Sonetos sobre ArdĂȘncia

4 resultados
Sonetos de ardĂȘncia escritos por poetas consagrados, filĂłsofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Morcego

Meia noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vĂȘde:
Na bruta ardĂȘncia orgĂąnica da sede,
Morde-me a goela Ă­gneo e escaldante molho.

“Vou mandar levantar outra parede…”
– Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o tecto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocĂĄ-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tĂŁo feio parto?!

A ConsciĂȘncia Humana Ă© este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!

Sonho Vago

Um sonho alado que nasceu um instante,
Erguido ao alto em horas de demĂȘncia…
Gotas de ĂĄgua que tombam em cadĂȘncia
Na minh’alma tristĂ­ssima, distante…

Onde estĂĄ ele, o Desejado? O Infante?
O que hĂĄ-de vir e amar-me em doida ardĂȘncia?
O das horas de mĂĄgoa e penitĂȘncia?
O PrĂ­ncipe Encantado? O Eleito? O Amante?

E neste sonho eu jĂĄ nem sei quem sou…
O brando marulhar dum longo beijo
Que nĂŁo chegou a dar-se e que passou…

Um fogo-fĂĄtuo rĂștilo, talvez…
E eu ando a procurar-te e jĂĄ te vejo!
E tu jĂĄ me encontraste e nĂŁo me vĂȘs!…

Conchita

Adeus aos filtros da mulher bonita;
A esse rosto espanhol, pulcro e moreno;
Ao pĂ© que no bolero… ao pĂ© pequeno;
PĂ© que, alĂ­gero e cĂ©lere, saltita…

Lira do amor, que o amor nĂŁo mais excita,
A um silĂȘncio de morte eu te condeno;
Despede-te; e um adeus, no Ășltimo treno,
Soluça às graças da gentil Conchita:

A esses, que em ondas se levantam, seios
Do mais cheiroso jambo; a esses quebrados
Olhos meridionais de ardĂȘncia cheios;

A esses lĂĄbios, enfim, de nĂĄcar vivo,
Virgens dos lĂĄbios de outrem, mas corados
Pelos beijos de um sol quente e lascivo.

Trevas

HaverĂĄ, por hipĂłtese, nas geenas
Luz bastante fulmĂ­nea que transforme
Dentro da noite cavernosa e enorme
Minhas trevas anĂ­micas serenas?!

Raio horrendo haverĂĄ que as rasgue apenas?!
NĂŁo! Porque, na abismal substĂąncia informe,
Para convulsionar a alma que dorme
Todas as tempestades sĂŁo pequenas!

HĂĄ de a Terra vibrar na ardĂȘncia infinda
Do éter em branca luz transubstanciado,
Rotos os nimbos maus que a obstruem a ĂȘsmo…

A prĂłpria Esfinge hĂĄ de falar-vos ainda
E eu, somente eu, hei de ficar trancado
Na noite aterradora de mim mesmo!