Sonetos sobre SilĂȘncio

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Sonetos de silĂȘncio escritos por poetas consagrados, filĂłsofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Fuga

Amo um lugar assim, amo os lugares
onde hĂĄ montanhas, selvas, passarinhos…
– onde o giz alvacento dos luares,
Ă  noite, faz rabiscos de caminhos…

Que bom ficarmos sempre assim, sozinhos…
quantas coisas depois, para lembrares!
Esta calma varanda… os meus carinhos…
Um silĂȘncio… que Ă© mĂșsica, nos ares…

A porteira lĂĄ embaixo… a estrada, o fim…
Ah! Se pudéssemos nos esquecer
para onde segue aquela estrada, assim…

Ah! Se pudéssemos pensar que aquela
estrada , ali adiante vai morrer…
– Como a vida, meu Deus, seria bela!

Alma SolitĂĄria

Ó alma doce e triste e palpitante!
Que cítaras soluçam solitårias
Pelas RegiÔes longínquas, visionårias
Do teu Sonho secreto e fascinante!

Quantas zonas de luz purificante,
Quantos silĂȘncios, quantas sombras vĂĄrias
De esferas imortais imaginĂĄrias
Falam contigo, Ăł Alma cativante!

Que chama acende os teus farĂłis noturnos
E veste os teus mistériosa taciturnos
Dos esplendores do arco de aliança?

Por que Ă©s assim, melancolicamente,
Como um arcanjo infante, adolescente,
Esquecido nos vales da Esperança?!

Romantismo

Quisera repousar desta vida de agora,
e esquecer no silĂȘncio a dor que me lacera…
– nĂŁo posso ter em mim o ardor da primavera,
– na casa de meu peito uma saudade chora…

E hå sempre uma lembrança a recordar de outrora
que me faz sonhador… E hĂĄ sempre uma quimera,
que ainda vive em minha alma à semelhança da hera
pregada sobre o muro em ruĂ­nas que a vigora…

Quisera me afastar do mundo, e a alma selvagem
repousar bem distante Ă  beira de um remanso
entre o beijo do vento e o choro da folhagem…

E esperar sem ninguĂ©m o prosseguir da vida…
Depois… chegando a morte, em preito ao meu descanso
deixar a minha cruz na solidĂŁo perdida!…

Horas De Sombra

Horas de sombra, de silĂȘncio amigo
Quando hĂĄ em tudo o encanto da humildade
E que o anjo branco e belo da saudade
Roga por nĂłs o seu perfil antigo.

Horas que o coração nĂŁo vĂȘ perigo
De gozar, de sentir com liberdade…
Horas da asa imortal da Eternidade
Aberta sobre tumular jazigo.

Horas da compaixĂŁo e da clemĂȘncia,
Dos segredos sagrados da existĂȘncia,
De sombras de perdĂŁo sempre benditas.

Horas fecundas, de mistério casto,
Quando dos céus desce, profundo e vasto,
O repouso das almas infinitas.

1

Livro, se luz desejas, mal te enganas.
Quanto melhor serĂĄ dentro em teu muro
Quieto, e humilde estar, inda que escuro,
Onde ninguĂ©m t’impece, a ninguĂ©m danas!

Sujeitas sempre ao tempo obras humanas
Coa novidade aprazem; logo em duro
Ódio e desprezo ficam: ama o seguro
SilĂȘncio, fuge o povo, e mĂŁos profanas.

Ah! nĂŁo te posso ter! deixa ir comprindo
Primeiro tua idade; quem te move
Te defenda do tempo, e de seus danos.

DirĂĄs que a pesar meu fostes fugindo,
Reinando SebastiĂŁo, Rei de quatro anos:
Ano cinquenta e sete: eu vinte e nove.

Por Que Falar De Amor ?

“Por Que Falar De Amor ?”
III
Se era preciso ser assim ferido
para ter-te em meus braços e em meu leito,
e sofrer tudo o que jĂĄ foi sofrido
e aceitar tudo o que jĂĄ estĂĄ desfeito…

Se era preciso, para ser querido,
ver também, rudemente contrafeito
o coração de ciĂșmes corrompido
em silĂȘncio, a chorar, dentro do peito!

Se era preciso destruir-me tanto
nesses desejos em que se consomem
os restos de um orgulho que foi canto,

por que falar de amor? Foste lograda:
tu não tens aos teus pés o amor de um homem,
tens um fauno de rastros… e mais nada!

Tarde Demais…

Quando chegaste enfim, para te ver
Abriu-se a noite em mĂĄgico luar;
E pra o som de teus passos conhecer
PĂŽs-se o silĂȘncio, em volta, a escutar…

Chegaste enfim! Milagre de endoidar!
Viu-se nessa hora o que nĂŁo pode ser:
Em plena noite, a noite iluminar;
E as pedras do caminho florescer!

Beijando a areia d’oiro dos desertos
Procura-te em vão! Braços abertos,
PĂ©s nus, olhos a rir, a boca em flor!

E hĂĄ cem anos que eu fui nova e linda!…
E a minha boca morta grita ainda:
“Por que chegaste tarde, Ó meu Amor?!…”

Noite Escura

Noite escura do amor, em que me deito
com teu corpo de luz, eu assombrado
deste fantasma de repente alado
amplificando a jaula do meu peito.

Deixando-o infinito, maculado
de sangue e espuma (Ă© mar este fantasma?
ou pĂĄssaro de mar que em onda espalma
seu corpo que é de luz e céu desfeito).

E a noite escura que era o amor se ajunta
em feixes de silĂȘncio e de desmaio
para a festa defunta

de ver ressurreiçÔes: tempo em que caio
para em sombras cantar mais docemente
este sol que me pÔe preso e demente.

A Um Livro

No silĂȘncio de cinzas do meu Ser
Agita-se uma sombra de cipreste,
Sombra roubada ao livro que ando a ler,
A esse livro de mĂĄgoas que me deste.

Estranho livro que escreveste,
Artista da saudade e do sofrer!
Estranho livro aquele em que puseste
Tudo o que eu sinto, sem poder dizer!

Leio-o, e folheio, assim, toda a minh’alma!
O livro que me deste Ă© meu, e salma
As oraçÔes que choro e rio e canto!…

Poeta igual a mim, ai quem me dera
Dizer o que tu dizes!… Quem soubera
Velar a minha Dor desse teu manto!…

Timidez

Eu sei que Ă© sempre assim, – longe dela imagino
mil versos que nĂŁo fiz mas que ainda hei de compor,
perto dela, – meu Deus!… lembro mais um menino
que esquecesse a lição diante do professor…

Penso, que a minha voz terĂĄ sons de violino
enchendo os seus ouvidos de cançÔes de amor,
– e hei de deixĂĄ-la tonta ao vinho doce e fino
dos meus beijos, no instante em que minha ela for…

Ao seu lado, no entanto, encabulado, emudeço,
e se os seus lĂĄbios frios, trĂȘmulos, se calam,
eu, de tudo, das cousas, de mim mesmo, esqueço…

E ficamos assim, ela em silĂȘncio… eu, mudo…
Mas meus olhos, nem sei… ah! Quantas cousas falam!
e seus olhos, seus olhos!… dizem tudo, tudo!

Noturno Do Morro Do Encanto

Este fundo de hotel Ă© um fim de mundo!
Aqui Ă© o silĂȘncio que te voz. O encanto
Que deu nome a este morro, pÔe no fundo
De cada coisa o seu cativo canto.

Ouço o tempo, segundo por segundo.
Urdir a lenta eternidade. Enquanto
FĂĄtima ao pĂł de estrelas sitibundo
Lança a misericórdia do seu manto.

Teu nome é uma lembrança tão antiga,
Que nĂŁo tem so nem cor, e eu, miserando,
NĂŁo sei mais como ouvir, nem como o diga.

Falta a morte chegar… Ela me espia
Neste instante talvez, mal suspeitando
Que jĂĄ morri quando o que eu fui morria.

Soneto Com Estrambote Enviesado

Alfaiate de mim costuro a roupa
que cabe ao figurino que me coube.

SĂł meu verso protege essa amargura
desfiada de dia ao sol veloz,
para Ă  noite tecer nova textura,
novelo de silĂȘncio ao rĂ©s da voz.

Enxoval construĂ­do nessa usura
solitĂĄria de andaimes, num retrĂłs
de linha vertical, que se pendura
na pĂȘnsil teia atada, fio em foz

desse rio agulha que me costura
ao rendilhado de ĂĄguas tropicais,
que sabe de saudades no meu cais.

Viageiro de uma sanha que me traz
sempre de volta ao tear do meu destino
na seda depressiva me assassino.

Testamento do Homem Sensato

Quando eu morrer, não faças disparates
nem fiques a pensar: «Ele era assim…»
mas senta-te num banco de jardim,
calmamente comendo chocolates.

Aceita o que te deixo, o quase nada
destas palavras que te digo aqui:
foi mais que longa a vida que eu vivi,
para ser em lembranças prolongada.

Porém, se, um dia, só, na tarde em queda,
surgir uma lembrança desgarrada,
ave que nasce e em voo se arremeda,

deixa-a pousar em teu silĂȘncio, leve
como se apenas fosse imaginada,
com uma luz, mais que distante, breve.

A Cavalgada

A lua banha a solitĂĄria estrada…
SilĂȘncio!… mas alĂ©m, confuso e brando,
O som longĂ­nquo vem se aproximando
Do galopar de estranha cavalgada.

São fidalgos que voltam da caçada;
VĂȘm alegres, vĂȘm rindo, vĂȘm cantando,
E as trompas a soar vĂŁo agitando
O remanso da noite embalsamada…

E o bosque estala, move-se, estremece…
Da cavalgada o estrépito que aumenta
Perde-se apĂłs no centro da montanha…

E o silĂȘncio outra vez soturno desce,
E lĂ­mpida, sem mĂĄcula, alvacenta
A lua a estrada solitĂĄria banha…

CĂĄrcere Das Almas

Ah! Toda a alma num cĂĄrcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço olhando imensidades,
Mares, estrelas, tardes, natureza.

Tudo se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhÔes as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo o Espaço da Pureza.

Ó almas presas, mudas e fechadas
Nas prisÔes colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!

Nesses silĂȘncios solitĂĄrios, graves,
que chaveiro do CĂ©u possui as chaves
para abrir-vos as portas do Mistério?!

CrepĂșsculo

Teus olhos, borboletas de oiro, ardentes
Batendo as asas leves, irisadas,
Poisam nos meus, suaves e cansadas
Como em dois lĂ­rios roxos e dolentes…

E os lĂ­rios fecham… Meu Amor, nĂŁo sentes?
Minha boca tem rosas desmaiadas,
E as minhas pobres mĂŁos sĂŁo maceradas
Como vagas saudades de doentes…

O SilĂȘncio abre as mĂŁos… entorna rosas…
Andam no ar carĂ­cias vaporosas
Como pĂĄlidas sedas, arrastando…

E a tua boca rubra ao pé da minha
É na suavidade da tardinha
Um coração ardente palpitando…

JĂĄ nĂŁo Vivi, SĂł Penso

JĂĄ nĂŁo vivo, sĂł penso. E o pensamento
Ă© uma teia confusa, complicada,
uma renda subtil feita de nada:
de nuvens, de crepĂșsculos, de vento.

Tudo Ă© silĂȘncio. O arco-Ă­ris Ă© cinzento,
e eu cada vez mais vaga, mais alheada.
Percorro o céu e a terra aqui sentada,
sem uma voz, um olhar, um movimento.

Terei morrido jĂĄ sem o saber?
Seria bom mas nĂŁo, nĂŁo pode ser,
ainda me sinto presa por mil laços,

ainda sinto na pele o sol e a lua,
ouço a chuva cair na minha rua,
e a vida ainda me aperta nos seus braços.

Exortação

Corpo crivado de sangrentas chagas,
Que atravessas o mundo soluçando,
Que as carnes vais ferindo e vais rasgando
Do fundo d’IlusĂ”es velhas e vagas.

Grande isolado das terrestres plagas,
Que vives as Esferas contemplando,
Braços erguidos, olhos no ar, olhando
A etérea chama das Conquistas magas.

Se Ă© de silĂȘncio e sombra passageira,
De cinza, desengano e de poeira
Este mundo feroz que te condena,

Embora ansiosamente, amargamente
Revela tudo o que tu’alma sente
Para ela entĂŁo poder ficar serena!

Hora MĂ­stica

Noite caindo … CĂ©u de fogo e flores.
Voz de CrepĂșsculo exalando cores,
O céu vai cheio de Deus e de harmonia.
SilĂȘncio … Eis-me rezando aos fins do dia.

NĂ©voa de luz criando imagens na ĂĄgua,
Nome das åguas esculpindo os céus,
Tarde aos relevos hĂșmidos de frĂĄgua,
Boca da noite, eis-me rezando a Deus.

Eis-me entoando, a voz de cinza e ouro,
— Oh, cores na água vindo às mãos em branco! —
Minha Ăłpera de Sol ao Ășltimo arranco.

E, oh! hora mĂ­stica em que o olhar abraso,
— Sol expirando aos Pórticos do Ocaso! —
Dobra em meu peito um oceano em coro.

Ser Dos Seres

No teu ser de silĂȘncio e d’esperança
A doce luz das AmplidÔes flameja.
Ele sente, ele aspira, ele deseja
A grande zona da imortal Bonança.

Pelos largos espaços se balança
Como a estrela infinita que dardeja,
Sempre isento da Treva que troveja
O clamor inflamado da Vingança.

Por entre enlevos e deslumbramentos
Entra na Força astral dos Sentimentos
E do Poder nos mĂĄgicos poderes.

E traz, embora os íntimos cansaços,
Ânsias secretas para abrir os braços
Na generosa comunhĂŁo dos Seres!