Alimentar o Amor
Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Chega-se sempre à primeira frase, ao primeiro número da revista, ao primeiro mês de amor. Cada começo é uma mudança e o coração humano vicia-se em mudar. Vicia-se na novidade do arranque, do início, da inauguração, da primeira linha na página branca, da luz e do barulho das portas a abrir.
Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Por isso respeito cada vez menos estas actividades. Aprendi que o mais natural é criar e o mais difícil de tudo é continuar. A actividade que eu mais amo e respeito é a actividade de manter.
Em Portugal quase tudo se resume a começos e a encerramentos. Arranca-se com qualquer coisa, de qualquer maneira, com todo o aparato. À mínima comichão aparece uma «iniciativa», que depois não tem prosseguimento ou perseverança e cai no esquecimento. Nem damos pela morte.
É por isso que eu hoje respeito mais os continuadores que os criadores. Criadores não nos faltam. Chefes não nos faltam. Faltam-nos continuadores. Faltam-nos tenentes. Heróis não nos faltam. Faltam-nos guardiões.É como no amor. A manutenção do amor exige um cuidado maior. Qualquer palerma se apaixona, mas é preciso paciência para fazer perdurar uma paixão.
Textos sobre Amizade
104 resultadosNo Amor é a Alma aquilo que Mais nos Toca
As mesmas paixões são bastante diferentes nos homens. O mesmo objecto pode-lhes agradar por aspectos opostos; suponho que vários homens podem prender-se a uma mesma mulher; uns a amam pelo seu espírito, outros pela sua virtude, outros pelos seus defeitos, etc. E pode até acontecer que todos a amem por coisas que ela não tem, como quando se ama uma mulher leviana a quem se julga séria. Pouco importa, a gente prende-se à idéia que se tem prazer em fazer dela; e é mesmo apenas essa idéia que se ama, não é a mulher leviana. Assim, não é o objeto das paixões que as degrada ou as enobrece, mas a maneira como a gente o encara.
Ora, eu disse que era possível que se buscasse no amor algo mais puro do que o interesse dos nossos sentidos. Eis o que me faz pensar assim. Vejo todos os dias no mundo que um homem cercado de mulheres com as quais nunca falou, como na missa, no sermão, nem sempre se decide pela mais bonita, ou mesmo pela que lhe pareça tal. Qual a razão disso? É que cada beleza exprime um carácter bem particular, e preferimos aquele que melhor se encaixa no nosso.
A Desventura Máxima é a Solidão
A desventura máxima é a solidão. É tão verdade que o reconforto supremo – a religião – consiste em encontrar uma companhia que nunca falhe – Deus. A oração é um desabafo, como com um amigo. A obra equivale à oração, porque nos põe em contacto com os que dela tirarão proveito. O problema da vida é, portanto, o seguinte: como romper a nossa solidão, como comunicar com os outros. Assim se explica a existência do matrimónio, da paternidade, das amizades. Mas que a felicidade resida nisto, balelas! Porque se deva estar melhor comunicando com os outros do que só, é estranho. É talvez apenas uma ilusão: a maior parte do tempo, estamos muitíssimo bem sós. É agradável ter, de tempos a tempos, um odre em que nos possamos despejar e, em seguida, bebermo-nos a nós próprios: dado que pedimos aos outros apenas aquilo que já temos em nós. É um mistério o motivo por que não basta perscrutar e beber em nós próprios e seja preciso reavermo-nos por intermédio dos outros. (O sexo é um incidente: o que recebemos é momentâneo e casual; pretendemos algo de mais secreto e misterioso de que o sexo é apenas um sinal, um símbolo).
As Ideias dependem das Sensações
À primeira vista, nada pode parecer mais ilimitado do que o pensamento humano, que não apenas escapa a toda autoridade e a todo poder do homem, mas também nem sempre é reprimido dentro dos limites da natureza e da realidade. Formar monstros e juntar formas e aparências incongruentes não causam à imaginação mais embaraço do que conceber os objectos mais naturais e mais familiares. Apesar de o corpo confinar-se num só planeta, sobre o qual se arrasta com sofrimento e dificuldade, o pensamento pode transportar-nos num instante às regiões mais distantes do Universo, ou mesmo, além do Universo, para o caos indeterminado, onde se supõe que a Natureza se encontra em total confusão. Pode-se conceber o que ainda não foi visto ou ouvido, porque não há nada que esteja fora do poder do pensamento, excepto o que implica absoluta contradição.
Entretanto, embora o nosso pensamento pareça possuir esta liberdade ilimitada (…) ele está realmente confinado dentro de limites muito reduzidos e todo o poder criador do espírito não ultrapassa a faculdade de combinar, de transpor, aumentar ou de diminuir os materiais que nos foram fornecidos pelos sentidos e pela experiência. Quando pensamos numa montanha de ouro, apenas unimos duas idéias compatíveis,