Nunca Estamos Contentes

Já ouvistes dizer: «Ninho feito, pega morta». Que me dizeis ao contentamento do mundo, onde toda a duração dele está enquanto se alcança? Porque, acabado de passar, acabado de esquecer. E com razão, porque, acabado de alcançar, é passado; e maior saudade deixa do que é o contentamento que deu. Esperai, por me fazer mercê, que lhe quero dar umas palavrinhas de propósito:

Mundo, se te conhecemos,
porque tanto desejamos
teus enganos?
E, se assim te queremos,
muito sem causa nos queixamos
de teus danos.

Tu não enganas ninguém,
pois a quem te desejar
vemos que danas;
se te querem qual te vem,
se se querem enganar,
ninguém enganas.

Vejam-se os bens que tiveram
os que mais em alcançar-te
se esmeraram;
que uns, vivendo, nĂŁo viveram,
e os outros, sĂł com deixar-te,
descansaram.

E se esta tão clara fé
te aclara teus enganos,
desengana ;
sobejamente mal vĂŞ
quem, com tantos desenganos,
se engana.

Mas como tu sempre morres
no engano em que andamos e que vemos,
nĂŁo cremos o que tu podes,

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