Os Pássaros de Londres
Os pássaros de Londres
cantam todo o inverno
como se o frio fosse
o maior aconchego
nos parques arrancados
ao trânsito automóvel
nas ruas da neve negra
sob um céu sempre duro
os pássaros de Londres
falam de esplendor
com que se ergue o estio
e a lua se derrama
por praças tão sem cor
que parecem de pano
em jardins germinando
sob mantos de gelo
como se gelo fora
o linho mais bordado
ou em casas como aquela
onde Rimbaud comeu
e dormiu e estendeu
a vida desesperada
estreita faixa amarela
espécie de paralela
entre o tudo e o nada
os pássaros de Londresquando termina o dia
e o sol consegue um pouco
abraçar a cidade
Ă luz razante e forte
que dura dois minutos
nas árvores que surgem
subitamente imensas
no ouro verde e negro
que Ă© sua densidade
ou nos muros sem fim
dos bairros deserdados
onde nĂŁo sabes nĂŁo
se vida rogo amor
algum dia erguerĂŁo
do pavimento cĂnzeo
algum claro limite
os pássaros de Londres
cumprem o seu dever
de cidadãos britânicos
que nunca nunca viram
os céus mediterrânicos
Poemas sobre Frio de Mário Cesariny
2 resultadosde profundis amamus
Ontem
Ă s onze
fumaste
um cigarro
encontrei-te
sentado
ficámos para perder
todos os teus eléctricos
os meus
estavam perdidos
por natureza própriaAndámos
dez quilĂłmetros
a pé
ninguém nos viu passar
excepto
claro
os porteiros
Ă© da natureza das coisas
ser-se visto
pelos porteirosOlha
como sĂł tu sabes olhar
a rua os costumesO PĂşblico
o vinco das tuas calças
está cheio de frio
e há quatro mil pessoas interessadas
nissoNĂŁo faz mal abracem-me
os teus olhos
de extremo a extremo azuis
vai ser assim durante muito tempo
decorrerão muitos séculos antes de nós
mas nĂŁo te importes
nĂŁo te importes
muito
nĂłs sĂł temos a ver
com o presente
perfeito
corsários de olhos de gato intransponĂvel
maravilhados maravilhosos Ăşnicos
nem pretérito nem futuro tem
o estranho verbo nosso