Sonetos sobre Rosas de Augusto dos Anjos

7 resultados
Sonetos de rosas de Augusto dos Anjos. Leia este e outros sonetos de Augusto dos Anjos em Poetris.

Mágoas

Quando nasci, num mĂŞs de tantas flores,
Todas murcharam, tristes, langorosas,
Tristes fanaram redolentes rosas,
Morreram todas, todas sem olores.

Mais tarde da existĂŞncia nos verdores
Da infância nunca tive as venturosas
Alegrias que passam bonançosas,
Oh! Minha infância nunca teve flores!

Volvendo Ă  quadra azul da mocidade,
Minh’alma levo aflita Ă  Eternidade,
Quando a morte matar meus dissabores.

Cansado de chorar pelas estradas,
Exausto de pisar mágoas pisadas,
Hoje eu carrego a cruz das minhas dores!

Lirial

Por que choras assim, tristonho lĂ­rio,
Se eu sou o orvalho eterno que te chora,
P’ra que pendes o cálice que enflora
Teu seio branco do palor do cĂ­rio?!

Baixa a mim, irmã pálida da Aurora,
Estrela esmaecida do MartĂ­rio;
Envolto da tristeza no delĂ­rio,
Deixa beijar-te a face que descora!

Fosses antes a rosa purpurina
E eu beijaria a pétala divina
Da rosa, onde nĂŁo pousa a desventura.

Ai! que ao menos talvez na vida escassa
Não chorasses à sombra da desgraça,
Para eu sorrir Ă  sombra da ventura!

Sofredora

Cobre-lhe a fria palidez do rosto
O sendal da tristeza que a desola;
Chora – o orvalho do pranto lhe perola
As faces maceradas de desgosto.

Quando o rosário de seu pranto rola,
Das brancas rosas do seu triste rosto
Que rolam murchas como um sol já posto
Um perfume de lágrimas se evola.

Tenta às vezes, porém, nervosa e louca
Esquecer por momento a mágoa intensa
Arrancando um sorriso Ă  flor da boca.

Mas volta logo um negro desconforto,
Bela na Dor, sublime na Descrença.
Como Jesus a soluçar no Horto!

No Campo

Tarde. Um arroio canta pela umbrosa
Estrada; as águas límpidas alvejam
Com cristais. Aragem suspirosa
Agita os roseirais que ali vicejam.

No alto, entretanto, os astros rumorejam
Um presságio de noute luminosa
E ei-la que assoma – a Louca tenebrosa,
Branca, emergindo Ă s trevas que a negrejam.

Chora a corrente mĂşrmura, e, Ă  dolente
Unção da noute, as flores também choram
Num chuveiro de pétalas, nitente,

Pendem e caem – os roseirais descoram
E elas bĂłiam no pranto da corrente
Que as rosas, ao luar, chorando enfloram.

Primavera

A meu irmĂŁo Odilon dos Anjos

Primavera gentil dos meus amores,
– Arca cerĂşlea de ilusões etĂ©reas,
Chova-te o Céu cintilações sidéreas
E a terra chova no teu seio flores!

Esplende, Primavera, os teus fulgores,
Na auréola azul dos dias teus risonhos,
Tu que sorveste o fel das minhas dores
E me trouxeste o néctar dos teus sonhos!

Cedo virá, porém, o triste outono,
Os dias voltarĂŁo a ser tristonhos
E tu hás de dormir o eterno sono,

Num sepulcro de rosas e de flores,
Arca sagrada de cerĂşleos sonhos,
Primavera gentil dos meus amores!

No Claustro

Pelas do claustro salas silenciosas
De lutulentas, Ăşmidas arcadas,
Na vastidĂŁo silente das caladas
AbĂłbodas sombrias tenebrosas,

Vagueiam tristemente desfiladas
De freiras e de monjas tristurosas,
Que guardam cinzas de ilusões passadas,
Que guardam pĂ©r’las de funĂ©reas rosas.

E Ă  noute quando rezam na clausura,
No sigilo das rezas misteriosas,
Nem a sombra mais leve de ventura!

Sempre as arcadas ogivais, desnudas,
E as mesmas monjas sempre tristurosas,
E as mesmas portas impassĂ­veis, mudas!

Ariana

Ela Ă© o tipo perfeito da ariana,
Branca, nevada, pĂşbere, mimosa,
A carne exuberante e capitosa
Trescala a essĂŞncia que de si dimana.

As nĂ­veas pomas do candor da rosa,
Rendilhando-lhe o colo de sultana,
Emergem da camisa cetinosa
Entre as rendas sutis de filigrana.

Dorme talvez. Em flácido abandono
Lembra formosa no seu casto sono
A languidez dormente da indiana,

Enquanto o amante pálido, a seu lado
Medita, a fronte triste, o olhar velado
No Mistério da Carne Soberana