Poemas sobre Mudos de Machado de Assis

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Poemas de mudos de Machado de Assis. Leia este e outros poemas de Machado de Assis em Poetris.

Noivado

VĂȘs, querida, o horizonte ardendo em chamas?
Além desses outeiros
Vai descambando o sol, e Ă  terra envia
Os raios derradeiros;
A tarde, como noiva que enrubesce,
Traz no rosto um véu mole e transparente;
No fundo azul a estrela do poente
JĂĄ tĂ­mida aparece.

Como um bafo suavĂ­ssimo da noite,
Vem sussurrando o vento
As ĂĄrvores agita e imprime Ă s folhas
O beijo sonolento.
A flor ajeita o cĂĄlix: cedo espera
O orvalho, e entanto exala o doce aroma;
Do leito do oriente a noite assoma
Como uma sombra austera.

Vem tu, agora, Ăł filha de meus sonhos,
Vem, minha flor querida;
Vem contemplar o céu, pågina santa
Que amor a ler convida;
Da tua solidĂŁo rompe as cadeias;
Desce do teu sombrio e mudo asilo;
EncontrarĂĄs aqui o amor tranqĂŒilo…
Que esperas? que receias?

Olha o templo de Deus, pomposo e grande;
LĂĄ do horizonte oposto
A lua, como lĂąmpada, jĂĄ surge
A alumiar teu rosto;
Os cĂ­rios vĂŁo arder no altar sagrado,
Estrelinhas do céu que um anjo acende;

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A Elvira

(Lamartine)

Quando, contigo a sĂłs, as mĂŁos unidas,
Tu, pensativa e muda; e eu, namorado,
Às volĂșpias do amor a alma entregando,
Deixo correr as horas fugidias;
Ou quando ‘as solidĂ”es de umbrosa selva
Comigo te arrebato; ou quando escuto
—Tão só eu, — teus terníssimos suspiros;
E de meus lĂĄbios solto
Eternas juras de constĂąncia eterna;
Ou quando, enfim, tua adorada fronte
Nos meus joelhos trĂȘmulos descansa,
E eu suspendo meus olhos em teus olhos,
Como Ă s folhas da rosa ĂĄvida abelha;
Ai, quanta vez entĂŁo dentro em meu peito
Vago terror penetra, como um raio!
Empalideço, tremo;
E no seio da glĂłria em que me exalto,
LĂĄgrimas verto que a minha alma assombram!
Tu, carinhosa e trĂȘmula,
Nos teus braços me cinges, — e assustada,
Interrogando em vĂŁo, comigo choras!
“Que dor secreta o coração te oprime?”
Dizes tu, “Vem, confia os teus pesares…
Fala! eu abrandarei as penas tuas!
Fala! Eu consolarei tua alma aflita.”

Vida do meu viver, nĂŁo me interrogues!
Quando enlaçado nos teus níveos braços*
A confissão de amor te ouço,

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Stella

JĂĄ raro e mais escasso
A noite arrasta o manto,
E verte o Ășltimo pranto
Por todo o vasto espaço.

TĂ­bio clarĂŁo jĂĄ cora
A tela do horizonte,
E jĂĄ de sobre o monte
Vem debruçar-se a aurora.

À muda e torva irmã,
Dormida de cansaço,
Lå vem tomar o espaço
A virgem da manhĂŁ.

Uma por uma, vĂŁo
As pĂĄlidas estrelas,
E vĂŁo, e vĂŁo com elas
Teus sonhos, coração.

Mas tu, que o devaneio
Inspiras do poeta,
NĂŁo vĂȘs que a vaga inquieta
Abre-te o Ășmido seio?

Vai. Radioso e ardente,
Em breve o astro do dia,
Rompendo a névoa fria,
VirĂĄ do roxo oriente.

Dos Ă­ntimos sonhares
Que a noite protegera,
De tanto que eu vertera
Em lĂĄgrimas a pares,

Do amor silencioso,
MĂ­stico, doce, puro,
Dos sonhos de futuro,
Da paz, do etéreo gozo,

De tudo nos desperta
Luz de importuno dia;
Do amor que tanto a enchia
Minha alma estĂĄ deserta.

A virgem da manhĂŁ
JĂĄ todo o cĂ©u domina…

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RuĂ­nas

Cobrem plantas sem flor crestados muros;
Range a porta anciĂŁ; o chĂŁo de pedra
Gemer parece aos pés do inquieto vate.
RuĂ­na Ă© tudo: a casa, a escada, o horto,
SĂ­tios caros da infĂąncia.
Austera moça
Junto ao velho portĂŁo o vate aguarda;
Pendem-lhe as tranças soltas
Por sobre as roxas vestes.
Risos nĂŁo tem, e em seu magoado gesto
Transluz nĂŁo sei que dor oculta aos olhos;
— Dor que à face não vem, — medrosa e casta,
Íntima e funda; — e dos cerrados cílios
Se uma discreta muda
LĂĄgrima cai, nĂŁo murcha a flor do rosto;
Melancolia tĂĄcita e serena,
Que os ecos nĂŁo acorda em seus queixumes,
Respira aquele rosto. A mĂŁo lhe estende
O abatido poeta. Ei-los percorrem
Com tardo passo os relembrados sĂ­tios,
Ermos depois que a mĂŁo da fria morte
Tantas almas colhera. Desmaiavam,
Nos serros do poente,
As rosas do crepĂșsculo.
“Quem Ă©s? pergunta o vate; o sol que foge
No teu lĂąnguido olhar um raio deixa;
— Raio quebrado e frio; — o vento agita
Tímido e frouxo as tuas longas tranças.

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Musa Consolatrix

Que a mĂŁo do tempo e o hĂĄlito dos homens
Murchem a flor das ilusÔes da vida,
Musa consoladora,
É no teu seio amigo e sossegado
Que o poeta respira o suave sono.

NĂŁo hĂĄ, nĂŁo hĂĄ contigo,
Nem dor aguda, nem sombrios ermos;
Da tua voz os namorados cantos
Enchem, povoam tudo
De Ă­ntima paz, de vida e de conforto.

Ante esta voz que as dores adormece,
E muda o agudo espinho em flor cheirosa,
Que vales tu, desilusĂŁo dos homens?
Tu que podes, Ăł tempo?
A alma triste do poeta sobrenada
À enchente das angĂșstias;
E, afrontando o rugido da tormenta,
Passa cantando, alcĂ­one divina.

Musa consoladora,
Quando da minha fronte de mancebo
A Ășltima ilusĂŁo cair, bem como
Folha amarela e seca
Que ao chão atira a viração do outono,
Ah! no teu seio amigo
Acolhe-me, — e terá minha alma aflita,
Em vez de algumas ilusÔes que teve,
A paz, o Ășltimo bem, Ășltimo e puro!

LĂșcia

(Alfred de Musset)

NĂłs estĂĄvamos sĂłs; era de noite;
Ela curvara a fronte, e a mĂŁo formosa,
Na embriaguez da cisma,
TĂȘnue deixava errar sobre o teclado;
Era um murmĂșrio; parecia a nota
De aura longĂ­nqua a resvalar nas balsas
E temendo acordar a ave no bosque;
Em torno respiravam as boninas
Das noites belas as volĂșpias mornas;
Do parque os castanheiros e os carvalhos
Brando embalavam orvalhados ramos;
OuvĂ­amos a noite, entre-fechada,
A rasgada janela
Deixava entrar da primavera os bĂĄlsamos;
A vĂĄrzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sĂłs estĂĄvamos
E tĂ­nhamos quinze anos!

LĂșcia era loura e pĂĄlida;
Nunca o mais puro azul de um céu profundo
Em olhos mais suaves refletiu-se.
Eu me perdia na beleza dela,
E aquele amor com que eu a amava – e tanto ! –
Era assim de um irmĂŁo o afeto casto,
Tanto pudor nessa criatura havia!

Nem um som despertava em nossos lĂĄbios;
Ela deixou as suas mĂŁos nas minhas;
TĂ­bia sombra dormia-lhe na fronte,

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