Pobre De Cristo
A JosĂ© EmĂdio Amaro
Ă“ minha terra na planĂcie rasa,
Branca de sol e cal e de luar,
Minha terra que nunca viste o mar,
Onde tenho o meu pĂŁo e a minha casa.Minha terra de tardes sem uma asa,
Sem um bater de folhas…a dormitar…
Meu anel de rubis a flamejar,
Minha terra moirisca a arder em brasa!Minha terra onde meu irmĂŁo nasceu
Aonde a mĂŁe que eu tive e que morreu
Foi moça e loira, amou e foi amada!Truz…Truz…Truz… — Eu nĂŁo tenho onde me acoite,
Sou um pobre de longe, Ă© quase noite,
Terra, quero dormir, dá-me pousada!…
Sonetos sobre Luar
113 resultadosII
Celeste… É assim, divina, que te chamas.
Belo nome tu tens, Dona Celeste…
Que outro terias entre humanas damas,
Tu que embora na terra do cĂ©u vieste?Celeste… E como tu Ă©s do cĂ©u nĂŁo amas:
Forma imortal que o espĂrito reveste
De luz, nĂŁo temes sol, nĂŁo temes chamas,
Porque Ă©s sol, porque Ă©s luar, sendo celeste.IncoercĂvel como a melancolia,
Andas em tudo: o sol no poente vasto
Pede-te a mágoa do findar do dia.E a lua, em meio à noite constelada,
Pede-te o luar indefinido e casto
Da tua palidez de hĂłstia sagrada.
Falo de Ti Ă s Pedras das Estradas
Falo de ti Ă s pedras das estradas,
E ao sol que e louro como o teu olhar,
Falo ao rio, que desdobra a faiscar,
Vestidos de princesas e de fadas;Falo Ă s gaivotas de asas desdobradas,
Lembrando lenços brancos a acenar,
E aos mastros que apunhalam o luar
Na solidĂŁo das noites consteladas;Digo os anseios, os sonhos, os desejos
Donde a tua alma, tonta de vitĂłria,
Levanta ao céu a torre dos meus beijos!E os meus gritos de amor, cruzando o espaço,
Sobre os brocados fĂşlgidos da glĂłria,
São astros que me tombam do regaço!
Da Minha Janela
Mar alto! Ondas quebradas e vencidas
Num soluçar aflito, murmurado…
VĂ´o de gaivotas, leve, imaculado,
Como neves nos pĂncaros nascidas!Sol! Ave a tombar, asas já feridas,
Batendo ainda num arfar pausado…
Ă“ meu doce poente torturado
Rezo-te em mim, chorando, mãos erguidas!Meu verso de Samain cheio de graça,
Inda não és clarão já és luar
Como um branco lilás que se desfaça!Amor! Teu coração trago-o no peito…
Pulsa dentro de mim como este mar
Num beijo eterno, assim, nunca desfeito!…
Deusa Serena
Espiritualizante Formosura
Gerada nas Estrelas impassĂveis,
Deusa de formas bĂblicas, flexĂveis,
Dos eflúvios da graça e da ternura.Açucena dos vales da Escritura,
Da alvura das magnĂłlias marcessĂveis,
Branca Via-Láctea das indefinĂveis
Brancuras, fonte da imortal brancura.NĂŁo veio, Ă© certo, dos pauis da terra
Tanta beleza que o teu corpo encerra,
Tanta luz de luar e paz saudosa…Vem das constelações, do Azul do Oriente,
Para triunfar maravilhosamente
Da beleza mortal e dolorosa!
Quatro Sonetos De Meditação – IV
Apavorado acordo, em treva. O luar
É como o espectro do meu sonho em mim
E sem destino, e louco, sou o mar
Patético, sonâmbulo e sem fim.Desço na noite, envolto em sono; e os braços
Como ĂmĂŁs, atraio o firmamento
Enquanto os bruxos, velhos e devassos
Assoviam de mim na voz do vento.Sou o mar! sou o mar! meu corpo informe
Sem dimensĂŁo e sem razĂŁo me leva
Para o silĂŞncio onde o SilĂŞncio dormeEnorme. E como o mar denro da treva
Num constante arremesso largo e aflito
Eu me espedaço em vão contra o infinito.
Em Busca do Amor
O meu Destino disse-me a chorar:
“Pela estrada da Vida vai andando,
E, aos que vires passar, interrogando
Acerca do Amor, que hás-de encontrar.”Fui pela estrada a rir e a cantar,
As contas do meu sonho desfilando …
E noite e dia, Ă chuva e ao luar,
Fui sempre caminhando e perguntando …Mesmo a um velho eu perguntei: “Velhinho,
Viste o Amor acaso em teu caminho?”
E o velho estremeceu … olhou … e riu …Agora pela estrada, já cansados,
Voltam todos pra trás desanimados …
E eu paro a murmurar: “NinguĂ©m o viu! …”
Post Mortem
Quando do amor das Formas inefáveis
No teu sangue apagar-se a imensa chama,
Quando os brilhos estranhos e variáveis
Esmorecerem nos trofĂ©us da Fama.Quando as nĂveas Estrelas invioláveis,
Doce velário que um luar derrama,
Nas clareiras azuis ilimitáveis
Clamarem tudo o que o teu Verso clama.Já terás para os báratros descido,
Nos cilĂcios da Morte revestido,
PĂ©s e faces e mĂŁos e olhos gelados…Mas os teus Sonhos e Visões e Poemas
Pelo alto ficarĂŁo de eras supremas
Nos relevos do Sol eternizados!
Ave! Maria
Ave! Maria das Estrelas, Ave!
Cheia de graça do luar, Maria!
Harmonia de cântico suave,
Das harpas celestiais branda harmonia…Nuvem d’incensos atravĂ©s da nave
Quando o templo de pompas irradia
E em prantos o ĂłrgĂŁo vai plangendo grave
A profunda e gemente litania…Seja bendito o fruto do teu ventre,
Jesus, mais belo dentre os astros e entre
As mulheres judaicas mais amado…Ă“ Luz! Eucaristia da beleza,
Chama sagrada no Evangelho acesa,
Maravilha do Amor e do Pecado!
O Chalé
É um chalé luzido e aristocrático,
De fulgurantes, ricos arabescos,
Janelas livres para os ares frescos,
Galante, raro, encantador, simpático.O sol que vibra em rubro tom prismático,
No resplendor dos luxos principescos,
Dá-lhe uns alegres tiques romanescos,
Um colorido ideal silforimático.Há um jardim de rosas singulares,
LĂrios joviais e rosas nĂŁo vulgares,
Brancas e azuis e roxas purpĂşreas.E a luz do luar caindo em brilhos vagos,
Na placidez de adormecidos lagos
Abre esquisitas radiações sulfúreas.
RĂşstica
Ser a moça mais linda do povoado.
Pisar, sempre contente, o mesmo trilho,
Ver descer sobre o ninho aconchegado
A bênção do Senhor em cada filho.Um vestido de chita bem lavado,
Cheirando a alfazema e a tomilho…
– Com o luar matar a sede ao gado,
Dar Ă s pombas o sol num grĂŁo de milho…Ser pura como a água da cisterna,
Ter confiança numa vida eterna
Quando descer Ă “terra da verdade”…Deus, dai-me esta calma, esta pobreza!
Dou por elas meu trono de Princesa,
E todos os meus Reinos de Ansiedade.
Salomé
InsĂłnia rĂ´xa. A luz a virgular-se em mĂŞdo,
Luz morta de luar, mais Alma do que a lua…
Ela dança, ela range. A carne, alcool de nua,
Alastra-se pra mim num espasmo de segrĂŞdo…Tudo Ă© capricho ao seu redĂłr, em sombras fátuas…
O arĂ´ma endoideceu, upou-se em cĂ´r, quebrou…
Tenho frio… Alabastro!… A minh’Alma parou…
E o seu corpo resvala a projectar estátuas…Ela chama-me em Iris. Nimba-se a perder-me,
Golfa-me os seios nus, ecĂ´a-me em quebranto…
Timbres, elmos, punhais… A doida quer morrer-me:Mordoura-se a chorar–ha sexos no seu pranto…
Ergo-me em som, oscilo, e parto, e vou arder-me
Na bĂ´ca imperial que humanisou um Santo…
Sempre E Sempre
De longe ou perto, juntas, separadas,
Olhando sempre os mesmos horizontes,
Presas, unidas nossas duas fontes
Gêmeas, ardentes, novas, inspiradas;Vendo cair as lágrimas prateadas,
Sentindo o coro harmĂ´nico das fontes,
Sempre fitando a cĂşspide dos montes
E o rosicler das frescas alvoradas;Sempre embebendo os lĂmpidos olhares
Na claridĂŁo dos humildes luares,
No loiro sol das crenças se embebendo,Vão nossas almas brancas e floridas
Pelo futuro azul das nossas vidas,
Sempre se amando, sempre se querendo.