Sonetos sobre Ouro

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Sonetos de ouro escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Conto de Fadas

Eu trago-te nas mĂŁos o esquecimento
Das horas más que tens vivido, Amor!
E para as tuas chagas o unguento
Com que sarei a minha prĂłpria dor.

Os meus gestos sĂŁo ondas de Sorrento…
Trago no nome as letras de uma flor…
Foi dos meus olhos garços que um pintor
Tirou a luz para pintar o vento…

Dou-te o que tenho: o astro que dormita,
O manto dos crepĂşsculos da tarde,
O sol que Ă© d’oiro, a onda que palpita.

Dou-te comigo o mundo que Deus fez!
– Eu sou Aquela de quem tens saudade,
A Princesa do conto: “Era uma vez…”

Essa Que Eu Hei De Amar…

Essa que eu hei de amar perdidamente um dia
será tão loura, e clara, e vagarosa, e bela,
que eu pensarei que Ă© o sol que vem, pela janela,
trazer luz e calor a essa alma escura e fria.

E quando ela passar, tudo o que eu nĂŁo sentia
da vida há de acordar no coração, que vela…
E ela irá como o sol, e eu irei atrás dela
como sombra feliz… — Tudo isso eu me dizia,

quando alguém me chamou. Olhei: um vulto louro,
e claro, e vagaroso, e belo, na luz de ouro
do poente, me dizia adeus, como um sol triste…

E falou-me de longe: “Eu passei a teu lado,
mas ias tĂŁo perdido em teu sonho dourado,
meu pobre sonhador, que nem sequer me viste!”

VisĂŁo Da Morte

Olhos voltados para mim e abertos
Os braços brancos, os nervosos braços,
Vens d’espaços estranhos, dos espaços
Infinitos, intĂ©rminos, desertos…

Do teu perfil os tĂ­midos, incertos
Traços indefinidos, vagos traços
Deixam, da luz nos ouros e nos aços,
Outra luz de que os céus ficam cobertos.

Deixam nos céus uma outra luz mortuária,
Uma outra luz de lĂ­vidos martĂ­rios,
De agonies, de mágoa funerária…

E causas febre e horror, frio, delĂ­rios,
Ó Noiva do Sepulcro, solitária,
Branca e sinistra no clarĂŁo dos cĂ­rios!

FonĂłgrafo

Vai declamando um cĂ´mico defunto.
Uma platéia ri, perdidamente,
Do bom jarreta… E há um odor no ambiente.
A cripta e a pĂł, – do anacrĂ´nico assunto.

Muda o registo, eis uma barcarola:
LĂ­rios, lĂ­rios, águas do rio, a lua…
Ante o Seu corpo o sonho meu flutua
Sobre um paul, – extática corola.

Muda outra vez: gorjeios, estribilhos
Dum clarim de oiro – o cheiro de junquilhos,
VĂ­vido e agro! – tocando a alvorada…

Cessou. E, amorosa, a alma das cornetas
Quebrou-se agora orvalhada e velada.
Primavera. ManhĂŁ. Que eflĂşvio de violetas!

O Avarento

No meio de seus cofres, desvelado,
Co’as tampas levantadas, rasas de ouro,
Cevando a vista está no metal louro
Dele o cioso Avarento namorado.

Temendo que lhe venha a ser roubado,
Emprega alma e vida em seu tesouro,
Girando com os olhos, qual besouro,
Zumbindo sem cessar, afervorado.

Fechado nele está, com sete portas,
Com temor de algum fero arrombamento
De astutas invenções, de ideias tortas.

NĂŁo emprega em mais nada o pensamento.
Cega ambição de vãs riquezas mortas!
QuĂŁo infeliz nĂŁo Ă©s, louco avarento!

Teus Olhos

Olhos do meu Amor! Infantes loiros
Que trazem os meus presos, endoidados!
Neles deixei, um dia, os meus tesoiros:
Meus anéis, minhas rendas, meus brocados.

Neles ficaram meus palácios moiros,
Meus carros de combate, destroçados,
Os meus diamantes, todos os meus oiros
Que trouxe d’AlĂ©m-Mundos ignorados!

Olhos do meu Amor! Fontes… cisternas..
Enigmáticas campas medievais…
Jardins de Espanha… catedrais eternas…

Berço vinde do cĂ©u Ă  minha porta…
Ă“ meu leite de nĂşpcias irreais!…
Meu sumptuoso tĂşmulo de morta!…

As Minhas MĂŁos

As minhas mĂŁos magritas, afiladas,
Tão brancas como a água da nascente,
Lembram pálidas rosas entornadas
Dum regaço de Infanta do Oriente.

MĂŁos de ninfa, de fada, de vidente,
Pobrezinhas em sedas enroladas,
Virgens mortas em luz amortalhadas
Pelas prĂłprias mĂŁos de oiro do sol-poente.

Magras e brancas… Foram assim feitas…
MĂŁos de enjeitada porque tu me enjeitas…
TĂŁo doces que elas sĂŁo! TĂŁo a meu gosto!

Pra que as quero eu – Deus! – Pra que as quero eu?!
Ó minhas mãos, aonde está o céu?
…Aonde estĂŁo as linhas do teu rosto?

Se as Penas com que Amor TĂŁo Mal me Trata

Se as penas com que Amor tĂŁo mal me trata
Permitirem que eu tanto viva delas,
Que veja escuro o lume das estrelas,
Em cuja vista o meu se acende e mata;

E se o tempo, que tudo desbarata,
Secar as frescas rosas, sem colhĂŞ-las,
Deixando a linda cor das tranças belas
Mudada de ouro fino em fina prata;

Também, Senhora, então vereis mudado
O pensamento e a aspereza vossa,
Quando não sirva já sua mudança.

Ver-vos-eis suspirar por o passado,
Em tempo quando executar-se possa
No vosso arrepender minha vingança.

O Palácio da Ventura

Sonho que sou um cavaleiro andante.
Por desertos, por sĂłis, por noite escura,
Paladino do amor, busca anelante
O palácio encantado da Ventura!

Mas já desmaio, exausto e vacilante,
Quebrada a espada já, rota a armadura…
E eis que sĂşbito o avisto, fulgurante
Na sua pompa e aérea formusura!

Com grandes golpes bato Ă  porta e brado:
Eu sou o Vagabundo, o Deserdado…
Abri-vos, portas d’ouro, ante meus ais!

Abrem-se as portas d’ouro, com fragor…
Mas dentro encontro sĂł, cheio de dor,
SilĂŞncio e escuridĂŁo – e nada mais!

Dos Mais Fermosos Olhos

Dos mais fermosos olhos, mais fermoso
Rosto, que entre nós há, do mais divino
Lume, mais branca neve, ouro mais fino,
Mais doce fala, riso mais gracioso:

Dum Angélico ar, de um amoroso
Meneio, de um esprito peregrino
Se acendeu em mim o fogo, de que indigno
Me sinto, e tanto mais assi ditoso.

Não cabe em mim tal bem-aventurança.
É pouco uma alma só, pouco uma vida,
Quem tivesse que dar mais a tal fogo!

Contente a alma dos olhos água lança
Pelo em si mais deter, mas Ă© vencida
Do doce ardor, que nĂŁo obedece a rogo.

MarĂ­lia De Dirceu

Soneto 7

O nume tutelar da Monarquia,
Que fez do grande Henrique a invicta espada,
Procurou dos Destinos a morada,
Por consultar a idade que viria.

A mil e mil herĂłis descrito via,
Que exaltam de furtado a estirpe honrada,
E na série, que adora, dilatada,
O nome de Francisco descobria.

Contempla uma por uma as letras d’ouro;
Este penhor, que o tempo nĂŁo consome,
Promete ao reino seu maior tesouro.

Prostra-se o gĂŞnio; e sem que a empresa tome
De lhe buscar sequer mais outro agouro,
O sĂ­tio beija, e lhe mostra o nome.

Cegos como as Peças de Ouro Reluzentes

A Fama, a GlĂłria, as Armas, a Nobreza,
A CiĂŞncia, o Poder e tudo quanto
Em honra e distinção, de canto a canto,
Encerra deste mundo a vĂŁ Grandeza,

A Pluto, cego deus, com vil baixeza
Adoram de joelhos, como a santo:
Pois sĂł o deus do reino atroz do espanto
Pode ser rei e Numen da riqueza.

Do dossel do seu trono estĂŁo pendentes
C’roas, mitras, laurĂ©is, brazões, tiaras,
Que o cego deus reparte Ă s cegas gentes.

Tudo of’rendar-lhe vai nas torpes aras,
Cegos co’as peças de ouro reluzentes,
A Honra, a Liberdade, as vidas caras.

Perdi os Meus Fantásticos Castelos

Perdi meus fantásticos castelos
Como nĂ©voa distante que se esfuma…
Quis vencer, quis lutar, quis defendĂŞ-los:
Quebrei as minhas lanças uma a uma!

Perdi minhas galeras entre os gelos
Que se afundaram sobre um mar de bruma…
– Tantos escolhos! Quem podia vĂŞ-los? –
Deitei-me ao mar e nĂŁo salvei nenhuma!

Perdi a minha taça, o meu anel,
A minha cota de aço, o meu corcel,
Perdi meu elmo de ouro e pedrarias…

Sobem-me aos lábios sĂşplicas estranhas…
Sobre o meu coração pesam montanhas…
Olho assombrada as minhas mĂŁos vazias…

Siderações

Para as Estrelas de cristais gelados
As ânsias e os desejos vão subindo,
Galgando azuis e siderais noivados
De nuvens brancas a amplidĂŁo vestindo…

Num cortejo de cânticos alados
Os arcanjos, as cĂ­taras ferindo,
Passam, das vestes nos troféus prateados,
As asas de ouro finamente abrindo…

Dos etéreos turíbulos de neve
Claro incenso aromal, lĂ­mpido e leve,
Ondas nevoentas de Visões levanta…

E as ânsias e os desejos infinitos
VĂŁo com os arcanjos formulando ritos
Da Eternidade que nos Astros canta…

Bem Sei, Amor, que Ă© Certo o que Receio

Bem sei, Amor, que Ă© certo o que receio;
Mas tu, porque com isso mais te apuras,
De manhoso, mo negas, e mo juras
Nesse teu arco de ouro; e eu te creio.

A mĂŁo tenho metida no meu seio,
E nĂŁo vejo os meus danos Ă s escuras;
Porém porfias tanto e me asseguras,
Que me digo que minto, e que me enleio.

Nem somente consinto neste engano,
Mas inda to agradeço, e a mim me nego
Tudo o que vejo e sinto de meu dano.

Oh poderoso mal a que me entrego!
Que no meio do justo desengano
Me possa inda cegar um moço cego?

Tatuagens Complicadas Do Meu Peito

Tatuagens complicadas do meu peito:
TrofĂ©us, emblemas, dois leões alados…
Mais, entre corações engrinaldados,
Um enorme, soberbo, amor-perfeito…

E o meu brasĂŁo… Tem de oiro, num quartel
Vermelho, um lis; tem no outro uma donzela,
Em campo azul, de prata o corpo, aquela
Que é no meu braço como que um broquel.

Timbre: rompante, a megalomania…
Divisa: um ai, – que insiste noite e dia
Lembrando ruĂ­nas, sepulturas rasas…

Entre castelos serpes batalhantes,
E águias de negro, desfraldando as asas,
Que realça de oiro um colar de besantes!

Roma PagĂŁ

Na antiga Roma, quando a saturnal fremente
Exerceu sobre tudo o báquico domínio,
NĂŁo era raro ver nos gozos do triclĂ­nio
A nudez feminina imperiosa e quente.

O corpo de alabastro, olĂ­mpico e fulgente,
Lascivamente nu, correto e retilĂ­nio,
Num doce tom de cor, esplĂŞndido e sangĂĽĂ­neo,
Tinha o assombro da came e a forma da serpente.

A luz atravessava em frocos d’oiro e rosa
Pela fresca epiderme, ebĂşrnea e setinosa,
Macia, da maciez dulcĂ­ssima de arminhos.

Menos raro, porém, do que a nudez romana
Era ver borbulhar, em férvida espadana
A pĂşrpura do sangue e a pĂşrpura dos vinhos.

Ergue, Criança, A Fronte Condorina

Ergue, criança, a fronte condorina
Que é tua fronte, oh!, genial criança,
É como a estrela-d’alva da esperança,
Do talento sagrado que a ilumina!

Ergue-a, pois, e que, à auréola purpurina
Do Sol da CiĂŞncia, o rĂştilo tesouro
Do Estudo – o Grande Mestre – que te ensina,
Chova sobre ela suas gemas d’ouro!

E hoje que colhes um laurel bendito,
Aceita a saudação que num contrito
Fervor, eleva, qual penhor sincero

Um peito amigo a outro peito amigo,
A um gĂŞnio que desponta e que eu bendigo,
A um coração de irmão que tanto quero!

Dos Tórrido Sertões, Pejados De Oiro

Dos tórridos sertões, pejados de oiro,
Saiu um sabichĂŁo de escassa fama,
Que os livros preza, os cartapácios ama,
Que das lĂ­nguas repartem o tesoiro.

Arranha o persiano, arranha o moiro,
Sabe que Deus em turco Allah se chama;
Que no grego alfabeto o G Ă© gama,
Que taurus em latim quer dizer toiro.

Para papaguear saiu do mato:
Abocanha talentos, que nĂŁo goza;
É mono, e prega unhadas como gato.

É nada em verso, quase nada em prosa:
NĂŁo conheces, leitor, neste retrato
O guapo charlatão Tomé Barbosa?

Toledo

Diluído numa taça de oiro a arder
Toledo Ă© um rubi. E hoje Ă© sĂł nosso!
O sol a rir… Vivalma… NĂŁo esboço
Um gesto que me nĂŁo sinta esvaecer…

As tuas mĂŁos tacteiam-me a tremer…
Meu corpo de âmbar, harmonioso e moço
É como um jasmineiro em alvoroço
Ébrio de sol, de aroma, de prazer!

Cerro um pouco o olhar onde subsiste
Um romântico apelo vago e mudo,
– Um grande amor Ă© sempre grave e triste.

Flameja ao longe o esmalte azul do Tejo…
Uma torre ergue ao cĂ©u um grito agudo…
Tua boca desfolha-me num beijo…