Sonetos Exclamativos de Vasco Mouzinho de Quebedo

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Soneto XXXV

Eclipsou-se teu Sol quando nascia,
Em flor cortada foi tua doce vida,
Antes de ser ganhada, foi perdida,
Deixou seus dias antes de seu dia.

Aparecer entĂŁo nos parecia
Quando a já vimos desaparecida,
Enfim, moça fermosa, estás rendida
Ă€ lei humana envolta em terra fria.

Ai Amor, quantas vezes te condenas!
Criaste-me nesta alma ua esperança,
Deixas roubar-ma a morte sem valer-me.

Mas bem entendo, Amor, que isto me ordenas
Para vir a saber a quanto alcança,
PerdĂŞ-la, sem perder-te, com perder-me.

Soneto XXXXII

Dai-me razĂŁo, Baptista, que conclua
Porque sois voz que no deserto brada,
Se Deus tem já sua palavra dada
De a seu filho chamar palavra sua.

E nĂŁo Ă© bem que se vos atribua
Nome que a Deus para seu filho agrada.
Quanto ua confissĂŁo desenganada
Obrou, temo esta voz tanto destrua.

Ah! quanto Ă© seu ofĂ­cio Ă  voz conforme,
Desperta a voz, mas a palavra fala,
Mil vezes com quem dorme usamos isto.

Vem Deus falar c’o Mundo, e porque dorme
Primeiro a voz lhe manda que o abala,
O Baptista desperta, e fala Cristo.

Soneto VI

Qual naufragante mĂ­sero que cai
Da rota barca no soberbo pego,
E, lidando c’os braços sem sossego,
A cada onda receia que desmaie,

Tal, sem ter já lugar onde se espraie
Neste mar de meu mal, cansado e cego
Ando, aqui desfaleço, ali me anego,
E a cada encontro seu [a] alma me sai.

Em meio de mil barcas clamo, e brado:
“Me lancem por piedade um cabo forte!”,
Mas a ninguém magoa meu cuidado.

Ah, nĂŁo queirais que vida tal se corte
Que se vida me dais, ganhais dobrado,
Livrando muitas vidas de ua morte.

Soneto V

Qual Hércules estrela já mudado,
Que quando se quer pĂ´r ao tempo certo,
Cabeça e corpo todo já coberto,
Fica só pelos pés dependurado,

Tal c’ua grave dor, grave cuidado
Que o coração me tem de todo aberto,
Perdida a razão já, de meu fim perto
Me vejo agora em semelhante estado.

Mas ai! paixão penosa, que além passas,
Que este, enfim, nĂŁo Ă© sempre no CĂ©u visto,
Ainda que dos pés se ponha tarde.

E tu, como meu mal e morte traças,
És qual a mão do filho de Calisto,
Que em todo [o] tempo ao mar cintila e arde.