Poemas sobre Vez de Rainer Maria Rilke

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Poemas de vez de Rainer Maria Rilke. Leia este e outros poemas de Rainer Maria Rilke em Poetris.

O Homem que LĂŞ

Eu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruĂ­do de chuva chegou Ă s janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difĂ­cil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexĂŁo
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tĂ­mida confusĂŁo de palavras
estava: tarde, tarde… em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
EntĂŁo sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vĂŁo pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.

E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
AĂ­ fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;

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A Canção do Idiota

NĂŁo me incomodam. Deixam-me ir.
Dizem que nĂŁo pode acontecer nada.
Ainda bem.
NĂŁo pode acontecer nada. Tudo chega e gira
sempre em torno do EspĂ­rito Santo,
em torno de determinado espírito (tu sabes) —
que bem.

NĂŁo, realmente nĂŁo deve pensar-se que haja
qualquer perigo nisso.
Sim, há o sangue.
O sangue Ă© o mais pesado. O sangue Ă© pesado.
Por vezes penso que não posso mais —
(Ainda bem.)

Ah, que linda bola;
vermelha e redonda como um Em-toda-a-parte.
Ainda bem que a criastes.
Ela vem quando se chama?

De que estranha maneira tudo se comporta,
apressa-se a juntar-se, separa-se nadando:
amigável, um pouco vago.
Ainda bem.

Tradução de Maria João Costa Pereira

O Homem que Contempla

Vejo que as tempestades vĂŞm aĂ­
pelas árvores que, à medida que os dias se tomam mornos,
batem nas minhas janelas assustadas
e ouço as distâncias dizerem coisas
que nĂŁo sei suportar sem um amigo,
que nĂŁo posso amar sem uma irmĂŁ.

E a tempestade rodopia, e transforma tudo,
atravessa a floresta e o tempo
e tudo parece sem idade:
a paisagem, como um verso do saltério,
é pujança, ardor, eternidade.

Que pequeno Ă© aquilo contra que lutamos,
como Ă© imenso, o que contra nĂłs luta;
se nos deixássemos, como fazem as coisas,
assaltar assim pela grande tempestade, —
chegarĂ­amos longe e serĂ­amos anĂłnimos.

Triunfamos sobre o que Ă© Pequeno
e o prĂłprio ĂŞxito torna-nos pequenos.
Nem o Eterno nem o Extraordinário
serĂŁo derrotados por nĂłs.
Este Ă© o anjo que aparecia
aos lutadores do Antigo Testamento:
quando os nervos dos seus adversários
na luta ficavam tensos e como metal,
sentia-os ele debaixo dos seus dedos
como cordas tocando profundas melodias.

Aquele que venceu este anjo
que tantas vezes renunciou Ă  luta.

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Infância

Passa lento o tempo da escola e a sua angĂşstia
com esperas, com infinitas e monótonas matérias.
Oh solidĂŁo, oh perda de tempo tĂŁo pesada…
E entĂŁo, Ă  saĂ­da, as ruas cintilam e ressoam
e nas praças as fontes jorram,
e nos jardins é tão vasto o mundo —.
E atravessar tudo isto em calções,
diferente de como os outros vão e foram —:
Oh tempo estranho, oh perda de tempo,
oh solidĂŁo.

E olhar tudo isto à distância:
homens e mulheres; homens, homens, mulheres
e crianças, tão diferentes e coloridas —;
e entĂŁo uma casa, e de vez em quando um cĂŁo
e o medo surdo trocando-se pela confiança:
Oh tristeza sem sentido, oh sonho, oh medo,
Oh infindável abismo.

E entĂŁo jogar: Ă  bola e ao arco,
num jardim que manso se desvanece
e por vezes tropeçar nos crescidos,
cego e embrutecido na pressa de correr e agarrar,
mas ao entardecer, com pequenos passos tĂ­midos,
voltar silencioso a casa, a mão agarrada com força —:
Oh compreensĂŁo cada vez mais fugaz,
Oh angĂşstia,

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