Sonetos sobre Ansiedade

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Sonetos de ansiedade escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

VolĂșpia

No divino impudor da mocidade,
Nesse ĂȘxtase pagĂŁo que vence a sorte,
Num frĂȘmito vibrante de ansiedade,
Dou-te o meu corpo prometido Ă  morte!

A sombra entre a mentira e a verdade…
A nuvem que arrastou o vento norte…
– Meu corpo! Trago nele um vinho forte:
Meus beijos de volĂșpia e de maldade!

Trago dĂĄlias vermelhas no regaço…
São os dedos do sol quando te abraço,
Cravados no teu peito como lanças!

E do meu corpo os leves arabescos
VĂŁo-te envolvendo em cĂ­rculos dantescos
Felinamente, em voluptuosas danças…

Ansiedade

Esta ansiedade que nos enche o peito
Enche o céu, enche o mar, fecunda a terra.
Ela os germens purĂ­ssimos encerra
Do Sentimento lĂ­mpido, perfeito.

Em jorros cristalinos o direito,
A paz vencendo as convulsÔes da guerra,
A liberdade que abre as asas e erra
Pelos caminhos do Infinito eleito.

Tudo na mesma ansiedade gira,
Rola no Espaço, dentre a luz suspira
E chora, chora, amargamente chora…

Tudo nos turbilhÔes da Imensidade
Se confunde na trĂĄgica ansiedade
Que almas, estrelas, amplidÔes devora.

Este Livro

Este livro é de mågoas.Desgraçados os
Que no mundo passais, chorai ao lĂȘ-lo!
Somente a vossa dor de Torturados
Pode, talvez, senti-lo…e compreendĂȘ-lo.

Este livro é para vós. Abençoados
Os que o sentirem, sem ser bom nem belo!
BĂ­blia de tristes…Ó Desventurados,
Que a vossa imensa dor se acalme ao vĂȘ-lo!

Livro de MĂĄgoas…Dores…Ansiedades!
Livro de Sombras…NĂ©voas e Saudades!
Vai pelo mundo…(Trouxe-o no meu seio…)

IrmĂŁos na Dor, os olhos rasos de ĂĄgua,
Chorai comigo a minha imensa mĂĄgoa,
Lendo o meu livro sĂł de mĂĄgoas cheio!…

Ser

Cansada expectativa tĂŁo ansiosa
que ser sĂł eu na minha vida espalha!
Na longa noite em que se tece a malha
do que nĂŁo serei nunca, fervorosa

minha presença rĂștila e curiosa
arde sombria como um arder de palha,
curiosa apenas de saber se goza
o voar das cinzas quando o vento calha

lĂĄ onde o levantĂĄ-las Ă© verdade.
Inutilmente se mistura tudo,
que a mesma ansiedade, jĂĄ esquecida,

de novo recomeça. Mas quem hå-de
contrariĂĄ-la? Eu nĂŁo, que nĂŁo me iludo:
Viver Ă© isto, quando se Ă© sĂł vida.

Resposta

Alma: nĂŁo tiveste um lugar. Assim,
te foste ao reino prometido, e dobras-te
agora em quanta solidĂŁo venceste,
impelida num mundo de retorno.

Nem a razĂŁo expectante permitiu
o maior pensamento de certezas!
Alma: da terra ao céu o traço fino
da tua directriz — mais nĂŁo ficou…

Eis a vida — pó cruel, ansiedade
que deu a forma à tua acção perfeita
em sombras de tristeza e dia a dia.

Desvendado segredo! A dor que seja
o fogo, tua lembrança encontrou
nesse vazio a Ășnica palavra…

Fogo-FĂĄtuo

Cabelos brancos! dai-me, enfim, a calma
A esta tortura de homem e de artista:
Desdém pelo que encerra a minha palma,
E ambição pelo mais que não exista;

Esta febre, que o espĂ­rito me encalma
E logo me enregela; esta conquista
De idéias, ao nascer, morrendo na alma,
De mundos, ao raiar, murchando Ă  vista:

Esta melancolia sem remédio,
Saudade sem razão, louca esperança
Ardendo em choros e findando em tédio;

Esta ansiedade absurda, esta corrida
Para fugir o que o meu sonho alcança,
Para querer o que nĂŁo hĂĄ na vida!

AusĂȘncia

Meu amor, como eu sofro este tormento
da tua ausĂȘncia!… Ando magoada
como a folha arrancada pelo vento
ao carinhoso anseio da ramada…

Procuro desviar o pensamento…
mas oiço ao longe a tua voz molhada
em lĂĄgrimas, vibrando o sofrimento
da nossa vida assim, tĂŁo separada!

Os meus beijos escutam os teus beijos
exigentes — perdidos de saudade…
crispando amargamente os meus desejos!

E dia a dia essa canção de dor,
ritornelo sombrio de ansiedade,
exalta ainda mais o meu amor!

Escrava

Ó meu Deus, ó meu dono, ó meu senhor,
Eu te saĂșdo, olhar do meu olhar,
Fala da minha boca a palpitar,
Gesto das minhas mĂŁos tontas de amor!

Que te seja propĂ­cio o astro e a flor,
Que a teus pés se incline a Terra e o Mar,
Plos séculos dos séculos sem par,
Ó meu Deus, ó meu dono, ó meu senhor!

Eu, doce e humilde escrava, te saĂșdo,
E, de mĂŁos postas, em sentida prece,
Canto teus olhos de oiro e de veludo.

Ah! esse verso imenso de ansiedade,
Esse verso de amor que te fizesse
Ser eterno por toda a eternidade!…

RĂșstica

Ser a moça mais linda do povoado.
Pisar, sempre contente, o mesmo trilho,
Ver descer sobre o ninho aconchegado
A bĂȘnção do Senhor em cada filho.

Um vestido de chita bem lavado,
Cheirando a alfazema e a tomilho…
– Com o luar matar a sede ao gado,
Dar Ă s pombas o sol num grĂŁo de milho…

Ser pura como a ĂĄgua da cisterna,
Ter confiança numa vida eterna
Quando descer Ă  “terra da verdade”…

Deus, dai-me esta calma, esta pobreza!
Dou por elas meu trono de Princesa,
E todos os meus Reinos de Ansiedade.