Passagens de Machado de Assis

272 resultados
Frases, pensamentos e outras passagens de Machado de Assis para ler e compartilhar. Os melhores escritores estão em Poetris.

Mundo Interior

Ouço que a natureza é uma lauda eterna
De pompa, de fulgor, de movimento e lida,
Uma escala de luz, uma escala de vida
De sol à ínfima luzerna.

Ouço que a natureza, – a natureza externa, –
Tem o olhar que namora e o gesto que intimida,
Feiticeira que ceva uma hidra de Lerna
Entre as flores da bela Armida.

E contudo, se fecho os olhos, e mergulho
Dentro de mim, vejo à luz de outro sol, outro abismo
Em que um mundo mais vasto, armado de outro orgulho,

Rola a vida imortal e o eterno cataclismo,
E, como o outro, guarda em seu âmbito enorme,
Um segredo que atrai, que desafia, – e dorme.

A vida é uma enorme lotaria; os prémios são poucos, os malogrados inúmeros, e com os suspiros de uma geração é que se amassam as esperanças de outra.

Quando Ela Fala

Quando ela fala, parece
Que a voz da brisa se cala;
Talvez um anjo emudece
Quando ela fala.

Meu coração dolorido
As suas mágoas exala,
E volta ao gozo perdido
Quando ela fala.

Pudeste* eu eternamente,
Ao lado dela, escutá-la,
Ouvir sua alma inocente
Quando ela fala.

Minha alma, já semimorta,
Conseguira ao céu alçá-la
Porque o céu abre uma porta
Quando ela fala.

Não é mau este costume de escrever o que se pensa e o que se vê, e dizer isso mesmo quando não se vê nem pensa nada.

As Rosas

Rosas que desabrochais,
Como os primeiros amores,
Aos suaves resplendores
Matinais;

Em vão ostentais, em vão,
A vossa graça suprema;
De pouco vale; é o diadema
Da ilusão.

Em vão encheis de aroma o ar da tarde;
Em vão abris o seio úmido e fresco
Do sol nascente aos beijos amorosos;
Em vão ornais a fronte à meiga virgem;
Em vão, como penhor de puro afeto,
Como um elo das almas,
Passais do seio amante ao seio amante;
Lá bate a hora infausta
Em que é força morrer; as folhas lindas
Perdem o viço da manhã primeira,
As graças e o perfume.
Rosas que sois então? – Restos perdidos,
Folhas mortas que o tempo esquece, e espalha
Brisa do inverno ou mão indiferente.

Tal é o vosso destino,
Ó filhas da natureza;
Em que vos pese à beleza,
Pereceis;
Mas, não… Se a mão de um poeta
Vos cultiva agora, ó rosas,
Mais vivas, mais jubilosas,
Floresceis.

Lindóia

Vem, vem das águas, mísera Moema,
Senta-te aqui. As vozes lastimosas
Troca pelas cantigas deleitosas,
Ao pé da doce e pálida Coema.

Vós, sombras de Iguaçu e de Iracema,
Trazei nas mãos, trazei no colo as rosas
Que o amor desabrochou e fez viçosas
Nas laudas de um poema e outro poema.

Chegai, folgai, cantai. É esta, é esta
De Lindóia, que a voz suave e forte
Do vate celebrou, a alegre festa.

Além do amável, gracioso porte,
Vede o mimo, a ternura que lhe resta.
Tanto inda é bela no seu rosto a morte

Os Dois Horizontes

Dois horizontes fecham nossa vida:

Um horizonte, — a saudade
Do que não há de voltar;
Outro horizonte, — a esperança
Dos tempos que hão de chegar;
No presente, — sempre escuro,—
Vive a alma ambiciosa
Na ilusão voluptuosa
Do passado e do futuro.

Os doces brincos da infância
Sob as asas maternais,
O vôo das andorinhas,
A onda viva e os rosais;
O gozo do amor, sonhado
Num olhar profundo e ardente,
Tal é na hora presente
O horizonte do passado.

Ou ambição de grandeza
Que no espírito calou,
Desejo de amor sincero
Que o coração não gozou;
Ou um viver calmo e puro
À alma convalescente,
Tal é na hora presente
O horizonte do futuro.

No breve correr dos dias
Sob o azul do céu, — tais são
Limites no mar da vida:
Saudade ou aspiração;
Ao nosso espírito ardente,
Na avidez do bem sonhado,
Nunca o presente é passado,
Nunca o futuro é presente.

Que cismas, homem? – Perdido
No mar das recordações,

Continue lendo…

As mulheres são apenas mulheres, choram, arrufam-se ou resignam-se; as que têm alguma coisa mais do que a debilidade feminina, lutam ou recolhem-se à dignidade do silêncio.