Tudo o que Somos é Ficção
Há que entender que tudo o que somos é ficção.
Pessoas atrás de pessoas pedem-me conselhos. Acreditam que o que escrevo me torna em alguĂ©m especial, capaz de lhes entender o que fazem, o que sentem, atĂ© o que escrevem. Fico perdido, sem saber o que fazer, sem saber o que dizer. E Ă© por isso que escrevo. Escrever Ă© estar perdido e procurar, a cada frase, um caminho. Ou um simples sinal de que pode haver um caminho, de que pode haver uma esperança. Escrever Ă© procurar a esperança, todos os dias, no que nĂŁo existe, no que se escreve para ver se existe. NĂŁo sou escritor, nunca fui escritor, nĂŁo quero ser escritor. Sou apenas o gajo que escreve porque tem de escrever, porque os dias exigem que escreva, porque uma urgĂŞncia qualquer o obriga a escrever. Escrevo como necessidade biolĂłgica, e Ă s vezes custa tanto ter de escrever. NĂŁo dĂłi mas custa, Ă© uma dor de fora para dentro, como se as letras saĂssem da pele, do por dentro dos ossos. E a literatura. O que raios Ă© a literatura? Estou-me nas tintas para a literatura. NĂŁo quero escrever literatura, nĂŁo quero os intelectuais do meu lado.
Textos sobre Vista de Pedro Chagas Freitas
2 resultadosA Grande Vantagem da Vida
– A grande vantagem da vida Ă© ensinar-nos outra vez a chorar. A vida infantiliza. Fica-se maior no que nos faz ser mais pequenos. Cresce-se fora o que se vai perdendo por dentro. Passamos a infância a querer crescer, a adolescĂŞncia a querer crescer. E depois percebemos que sĂł quer crescer quem ainda se sente pequeno. Um adulto sente-se pequeno mas pensa ao contrário. Sente-se pequeno e quer ficar mais pequeno. Voltar ao tempo em que havia sonhos.
– Onde se perdem os sonhos?
– Todos os sonhos se perdem. Mesmo aqueles que vais ganhar, e vais ganhar muitos, se vão perder. Porque já deixaram de ser sonhos. Sonhaste aquilo, tiveste aquilo. E acabou. Lá se foi o sonho. O segredo é conseguir gerar novos sonhos. Sonhos que consigam ocupar o espaço em branco deixado pelo sonho perdido.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Queria ser como tu.
– E eu queria ser como tu. Queria olhar para a frente e ver que o caminho não acaba, o caminho a perder de vista.
– O teu não se perde de vista?
– O meu faz-me perder a vista.