Poemas sobre Desejos

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Poemas de desejos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Andáva a Lua nos Céus

Andáva a lua nos céus
Com o seu bando de estrellas.

Na minha alcova,
Ardiam vellas,
Em candelabros de bronze.

Pelo chão, em desalinho,
Os velludos pareciam
Ondas de sangue e ondas de vinho.

Elle olhava-me scismado;
E eu,
Placidamente, fumava,
Vendo a lua branca e núa
Que pelos céus caminhava.

Aproximou-se; e em delirio
Procurou ávidamente,
E ávidamente beijou
A minha boca de cravo
Que a beijar se recusou.

Arrastou-me para Elle,
E, encostado ao meu hombro,
Fallou-me d’um pagem loiro
Que morrêra de Saudade,
Á beira-mar, a cantar…

Olhei o céu!
Agora, a lua, fugia,
Entre nuvens que tornavam
A linda noite sombría.

Déram-se as bocas n’um beijo,
– Um beijo nervoso e lento…
O homem cede ao desejo
Como a nuvem cede ao vento.

Vinha longe a madrugada.

Por fim,
Largando esse corpo
Que adormecêra cansado
E que eu beijára loucamente
Sem sentir,
Bebia vinho, perdidamente,
Bebia vinho… até cahir.

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Xácara das Mulheres Amadas

Quem muitas mulheres tiver,
em vez de uma amada esposa,
mais se afirma e se repousa
pera amar sua mulher;
Quem isto não entender…
em cousas d’amor não ousa,
em cousas d’amor não quer!

Quantas mais, mais se descansa,
mais a gente serve a todas;
quantas mais forem as bodas,
quantos mais os pares da dança,
menos a dança nos cansa
O gosto d’andar nas rodas.

Que quantas mais, mais detido
a cada uma per si;
nem cansa tanto o que vi,
nem fica o gosto partido;
ao contrário, é acrescido
a cada uma per si!

No paladar de mudar
mais se sente o gosto agudo:
que amar nada ou amar tudo
é estar pronto a muito amar;
o enjoo vem de não estar
a par do nada e do tudo.

Mais facilmente se chega
pera muitas que pera uma;
e a razão é porque, em suma,
se esta razão me não cega,
quem quer que muitas adrega
é como tendo…nenhuma!

Com muitas, descanso vem,

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Este é o Papel Singular da Alegria

Este é o papel singular da alegria
a lei errante do país
é o maior dos silêncios.

Caminhei por entre rios pontos de água
estações de novembro
pequena razão dos ventos da manhã.

Não trafiquei não porque seja forte
mas porque falo da alegria do estar sobre vós
nestes pontos de água
na acidez da flor
neste país frequentado

algumas coisas nunca mudarão. O rigor
da luz torna invulnerável o desejo de perder
esta pressa de verão.

Algumas coisas serão sempre as mesmas: manhã
encosta o teu ouvido sobre a porta escuta
era a voz os cavaleiros roubados a Ucello
longínquos.

(Profanamos a casa não o corpo
esta forma desenhada ruga a ruga
esta cor amarela sobre a praia.)

Os Vencidos

Tres cavaleiros seguem lentamente
Por uma estrada erma e pedregosa.
Geme o vento na selva rumorosa,
Cae a noite do céo, pesadamente.

Vacilam-lhes nas mãos as armas rotas,
Têm os corceis poentos e abatidos,
Em desalinho trazem os vestidos,
Das feridas lhe cae o sangue, em gotas.

A derrota, traiçoeira e pavorosa,
As fontes lhes curvou, com mão potente.
No horisonte escuro do poente
Destaca-se uma mancha sanguinosa.

E o primeiro dos três, erguendo os braços,
Diz n’um soluço: «Amei e fui amado!
Levou-me uma visão, arrebatado,
Como em carro de luz, pelos espaços!

Com largo vôo, penetrei na esphera
Onde vivem as almas que se adoram,
Livre, contente e bom, como os que moram
Entre os astros, na eterna primavera.

Porque irrompe no azul do puro amor
O sopro do desejo pestilente?
Ai do que um dia recebeu de frente
O seu halito rude e queimador!

A flor rubra e olorosa da paixão
Abre languida ao raio matutino,
Mas seu profundo calix purpurino
Só reçuma veneno e podridão.

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É Inútil Querer Parar o Homem

É inútil querer parar o Homem,
o que transforma a pedra em piso,
o piso em casa e a casa em fonte
de novas músicas da carne
sob as velocidades da luz e da sombra.
É inútil querer parar o Homem
acolher sempre um pouco de si próprio
no mistério da vida a cavalgar
os cavalos aéreos da semântica
sob uma indeferida eternidade.
É inútil querer parar o Homem
e o impulso que o transforma sempre
na pátria sem fim do ato livre
que arranca a vida e o tempo e as coisas
do espelho imóvel dos conceitos.
Ah, que mistério maior é este
que liga a liberdade e o homem
e une o homem a outros homens
como o curso de um rio ao mar!
(quando a noite é una e indivisível,
nos olhos da mulher que eu amo
acende-se o deus deste segredo
-e uma sombra só nos transporta
ao fundo sem nome da vida.)

É inútil querer parar o Homem.
Do que morre fica o gesto alto
a ser o germe de outro gesto
que ainda nem vemos no tempo.

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Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.

Os Amantes de Pompeia

Eles conheceram-se neste abraço
em que levam tanto tempo,
embalados na cadência,

de uma canção desconhecida
e no mover das mãos que hesitam
entre o animal e a planta.
O tempo privou-os de vida
mas não um do outro, tangíveis
nos membros onde o desejo

lateja ainda,
gestos como medusas esvaindo-se
no sangue em que se fundiram para sempre.

Geraram esta outra placenta
com a urgência de quem sabe
que bebe em cada trago despedida:

lenta colheita da alma
que palidamente assoma
em cada poro,

subtil, alada, como pluma
que sem ser vista
se solta.
Neste abraço que os reteve até à sufocação,
depois que se abateram o céu e o horizonte,
o mundo foi-lhes langor

e memória acesa;
petrificados, mortos,
estão diante do nosso olhar,

na posição aflita em que os une,
mais que o esterno e a pelve,
o duplo receio da imortalidade.

Distância

Não vás para tão longe!
Vem sentar-te
Aqui na chaise-longue, ao pé de mim…
Tenho o desejo doido de contar-te
Estas saudades que não tinham fim.

Não vás para tão longe;
Quero ver
Se ainda sabes olhar-me como d’antes,
E se nas tuas mãos acariciantes,
Inda existe o perfume de que eu gosto.

Não vás para tão longe!
Tenho medo
Do silêncio pesado d’esta sala…
Como soluça o vento no arvoredo!
E a tua voz, amor, como se cala!

Não vás para tão longe!
Antigamente,
Era sempre demais o curto espaço
Que havia entre nós dois…
Agora, um embaraço,
Hesitas e depois,
Com um gesto de tédio e de cansaço,
Achas inconveniente
O meu abraço.

Não vás para tão longe!
Fica. Inda é tão cedo!
O vento continua a fustigar
Os ramos sofredores do arvoredo,
E eu ponho-me a pensar
E tenho medo!

Não vás para tão longe!
Na sombra impenetrada,
Como se agita e se debate o vento!…
Paira nas velhas ruínas do convento

Que além se avista,

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Intervalo

Quem te disse ao ouvido esse segredo
Que raras deusas têm escutado —
Aquele amor cheio de crença e medo
Que é verdadeiro só se é segredado?…
Quem te disse tão cedo?

Não fui eu, que te não ousei dizê-lo.
Não foi um outro, porque não sabia.
Mas quem roçou da testa teu cabelo
E te disse ao ouvido o que sentia?
Seria alguém, seria?

Ou foi só que o sonhaste e eu te o sonhei?
Foi só qualquer ciúme meu de ti
Que o supôs dito, porque o não direi,
Que o supôs feito, porque o só fingi
Em sonhos que nem sei?

Seja o que for, quem foi que levemente,
A teu ouvido vagamente atento,
Te falou desse amor em mim presente
Mas que não passa do meu pensamento
Que anseia e que não sente?

Foi um desejo que, sem corpo ou boca,
A teus ouvidos de eu sonhar-te disse
A frase eterna, imerecida e louca —
A que as deusas esperam da ledice
Com que o Olimpo se apouca.

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Piedade? Não!

Piedade? Não! Não a desejo.
Ela seria escárnio maior,
Cruel desdém feito gracejo
Com olhar sério para conter
A rude graça. Não! A dor
Eu chore em paz. Deixem doer!

Piedade? Não! Escárnio venha,
Mais indiferença e mais desdém:
Confortos desses meu lar os tenha.
Mudar em pena o seu olhar
Já dor de mais fora também.
Fingir bondade, não pode ser.
Que os males pareçam como eles são.
Querer mascará-los é escarnecer,
Rara malícia sem coração.

O que Poderá Ver quem já da Vista Cegou?

Ante Sintra, a mui prezada,
e serra de Ribatejo
que Arrábeda é chamada,
perto donde o rio Tejo
se mete n’água salgada,
houve um pastor e pastora,
que com tanto amor se amaram
como males lhe causaram
este bem, que nunca fora,
pois foi o que não cuidarom.

A ela chamavam Maria
e ao pastor Crisfal,
ao qual, de dia em dia,
o bem se tornou em mal,
que ele tão mal merecia.
Sendo de pouca idade,
não se ver tanto sentiam
que o dia que não se viam,
se via na saudade
o que ambos se queriam.

Algumas horas falavam,
andando o gado pascendo;
e então se apascentavam
os olhos, que, em se vendo,
mais famintos lhe ficavam.
E com quanto era Maria
pequena e, tinha cuidado
de guardar melhor o gado
o que lhe Crisfal dizia;
mas, em fim, foi mal guardado;

Que, depois de assim viver
nesta vida e neste amor,
depois de alcançado ter
maior bem pera mor dor,
em fim se houve de saber
por Joana,

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Anda vem…

Anda vem…, porque te negas,
Carne morena, toda perfume?
Porque te calas,
Porque esmoreces,
Boca vermelha – rosa de lume?

Se a luz do dia
Te cobre de pejo,
Esperemos a noite presos num beijo.

Dá-me o infinito gozo
De contigo adormecer
Devagarinho, sentindo
O aroma e o calor
Da tua carne, meu amor!

E ouve, mancebo alado:
Entrega-te, sê contente!
– Nem todo o prazer
Tem vileza ou tem pecado!

Anda, vem!… Dá-me o teu corpo
Em troca dos meus desejos…
Tenho saudades da vida!
Tenho sede dos teus beijos!

A Verdadeira Liberdade

A liberdade, sim, a liberdade!
A verdadeira liberdade!
Pensar sem desejos nem convicções.
Ser dono de si mesmo sem influência de romances!
Existir sem Freud nem aeroplanos,
Sem cabarets, nem na alma, sem velocidades, nem no cansaço!

A liberdade do vagar, do pensamento são, do amor às coisas naturais
A liberdade de amar a moral que é preciso dar à vida!
Como o luar quando as nuvens abrem
A grande liberdade cristã da minha infância que rezava
Estende de repente sobre a terra inteira o seu manto de prata para mim…
A liberdade, a lucidez, o raciocínio coerente,
A noção jurídica da alma dos outros como humana,
A alegria de ter estas coisas, e poder outra vez
Gozar os campos sem referência a coisa nenhuma
E beber água como se fosse todos os vinhos do mundo!

Passos todos passinhos de criança…
Sorriso da velha bondosa…
Apertar da mão do amigo [sério?]…
Que vida que tem sido a minha!
Quanto tempo de espera no apeadeiro!
Quanto viver pintado em impresso da vida!

Ah, tenho uma sede sã.

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Aniversário

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a.olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui…
A que distância!…
(Nem o acho… )
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,

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Não!

Tenho-te muito amor,
E amas-me muito, creio:
Mas ouve-me, receio
Tomar-te desgraçada:
O homem, minha amada,
Não perde nada, goza;
Mas a mulher é rosa…
Sim, a mulher é flor!

Ora e a flor, vê tu
No que ela se resume…
Faltando-lhe o perfume,
Que é a essência dela,
A mais viçosa e bela
Vê-a a gente e… basta.
Sê sempre, sempre, casta!
Terás quanto possuo!

Terás, enquanto a mim
Me alumiar teu rosto,
Uma alma toda gosto,
Enlevo, riso, encanto!
Depois terás meu pranto
Nas praias solitárias…
Ondas tumultuárias
De lágrimas sem fim!

À noite, que o pesar
Me arrebatar de cada,
Irei na campa rasa
Que resguardar teus ossos,
Ah! recordando os nossos
Tão venturosos dias,
Fazer-te as cinzas frias
Ainda palpitar!

Mil beijos, doce bem,
Darei no pó sagrado,
Em que se houver tornado
Teu corpo tão galante!
Com pena, minha amante,
De não ter a morte
Caído a mim em sorte…
Caído em mim também!

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Olinda

(Do alto do mosteiro, um frade a vê)

De limpeza e claridade
é a paisagem defronte.
Tão limpa que se dissolve
a linha do horizonte.

As paisagens muito claras
não são paisagens, são lentes.
São íris, sol, aguaverde
ou claridade somente.

Olinda é só para os olhos,
não se apalpa, é só desejo.
Ninguém diz: é lá que eu moro.
Diz somente: é lá que eu vejo.

Tem verdágua e não se sabe,
a não ser quando se sai.
Não porque antes se visse,
mas porque não se vê mais.

As claras paisagens dormem
no olhar, quando em existência.
Diluídas, evaporadas,
só se reúnem na ausência.

Limpeza tal só imagino
que possa haver nas vivendas
das aves, nas áreas altas,
muito além do além das lendas.

Os acidentes, na luz,
não são, existem por ela.
Não há nem pontos ao menos,
nem há mar, nem céu, nem velas.

Quando a luz é muito intensa
é quando mais frágil é:
planície, que de tão plana
parecesse em pé:

Evolução

Arde o corpo do sol, brotam feixes de luz:
O que é a luz?
Sol que morreu.

Dardeja a luz, dardeja e pulveriza a fraga:
Vai nesse pó, que há-de ser terra,
A luz extinta.

Gerou a terra a seara verde:
Hastes e folhas da seara verde
Comeram terra.

A seara é grada, o trigo é loiro:
Deu trigo loiro,
Morrendo ela.

O trigo é pão, é carne e é sangue:
Sangue vermelho, carne vermelha,
Trigo defunto.

Em carne e em sangue, eis o desejo:
Vive o desejo,
De carne morta.

Arde o desejo, eis o pecado:
Que são pecados?
Desejos mortos.

Queima o pecado o pecador:
Nasceu a dor; findou na dor
Pecado e morte.

A alma branca, iluminada,
Transfigurada pela dor,
Essa não vai à sepultura
Porque é já Deus na criatura,
Porque é o Espírito, é o Amor.

Na vida vã da terra sepulcral
Só o amor é infinito e só ele é imortal.

Morreu a luz,

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O que se Prende no Tempo

O que se prende no tempo
é do tempo a árvore crua um ídolo sem desejos
e os órfãos feitos de um osso apenas

Entre duas crianças amestradas entre duas
moléculas frondosas
de quem tirei os segredos

Cada Segundo

Não desejo a indigência,
a serenidade
dos lugares desertados:
desejo que cada segundo
quando amo
explodisse
e fosse a terra
em sua expansão
durante a primeira noite,
a gestante,
do mundo.

Contemplo o Lago Mudo

Contemplo o lago mudo
Que uma brisa estremece.
Não sei se penso em tudo
Ou se tudo me esquece.

O lago nada me diz,
Não sinto a brisa mexê-lo
Não sei se sou feliz
Nem se desejo sê-lo.

Trêmulos vincos risonhos
Na água adormecida.
Por que fiz eu dos sonhos
A minha única vida?