segurança e maturidade do espírito. Talvez os grandes homens – é o que eu penso – sejam aqueles que, numa idade em que a inteligência possui já a sua plena força, ainda conservam parte dessa impetuosidade das impressões, que é própria da juventude.
A Hipocondria
Há doenças graves de que podemos morrer; a seguir, há outras que notamos e sentimos sem muitas preocupações, pois que delas se não morre logo; por fim, existem também as que apenas se reconhecem ao microscópio, o que lhes permite conduzir-se de um modo verdadeiramente repugnante, e esse microscópio é a hipocondria. Acredito que se os homens quisessem, de verdade, dar-se ao trabalho de estudar as doenças microscópicas, teriam a satisfação de estar doentes todos os dias.
Aproveita a Alegria
Sempre achei mais trágico e inteligente o oportunista que aconselha “aproveita que esta alegria não vai continuar, quanto mais repetir-se” do que o realista que despreza a alegria por ser temporária e logo, por atacado, estúpida e falsa.
É tudo mentira. Os momentos são tão diferentes uns dos outros como as pessoas que os vivem. Cada um de nós é uma multidão que varia, conforme a ocasião, no pouco tempo de vida, disfarçado para parecer de mais, que nos é concedido. Sem termos pedido.
A atitude de cada um é que manda: vamos aproveitar ou vamos ser verdadeiros? Vamos trair a nossa falsa obrigação para com a verdade que nunca existiu ou oferecermo-nos como vítimas da ilusão que sempre funcionou para nos pôr mais bem dispostos, não só à maneira do cinema como à luz do que vimos no cinema, incluindo o que não estava (milagrosamente) lá?
Cabe a cada um escolher o momento do dia e a diferença de cada dia, conforme o mundo e a maré com que vamos ter.
Não Passo um Dia sem te Desejar
Não passo um dia sem te desejar, nem uma noite sem te apertar nos meus braços; não tomo uma chávena de chá sem amaldiçoar a glória e a ambição que me mantêm afastado da vida da minha vida. No meio das mais sérias tarefas, enquanto percorro o campo à frente das tropas, só a minha adorada Josefina me ocupa o espírito e o coração, absorvendo-me por completo o pensamento. Se me afasto de ti com a rapidez da torrente do Ródano, é para tornar a ver-te o mais cedo possível. Se me levanto a meio da noite para trabalhar, é no intuito de abreviar a tua vinda. (…) Adeus, mulher, tormento, felicidade, esperança da minha vida, que eu amo, que eu temo, que me inspira os sentimentos mais ternos e naturais, tanto como me provoca ímpetos mais vulcânicos do que o trovão. Não te peço amor eterno nem fidelidade, apenas verdade e uma franqueza sem limites. No dia em que disseres: «quero-te menos», será o último dia do amor. Se o meu coração atingisse a baixeza de poder continuar a amar sem ser amado, trincá-lo-ia com os dentes. Josefina. Lembra-te do que te disse algumas vezes: a natureza fez-me a alma forte e decidida.
O Segredo dos Seres e do Mundo
Sentia-me à vontade em tudo, isso é verdade, mas ao mesmo tempo nada me satisfazia. Cada alegria fazia-me desejar outra. Ia de festa em festa. Acontecia-me dançar noites a fio, cada vez mais louco com os seres e com a vida. Por vezes, já bastante tarde, nessas noites em que a dança, o álcool leve, o meu desenfreamento, o violento abandono de cada qual, me lançavam para um arroubo ao mesmo tempo lasso e pleno, parecia-me, no extremo da fadiga e no lapso de um segundo, compreender, enfim, o segredo dos seres e do mundo. Mas a fadiga desaparecia no dia seguinte e, com ela, o segredo; e eu atirava-me outra vez.
A Acção Edifica-nos
Os nossos actos transformam-nos; em cada um dos nossos actos se exercem certas forças – enquanto que noutros, não – forças essas que assim são transitoriamente ignoradas; e sempre uma paixão se afirma em detrimento doutras paixões, às quais retira forças. Os nossos actos marcadamente habituais acabam por formar em redor de nós como que um edifício sólido; açambarcam as nossas forças de tal modo, que tornam difícil um desvio de intenções.
Acontece também que uma abstenção habitual acaba por transformar o homem. Até pela cara se consegue adivinhar quem é um homem que se tem vencido a si próprio diariamente, ou quem é um homem que se entrega com passividade ao dia a dia.
A primeira consequência da acção, é ser ela a edificar-nos, até fisicamente.