Textos sobre Exemplos de Agustina Bessa-LuĂ­s

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Textos de exemplos de Agustina Bessa-LuĂ­s. Leia este e outros textos de Agustina Bessa-LuĂ­s em Poetris.

A ImportĂąncia da Arte

A arte Ă©, provavelmente, uma experiĂȘncia inĂștil; como a «paixĂŁo inĂștil» em que cristaliza o homem. Mas inĂștil apenas como tragĂ©dia de que a humanidade beneficie; porque a arte Ă© a menos trĂĄgica das ocupaçÔes, porque isso nĂŁo envolve uma moral objectiva. Mas se todos os artistas da terra parassem durante umas horas, deixassem de produzir uma ideia, um quadro, uma nota de mĂșsica, fazia-se um deserto extraordinĂĄrio. Acreditem que os teares paravam, tambĂ©m, e as fĂĄbricas; as gares ficavam estranhamente vazias, as mulheres emudeciam. A arte Ă©, no entanto, uma coisa explosiva. Houve, e hĂĄ decerto em qualquer lugar da terra, pessoas que se dedicam Ă  experiĂȘncia inĂștil que Ă© a arte, pessoas como VirgĂ­lio, por exemplo, e que sabem que o seu silĂȘncio pode ser mortal. Se os poetas se calassem subitamente e sĂł ficasse no ar o ruĂ­do dos motores, porque atĂ© o vento se calava no fundo dos vales, penso que atĂ© as guerras se iam extinguindo, sem derrota e sem vitĂłria, com a mansidĂŁo das coisas estĂ©reis. O laço da ficção, que gera a expectativa, Ă© mais forte do que todas as realidades acumulĂĄveis. Se ele se quebra, o equilĂ­brio entre os seres sofre grave prejuĂ­zo.

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Os Portugueses SĂŁo Profundamente Vaidosos

Os Portugueses sĂŁo profundamente vaidosos. Quando me dizem que eu sou muito vaidosa, eu, nisso, sinto-me muito portuguesa. Quando, por exemplo, os Franceses me dizem, com uma linguagem muito catedrĂĄtica, «eu conheço muito bem os Portugueses atravĂ©s de toda essa onda de emigração, eles sĂŁo muito humildes e dizem que o lugar onde gostariam de morrer seria em França», eu digo «tenha cuidado, o portuguĂȘs mente sempre. É como o japonĂȘs, mente sempre.» Porque tem receio de mostrar o seu complexo de superioridade. Ele acha que Ă© imprudente e que Ă© atĂ© disparatado, mas que faz parte da sua natureza. Portanto, apresenta uma espĂ©cie de capa e de fisionomia de humildade, modĂ©stia, submissĂŁo. Mas nĂŁo Ă© nada disso, Ă© justamente o contrĂĄrio. Houve Ă©pocas da nossa HistĂłria em que a sua verdadeira natureza pĂŽde expandir-se sem cair no ridĂ­culo, mas hĂĄ outras em que nĂŁo. E entĂŁo, para se defender desse ridĂ­culo, o portuguĂȘs parece essa pessoa modesta, cordata, que nĂŁo levanta demasiados problemas, seja aos regimes seja na sua vida particular.

Personalidade Limitada

HĂĄ pessoas muito competentes no seu ofĂ­cio mas que nunca se adaptam a certos obstĂĄculos menores, como a nomes que desconhecem e saem do habitual. TambĂ©m nunca sabem usar uma chave de fendas e nĂŁo sĂŁo capazes de conhecer uma marca de carros pelas jantes, por exemplo. Cada indivĂ­duo tem um espaço muito limitado de operação e o seu cĂ©rebro trabalha num pequeno circuito de observaçÔes; a sua evolução Ă© restrita ao que o rodeia e aos factos exteriores mais prĂłximos. A educação sem grandes exigĂȘncias de comportamento social e intelectual, leva-os a formar uma personalidade mesquinha, Ă s vezes ressentida e admiradora de extremos, como da liderança dum chefe.

A CrĂ­tica Ă© Menos Eficaz do que o Exemplo

A crĂ­tica Ă© menos eficaz do que o exemplo. É de considerar se a grande sugestĂŁo para usar da crĂ­tica nos nossos tempos e que pĂ”e em causa todos os valores consagrados, nĂŁo Ă© o resultado duma anemia profunda do acto de vontade de toda uma sociedade. Todos temos consciĂȘncia de como o exemplo se tornou interdito, como o indivĂ­duo, na sua excepção perturbadora, Ă© causa de mal-estar. Dir-se-ia que a fraqueza, a breve virtude, a mediocridade, de interesses e de condiçÔes, tĂȘm prioridade sobre o modelo e a utopia. A par desta dimensĂŁo rasa do despotismo do demĂ©rito, levanta-se uma rajada de violĂȘncia. É de crer que a violĂȘncia Ă© hoje a linguagem bastarda da desilusĂŁo e o reverso do exemplo; representa a frustração do exemplo.

Os que Morrem por Amor

Os que morrem por amor continuam a pertencer Ă  lenda. Os seus funerais arrastam uma multidĂŁo piedosa, tal como decerto aconteceu na cidade de Verona, hĂĄ seiscentos anos. Ainda que nesse tempo os costumes fossem bastante fĂĄceis, a prĂĄtica erĂłtica da juventude era muito mais modesta. Reflectindo melhor, Ă© de crer que a prĂłpria licença produzisse um tipo de pessoas orgulhosas da sua intimidade afectiva; o que, se nĂŁo Ă© virtude, algo se parece. Este orgulho da prĂłpria intimidade conduz a uma atitude hostil em relação a tudo o que pode burocratizar os sentimentos. HĂĄ um sociĂłlogo inclinado a crer que existe muito de romantismo burocrĂĄtico no amor moderno. É possĂ­vel. E quando aparecem os contestatĂĄrios dessa espĂ©cie de burocracia, como sĂŁo os Romeus e Julietas do Candal, a cidade fica-lhes agradecida. No campo dos afectos trata-se da luta obstinada que resulta do choque entre a vida privada e o regime governativo; entre um corpo animado de impulsos e uma autoridade explicada por leis. AtravĂ©s de inquĂ©ritos feitos nos meios juvenis para inquirir das transformaçÔes que se efectuam no Ăąmbito das relaçÔes afectivas, deparam-se declaraçÔes bastante confusas. Elas pairam entre uma sinceridade elementar que descura a experiĂȘncia e teorias perfeitamente viciadas nos lugares-comuns do sĂ©culo.

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Com os Costumes andam os Aforismos

Com os costumes andam os aforismos. Assim, eis que eles tomam um carĂĄcter mais criticador e vibrante, isto na linguagem de Karl Kraus, homem sagaz e ventrĂ­loquo de certas causas que a sociedade nĂŁo confia Ă  voz pĂșblica.
Ele diz, por exemplo: «As mulheres, no Oriente, tĂȘm maior liberdade. Podem ser amadas». Ou entĂŁo: «A vida de famĂ­lia Ă© um ataque Ă  vida privada». Ou ainda: «A democracia divide os homens em trabalhadores e preguiçosos. NĂŁo estĂĄ destinada para aqueles que nĂŁo tĂȘm tempo para trabalhar». Tudo isto, como axioma, lembra Bernard Shaw, esse inglĂȘs azedo e endiabrado cujo Manual do RevolucionĂĄrio fez o encanto da nossa adolescĂȘncia.
Todavia, o aforimo do homem de letras, se impressiona, quase nunca comove ninguĂ©m. O autĂȘntico aforismo nĂŁo Ă© uma arte – Ă© uma espĂ©cie de pastorĂ­cia cultural. NĂŁo estĂĄ destinado a divertir nem a chocar as pessoas, mas, acima de tudo, propĂ”e-se transmitir uma orientação. É uma lição, e nĂŁo o pretexto para uma pirueta.
Os aforismos e paradoxos de Karl Kraus tĂȘm esse sabor irreverente que se diferencia da sabedoria, porque hĂĄ algo de precipitado na sua confissĂŁo. Precisam de ser situados num estado de espĂ­rito, para serem aceites e compreendidos;

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