Textos sobre Nomes de Michel de Montaigne

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Textos de nomes de Michel de Montaigne. Leia este e outros textos de Michel de Montaigne em Poetris.

Virtude Representa Muito Mais que Bondade

Parece-me que a virtude é coisa diferente e mais nobre do que as inclinações para a bondade que nascem em nós. As almas bem ajustadas por si mesmas e bem nascidas seguem o mesmo andamento e apresentam nas suas ações a mesma aparência que as virtuosas. Porém a virtude significa não sei quê de maior e mais activo do que, por uma índole favorecida, deixar-se conduzir docemente e tranquilamente na esteira da razão. Aquele que com uma doçura e complacência naturais menosprezasse as ofensas recebidas faria coisa mui bela e digna de louvor; mas aquele que, espicaçado e ultrajado até o âmago por uma ofensa, se armasse com as armas da razão contra o furio­so apetite de vingança e após um grande conflito finalmen­te o dominasse, sem a menor dúvida seria muito mais. Aquele agiria bem, e este virtuosamente: uma acção poder-­se-ia dizer bondade; a outra, virtude, pois parece que o nome de virtude pressupõe dificuldade e oposição, e que ela não pode se exercer sem combate. Talvez seja por isso que chamamos Deus de bom, forte e liberal, e justo; mas não O chamamos de virtuoso: Os Seus actos são todos natu­rais e sem esforço.
Metelo, o único de todos os senadores romanos a se ter proposto,

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A Vantagem de Ter Pouca Memória

Não há outro homem a quem aventurar-se a falar de memória assente tão mal. Pois praticamente não reconheço em mim vestígio dela, e não creio que haja no mundo uma outra tão prodigiosa em insuficiência. Tenho banais e comuns todas as minhas outras qualidades. Mas nesta creio ser singular e muito raro, e digno de por ela ganhar nome e fama.
(…) Em certa medida, consolo-me. Em primeiro lugar porque esse é um mal pelo qual encontrei principalmente o meio de corrigir um mal pior que poderia facilmente ter surgido em mim, ou seja, a ambição, pois é uma falta (a falta de memória) inadmissível para quem se envolve nos negócios do mundo; e porque, como mostram vários exemplos semelhantes do andamento da natureza, esta de bom grado fortaleceu em mim outras faculdades na medida em que aquela se enfraqueceu, e facilmente eu iria deitando e enlaguescendo o meu espírito e o meu discernimento sobre os rastros de outrem, como faz o mundo, sem exercer as suas próprias forças, se as ideias e opiniões alheias estivessem presentes em mim pelo benefício da memória.
E porque as minhas falas são mais curtas, pois o armazém da memória costuma ser mais bem provido de matéria do que o da invenção;

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Virtude Viciosa

Como se tivéssemos o tacto infectado, corrompemos com a nossa manipulação as coisas que por si mesmas são belas e boas. Podemos aprender a virtude de forma que ela se tornará viciosa, se a abraçarmos com um desejo demasiadamente ávido e violento. Os que dizem que na virtude nunca há excesso, porque já não há virtude se o excesso ali está, jogam com as palavras: O sábio deve receber o nome de insensato, o justo o de injusto se eles forem longe demais, mesmo nos seus esforços para atingir a virtude (Horácio). É uma consideração subtil da filosofia. Pode-se tanto amar demais a virtude como se comportar com excesso numa acção justa. A esse ponto de vista se ajusta a voz divina: Não sejais mais sábios do que é preciso, mas sede sobriamente sábios (São Paulo).

O Vício da Glória

De todas as tolices do mundo, a mais aceite e mais universal é a preocupação com a reputação e a glória, que desposamos a ponto de deixar de lado as riquezas, o descanso, a vida e a saúde, que são bens reais e substanciais, para seguirmos essa vã imagem e essa simples palavra que não tem corpo nem pregnância: A fama, que encanta com a sua doce voz os mortais soberbos e que parece tão bela, é apenas um eco, um sonho, ou antes a sombra de um sonho, que ao menor sopro se dissipa e desvanece (Torquato Tasso). E, das veleidades desarrazoadas dos homens, parece que mesmo os filósofos se desfazem desta mais tarde e mais a contragosto que de qualquer outra.
É a mais pertinente e pertinaz: Pois não cessa de tentar até mesmo aqueles que progrediram no caminho da vitude (Santo Agostinho). Quase não há outra cuja vacuidade a razão aponte tão claramente; mas ela tem dentro de nós raízes tão vivas que não sei se alguém jamais conseguiu libertar-se totalmente. Depois que tudo dissestes e em tudo acreditastes para renegá-la, ela produz contra o vosso raciocínio uma inclinação tão intestina que mal tendes com que lhe resistir.

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