Poemas Interrogativos

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Poemas interrogativos sobre diversos assuntos para ler e compartilhar. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Como, Morte, Temer-te?

Como, morte, temer-te?
Não estás aqui comigo, a trabalhar?
Não te toco em meus olhos; não me dizes
que não sabes de nada, que és vazia,
inconsciente e pacífica? Não gozas,
comigo, tudo: glória, solidão,
amor, até tuas entranhas?
Não me estás a sustentar,
morte, de pé, a vida?
Não te levo e trago, cego,
como teu guia? Não repetes
com tua boca passiva
o que quero que digas? Não suportas,
escrava, a gentileza com que te obrigo?

Tradução de José Bento

O Solitário

Detesto seguir alguém assim como detesto conduzir.
Obedecer? Não! E governar, nunca!
Quem não se mete medo não consegue metê-lo a
ninguém,
E só aquele que o inspira pode comandar.
Já detesto guiar-me a mim próprio!
Gosto, como os animais das florestas e dos mares,
De me perder durante um grande pedaço,
Acocorar-me a sonhar num deserto encantador,
E forçar-me a regressar de longe aos meus penates,
Atrair-me a mim próprio… para mim.

Que Diremos Ainda?

Vê como de súbito o céu se fecha
sobre dunas e barcos,
e cada um de nós se volta e fixa
os olhos um no outro,
e como deles devagar escorre
a última luz sobre as areias.

Que diremos ainda? Serão palavras,
isto que aflora aos lábios?
Palavras?, este rumor tão leve
que ouvimos o dia desprender-se?
Palavras, ou luz ainda?

Palavras, não. Quem as sabia?
Foi apenas lembrança doutra luz.
Nem luz seria, apenas outro olhar.

Recordam-se Vocês do Bom Tempo d’Outrora

(Dedicatória de introdução a «A Musa em Férias»)

Recordam-se vocês do bom tempo d’outrora,
Dum tempo que passou e que não volta mais,
Quando íamos a rir pela existência fora
Alegres como em Junho os bandos dos pardais?
C’roava-nos a fronte um diadema d’aurora,
E o nosso coração vestido de esplendor
Era um divino Abril radiante, onde as abelhas
Vinham sugar o mel na balsâmina em flor.
Que doiradas canções nossas bocas vermelhas
Não lançaram então perdidas pelo ar!…
Mil quimeras de glória e mil sonhos dispersos,
Canções feitas sem versos,
E que nós nunca mais havemos de cantar!
Nunca mais! nunca mais! Os sonhos e as esp’ranças
São áureos colibris das regiões da alvorada,
Que buscam para ninho os peitos das crianças.
E quando a neve cai já sobre a nossa estrada,
E quando o Inverno chega à nossa alma,então
Os pobres colibris, coitados, sentem frio,
E deixam-nos a nós o coração vazio,
Para fazer o ninho em outro coração.
Meus amigos, a vida é um Sol que chega ao cúmulo
Quando cantam em nós essas canções celestes;

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O Que Eu Sou

Nocturna e dubia luz
Meu sêr esboça e tudo quanto existe…
Sou, num alto de monte, negra cruz,
Onde bate o luar em noite triste…

Sou o espirito triste que murmura
Neste silencio lúgubre das Cousas…
Eu é que sou o Espectro, a Sombra escura
De falecidas formas mentirosas.

E tu, Sombra infantil do meu Amôr,
És o Sêr vivo, o Sêr Espiritual,
A Presença radiosa…
Eu sou a Dôr,
Sou a tragica Ausencia glacial…

Pois tu vives, em mim, a vida nova,
E eu já não vivo em ti…
Mas quem morreu?
Fôste tu que baixaste á fria cova?
Oh, não! Fui eu! Fui eu!

Horrivel cataclismo e negra sorte!
Tu fôste um mundo ideal que se desfez
E onde sonhei viver apoz a morte!
Vendo teus lindos olhos, quanta vez,
Dizia para mim: eis o logar
Da minha espiritual, futura imagem…
E viverei á luz daquele olhar,
Divino sol de mistica Paisagem.

Era minha ambição primordial
Legar-lhe a minha imagem de saudade;
Mas um vento cruel de temporal,

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A miséria do meu ser

A miséria do meu ser,
Do ser que tenho a viver,
Tornou-se uma coisa vista.
Sou nesta vida um qualquer
Que roda fora da pista.

Ninguém conhece quem sou
Nem eu mesmo me conheço
E, se me conheço, esqueço,
Porque não vivo onde estou.
Rodo, e o meu rodar apresso.

É uma carreira invisível,
Salvo onde caio e sou visto,
Porque cair é sensível
Pelo ruído imprevisto…
Sou assim. Mas isto é crível?

Jornal, longe

Que faremos destes jornais, com telegramas, notícias,
anúncios, fotografias, opiniões…?

Caem as folhas secas sobre os longos relatos de guerra:
e o sol empalidece suas letras infinitas.

Que faremos destes jornais, longe do mundo e dos homens?
Este recado de loucura perde o sentido entre a terra e o céu.

De dia, lemos na flor que nasce e na abelha que voa;
de noite, nas grandes estrelas, e no aroma do campo serenado.

Aqui, toda a vizinhança proclama convicta:
“Os jornais servem para fazer embrulhos”.

E é uma das raras vezes em que todos estão de acordo.

O Amor é o Amor

O amor é o amor — e depois?!
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?…

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor
e trocamos — somos um? somos dois?
espírito e calor!

O amor é o amor — e depois?

Essas Coisas

«Você não está mais na idade
de sofrer por essas coisas.»

Há então a idade de sofrer
e a de não sofrer mais
por essas, essas coisas?

As coisas só deviam acontecer
para fazer sofrer
na idade própria de sofrer?

Ou não se devia sofrer
pelas coisas que causam sofrimento
pois vieram fora de hora, e a hora é calma?

E se não estou mais na idade de sofrer
é porque estou morto, e morto
é a idade de não sentir as coisas, essas coisas?

Abismo

Olho o Tejo, e de tal arte
Que me esquece olhar olhando,
E súbito isto me bate
De encontro ao devaneando —
O que é sério, e correr?
O que é está-lo eu a ver?

Sinto de repente pouco,
Vácuo, o momento, o lugar.
Tudo de repente é oco —
Mesmo o meu estar a pensar.
Tudo — eu e o mundo em redor —
Fica mais que exterior.

Perde tudo o ser, ficar,
E do pensar se me some.
Fico sem poder ligar
Ser, idéia, alma de nome
A mim, à terra e aos céus…

E súbito encontro Deus.

Acho tão Natural que não se Pense

Acho tão natural que não se pense
Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa
Que tem que ver com haver gente que pensa …
Que pensará o meu muro da minha sombra?
Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me cousas. . .
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente. . .
Que pensará isto de aquilo?
Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem?
Se ela a tiver, que a tenha…
Que me importa isso a mim?
Se eu pensasse nessas cousas,
Deixaria de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos …
Entristecia e ficava às escuras.
E assim, sem pensar tenho a Terra e o Céu.

Hino à Alegria

Tenho-a visto passar, cantando, à minha porta,
E às vezes, bruscamente, invadir o meu lar,
Sentar-se à minha mesa, e a sorrir, meia morta,
Deitar-se no meu leito e o meu sono embalar.

Tumultuosa, nos seus caprichos desenvoltos,
Quase meiga, apesar do seu riso constante,
De olhos a arder, lábios em flor, cabelos soltos,
A um tempo é cortesã, deusa ingénua ou bacante…

Quando ela passa, a luz dos seus olhos deslumbra;
Tem como o Sol de Inverno um brilho encantador;
Mas o brilho é fugaz, — cintila na penumbra,
Sem que dele irradie um facho criador.

Quando menos se espera, irrompe de improviso;
Mas foge-nos também com uma presteza igual;
E dela apenas fica um pálido sorriso
Traduzindo o desdém duma ilusão banal.

Onda mansa que só à superfície corre,
Toda a alegria é vã; só a Dor é fecunda!
A Dor é a Inspiração, louro que nunca morre,
Se em nós crava a raiz exaustiva e profunda!

No entanto, eu te saúdo e louvo, hora dourada,
Em que a Alegria vem extinguir,

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I Was Made To Love Magic

A manhã com as suas proibições
na tua fala. A claridade estava a crescer
numa cama que já se tinha atravessado no escuro
como uma nave enfileirando para a guerra.

Eu não tinha ficado para conhecer a vista
das tuas janelas: imaginava um pátio riscado por ervas
mas não cheguei a levantar as persianas.
Talvez fosse um sítio ao qual não se pudesse regressar
porque quando falávamos os nossos olhos
não coincidiam com nenhuma palavra.

Teria gostado de te levar comigo outra vez
mas era difícil recuperar as razões
para o desejo. E no caso de nos ter acontecido
uma mudança, onde é que havíamos de procurar
os seus indícios? Estavas a dar de comer aos peixes
e eu só falava em livros.

Do Inquieto Oceano da Multidão

Do inquieto oceano da multidão
veio a mim uma gota gentilmente
suspirando:

— Eu te amo, há longo tempo
fiz uma extensa caminhada apenas
para te olhar, tocar-te,
pois não podia morrer
sem te olhar uma vez antes,
com o meu temor de perder-te depois.

— Agora nos encontramos e olhamos,
estamos salvos,
retorna em paz ao oceano, meu amor,
também sou parte do oceano, meu amor,
não estamos assim tão separados,
olha a imensa curvatura,
a coesão de tudo tão perfeito!
Quanto a mim e a ti,
separa-nos o mar irresistível
levando-nos algum tempo afastados,
embora não possa afastar-nos sempre:
não fiques impaciente — um breve espaço
e fica certa de que eu saúdo o ar,
a terra e o oceano,
todos os dias ao pôr-do-sol
por tua amada causa, meu amor.

Ó HÍMEN! Ó HIMENEU!

O hímen! O himeneu!
Por que, me atormentas assim?
Por que, me provocas só
durante um breve momento?
Por que é que não continuas?
Por que, perdes logo a força?

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Dizem os Sábios

Dizem os sábios que já nada ignoram
Que alma, é um mito!…
Eles que há muito, em vão, dos céus exploram
O almo infinito…
Eles, que nunca achavam no ente humano
Mais que esta face
De ser finito, orgânico, o gusano
Que morre e nasce,
Fundam-se na razão.
E a razão erra!…

Quem da lagarta a rastejar na terra
Pode supor,
Sonhar sequer, que um dia há-de nascer
A borboleta, aquela alada flor
Matiz dos céus?
Sábios, achai em vão o pode ser
Saber… só Deus.

O homem rasteja, semelhante ao verme
Por que não há-de a paz da sepultura
– Quanto labor sob a aparente calma!
Servir d’abrigo àquele ser inerme,
De que há-de um dia após tarefa oscura
Surgir vivaz, alada e flor, a Alma.

Às Vezes Tenho Idéias Felizes

Às vezes tenho idéias felizes,
Idéias subitamente felizes, em idéias
E nas palavras em que naturalmente se despegam…

Depois de escrever, leio…
Por que escrevi isto?
Onde fui buscar isto?
De onde me veio isto? Isto é melhor do que eu…
Seremos nós neste mundo apenas canetas com tinta
Com que alguém escreve a valer o que nós aqui traçamos?…

Desânimo

Que mimos me confortam?
Que doce luz me acena?
Eu tenho muita pena
De ter nascido até!

Quizera antes ao pé
D’uma arvore frondosa
Ter já em cima a lousa
E descançar emfim!

Alli, nem tu de mim
De certo te lembravas,
Nem estas feras bravas
Me iriam assaltar!

Alli, teria um ar
Mais puro e respiravel,
E a paz imperturbavel
De quem, emfim, morreu!

D’alli, veria o céo
Ora sereno e puro,
Ora toldado e escuro…
Ainda assim melhor,

Que este areal de amor
Onde ando ao desamparo,
Onde a ninguem sou caro
E nem, a mim, ninguem!

Alli passára eu bem
A noite derradeira
Á sombra hospitaleira
Que mais ninguem me dá!

Tu mesma, que não ha
Quem eu mais queira e ame,
Quem a minha alma inflamme
De mais ardente amor,

Os ais da minha dôr
A ti o que te importam?
Teus olhos nem supportam
A minha vista ao pé!

Que mimos me confortam?

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A Luz que Vem das Pedras

A luz que vem das pedras, do íntimo da pedra,
tu a colhes, mulher, a distribuis
tão generosa e à janela do mundo.
O sal do mar percorre a tua língua;
não são de mais em ti as coisas mais.
Melhor que tudo, o voo dos insectos,
o ritmo nocturno do girar dos bichos,
a chave do momento em que começa o canto
da ave ou da cigarra
— a mão que tal comanda no mesmo gesto fere
a corda do que em ti faz acordar
os olhos densos de cada dia um só.
Quem está salvando nesta respiração
boca a boca real com o universo?

A Taça

Uma taça cheia, bem lavrada,
Segurava e apertava nas mãos ambas,
Ávido sorvia do seu bordo doce vinho
Para, a um tempo, afogar mágoa e cuidado.

Entrou o Amor e achou-me sentado,
E sorriu discreto e sábio,
Como que lamentando o insensato:

«Amigo, eu conheço um vaso inda mais belo,
Digno de nele mergulhar a alma toda;
Que prometes, se eu to conceder
E to encher de outro néctar?»

E com que amizade ele cumpriu a palavra!
Pois ele, Lida, com suave vénia
Te concedeu a mim, há tanto desejoso.

Quando estreito o teu amado corpo
E provo dos teus lábios fidelíssimos
O bálsamo de amor longo tempo guardado,
Feliz digo eu então ao meu espírito:

Não, um vaso tal, a não ser o Amor,
Nenhum deus o formou ou possuiu!
Formas assim não as forja Vulcano
Cos martelos finos e sensíveis!
Pode Lieu em frondosos outeiros
P’los seus faunos mais velhos e sagazes
Fazer pisar as uvas escolhidas
E ele mesmo presidir ao fermentar secreto:
Bebida assim não há desvelo que lha dê!

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Perfume da Rosa

Quem bebe, rosa, o perfume
Que de teu seio respira?
Um anjo, um silfo? ou que nume
Com esse aroma delira?

Qual é o deus que, namorado,
De seu trono te ajoelha,
E esse néctar encantado
Bebe oculto, humilde abelha?

– Ninguém? – Mentiste: essa frente
Em languidez inclinada,
Quem ta pôs assim pendente?
Dize, rosa namorada.

E a cor de púrpura viva
Como assim te desmaiou?
e essa palidez lasciva
Nas folhas quem ta pintou?

Os espinhos que tão duros
Tinhas na rama lustrosa,
Com que magos esconjuros
Tos desarmam, ó rosa?

E porquê, na hástea sentida
Tremes tanto ao pôr do sol?
Porque escutas tão rendida
O canto do rouxinol?

Que eu não ouvi um suspiro
Sussurrar-te na folhagem?
Nas águas desse retiro
Não espreitei a tua imagem?

Não a vi aflita, ansiada…
– Era de prazer ou dor? –
Mentiste, rosa, és amada,
E também tu amas, flor.

Mas ai! se não for um nume
O que em teu seio delira,

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