Sonetos sobre Céu

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Sonetos de céu escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Alma Fatigada

Nem dormir nem morrer na fria Eternidade!
Mas repousar um pouco e repousar um tanto,
Os olhos enxugar das convulsões do pranto,
Enxugar e sentir a ideal serenidade.

A graça do consolo e da tranqüilidade
De um céu de carinhoso e perfumado encanto,
Mas sem nenhum carnal e mórbido quebranto,
Sem o tédio senil da vã perpetuidade.

Um sonho lirial d’estrelas desoladas
Onde as almas febris, exaustas, fatigadas
Possam se recordar e repousar tranqüilas!

Um descanso de Amor, de celestes miragens,
Onde eu goze outra luz de místicas paisagens
E nunca mais pressinta o remexer de argilas!

No Mundo Quis Um Tempo Que Se Achasse

No mundo quis um tempo que se achasse
o bem que por acerto ou sorte vinha;
e, por exprimentar que dita tinha,
quis que a Fortuna em mim se exprimentasse.

Mas, por que meu destino me mostrasse
que nem ter esperanças me convinha,
nunca nesta tão longa vida minha
cousa me deixou ver que desejasse.

Mudando andei costume, terra e estado,
por ver se se mudava a sorte dura;
a vida pus nas mãos de um leve lenho.

Mas (segundo o que o Céu me tem mostrado)
já sei que deste meu buscar ventura,
achado tenho já, que não a tenho.

Se é Doce

Se é doce no recente, ameno Estio
Ver toucar-se a manhã de etéreas flores,
E, lambendo as areias e os verdores,
Mole e queixoso deslizar-se o rio;

Se é doce no inocente desafio
Ouvirem-se os voláteis amadores,
Seus versos modulando e seus ardores
Dentre os aromas de pomar sombrio;

Se é doce mares, céus ver anilados
Pela quadra gentil, de Amor querida,
Que esperta os corações, floreia os prados,

Mais doce é ver-te de meus ais vencida,
Dar-me em teus brandos olhos desmaiados.
Morte, morte de amor, melhor que a vida.

O Raio Cristalino S’estendia

O raio cristalino s’estendia
pelo mundo, da Aurora marchetada,
quando Nise, pastora delicada,
donde a vida deixava, se partia.

Dos olhos, com que o Sol escurecia,
levando a vista em lágrimas banhada,
de si, do Fado e Tempo magoada,
pondo os olhos no Céu, assi dezia:

-Nasce, sereno Sol, puro e luzente;
resplandece, fermosa e roxa Aurora,
qualquer alma alegrando descontente;

que a minha, sabe tu que, desd’agora,
jamais na vida a podes ver contente,
nem tão triste nenhüa outra pastora.

Inania Verba

Ah! quem há de exprimir, alma impotente e escrava,
O que a boca não diz, o que a mão não escreve?
– Ardes, sangras, pregada a’ tua cruz, e, em breve,
Olhas, desfeito em lodo, o que te deslumbrava…

O Pensamento ferve, e é um turbilhão de lava:
A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve…
E a Palavra pesada abafa a Idéia leve,
Que, perfume e dano, refulgia e voava.

Quem o molde achará para a expressão de tudo?
Ai! quem há de dizer as ânsias infinitas
Do sonho? e o céu que foge à mão que se levanta?

E a ira muda? e o asco mudo? e o desespero mudo?
E as palavras de fé que nunca foram ditas?
E as confissões de amor que morrem na garganta?!

Ah! Imiga Cruel, Que Apartamento

Ah! imiga cruel, que apartamento
é este que fazeis da pátria terra?
Quem do paterno ninho vos desterra,
glória dos olhos, bem do pensamento?

Is tentar da fortuna o movimento
e dos ventos cruéis a dura guerra?
Ver brenhas d’água, e o mar feito em serra,
levantado de um vento e d’outro vento?

Mas já que vos partis, sem vos partirdes,
para convosco o Céu tanta ventura,
que seja mor que aquela que esperardes.

E só nesta verdade ide segura:
que ficam mais saudades com partirdes,
do que breves desejos de chegardes.

À Luz da Lua!

Iamos sós pela floresta amiga,
Onde em perfumes o luar se evola,
Olhando os céus, modesta rapariga!
Como as crianças ao sair da escola.

Em teus olhos dormentes de fadiga,
Meio cerrados como o olhar da rola,
Eu ia lendo essa ballada antiga
D’uns noivos mortos ao cingir da estola…

A Lua-a-Branca, que é tua avozinha,
Cobria com os seus os teus cabellos
E dava-te um aspeto de velhinha!

Que linda eras, o luar que o diga!
E eu compondo estes versos, tu a lel-os,
E ambos scismando na floresta amiga…

Crença

Filha do céu, a pura crença é isto
Que eu vejo em ti, na vastidão das cousas,
Nessa mudez castíssima das lousas,
No belo rosto sonhador do Cristo.

A crença é tudo quanto tenho visto
Nos olhos teus, quando a cabeça pousas
Sobre o meu colo e que dizer não ousas
Todo esse amor que eu venço e que conquisto.

A crença é ter os peregrinos olhos
Abertos sempre aos ríspidos escolhos;
Tê-los à frente de qualquer farol

E conservá-los, simplesmente acesos
Como dois fachos — engastados, presos
Nas radiações prismáticas do sol!

Soneto VII – À Mesma Senhora

Alcíone, perdido o esposo amado,
Ao céu o esposo sem cessar pedia;
Porém as ternas preces surdo ouvia
O céu, de seus amores descuidado.

Em vão o pranto seu d’alma arrancado
Tenta a pedra minar da campa fria;
A morte de seu pranto escarnecia,
De seu cruel penar se ria o fado.

Mas ah! — não fora assim, se a voz tivera
Tão bela, tão gentil, tão doce e clara,
Daquela que hoje neste palco impera.

Se assim cantasse, o túmulo abalara
Do bem querido; e, branda a morte fera,
Vivo o extinto esposo lhe entregara.

Évora

Ao amigo vindo da luminosa Itália, a minha cidade, como eu soturno e triste…

Évora! Ruas ermas sob os céus
Cor de violetas roxas…Ruas frades
Pedindo em triste penitência a Deus
Que nos perdoe as míseras vaidades!

Tenho corrido em vão tantas cidades!
E só aqui recordo os beijos teus,
E só aqui eu sinto que são meus
Os sonhos que sonhei noutras idades!

Évora!…O teu olhar…o teu perfil…
Tua boca sinuosa, um mês de Abril,
Que o coração no peito me alvoroça!

…Em cada viela o vulto dum fantasma…
E a minh’alma soturna escuta e pasma…
E sente-se passar menina e moça…

Aos Olhos Dele

Não acredito em nada. As minhas crenças
Voaram como voa a pomba mansa,
Pelo azul do ar. E assim fugiram o
As minhas doces crenças de criança.

Fiquei então sem fé; e a toda gente
Eu digo sempre, embora magoada:
Não acredito em Deus e a Virgem Santa
É uma ilusão apenas e mais nada!

Mas avisto os teus olhos, meu amor,
Duma luz suavíssima de dor…
E grito então ao ver esses dois céus:

Eu creio, sim, eu creio na Virgem Santa
Que criou esse brilho que m’encanta!
Eu creio, sim, creio, eu creio em Deus!

As Estrelas

Lá, nas celestes regiões distantes,
No fundo melancólico da Esfera,
Nos caminhos da eterna Primavera
Do amor, eis as estrelas palpitantes.

Quantos mistérios andarão errantes,
Quantas almas em busca da Quimera,
Lá, das estrelas nessa paz austera
Soluçarão, nos altos céus radiantes.

Finas flores de pérolas e prata,
Das estrelas serenas se desata
Toda a caudal das ilusões insanas.

Quem sabe, pelos tempos esquecidos,
Se as estrelas não são os ais perdidos
Das primitivas legiões humanas?!

A Tua Voz de Primavera

Manto de seda azul, o céu reflete
Quanta alegria na minha alma vai!
Tenho os meus lábios úmidos: tomai
A flor e o mel que a vida nos promete!

Sinfonia de luz meu corpo não repete
O ritmo e a cor dum mesmo desejo… olhai!
Iguala o sol que sempre às ondas cai,
Sem que a visão dos poentes se complete!

Meus pequeninos seios cor-de-rosa,
Se os roça ou prende a tua mão nervosa,
Têm a firmeza elástica dos gamos…

Para os teus beijos, sensual, flori!
E amendoeira em flor, só ofereço os ramos,
Só me exalto e sou linda para ti!

Pequenina

À Maria Helena Falcão Risques

És pequenina e ris…A boca breve
É um pequeno idílio cor-de-rosa…
Haste de lírio frágil e mimosa!
Cofre de beijos feito sonho e neve!

Doce quimera que a nossa alma deve
Ao Céu que assim te fez tão graciosa!
Que desta vida amarga e tormentosa
Te fez nascer como um perfume leve!

O ver o teu olhar faz bem à gente…
E cheira e sabe, a nossa boca, a flores…
Quando o teu nome diz, suavemente…

Pequenina que a Mãe de Deus sonhou,
Que ela afaste de ti aquelas dores
Que fizeram de mim isto que sou!…

Torre De Ouro

Desta torre desfraldam-se altaneiras,
Por sóis de céus imensos broqueladas,
Bandeiras reais, do azul das madrugadas
E do íris flamejante das poncheiras.

As torres de outras regiões primeiras
No Amor, nas Glórias vãs arrebatadas
Não elevam mais alto, desfraldadas,
Bravas, triunfantes, imortais bandeiras.

São pavilhões das hostes fugitivas,
Das guerras acres, sanguinárias, vivas,
Da luta que os Espíritos ufana.

Estandartes heróicos, palpitantes,
Vendo em marcha passe aniquilantes
As torvas catapultas do Nirvana!

A Angústia

Nada em ti me comove, Natureza, nem
Faustos das madrugadas, nem campos fecundos,
Nem pastorais do Sul, com o seu eco tão rubro,
A solene dolência dos poentes, além.

Eu rio-me da Arte, do Homem, das canções,
Da poesia, dos templos e das espirais
Lançadas para o céu vazio plas catedrais.
Vejo com os mesmos olhos os maus e os bons.

Não creio em Deus, abjuro e renego qualquer
Pensamento, e nem posso ouvir sequer falar
Dessa velha ironia a que chamam Amor.

Já farta de existir, com medo de morrer,
Como um brigue perdido entre as ondas do mar,
A minha alma persegue um naufrágio maior.

Tradução de Fernando Pinto do Amaral

Noiva E Triste

Rola da luz do céu, solta e desfralda
Sobre ti mesma o pavilhão das crenças,
Constele o teu olhar essas imensas
Vagas do amor que no teu peito escalda.

A primorosa e límpida grinalda
Há de enflorar-te as amplidões extensas
Do teu pesar — há de rasgar-te as densas
Sombras — o véu sobre a luzente espalda…

Inda não ri esse teu lábio rubro
Hoje — inda n’alma, nesse azul delubro
Não fulge o brilho que as paixões enastra;

Mas, amanhã, no sorridor noivado,
A vida triste por que tens passado,
De madressilvas e jasmins se alastra.

Voz Fugitiva

Às vezes na tu’alma que adormece
Tanto e tão fundo, alguma voz escuto
De timbre emocional, claro, impoluto
Que uma voz bem amiga me parece.

E fico mudo a ouvi-la como a prece
De um meigo coração que está de luto
E livre, já, de todo o mal corruto,
Mesmo as afrontas mais cruéis esquece.

Mas outras vezes, sempre em vão, procuro
Dessa voz singular o timbre puro,
As essências do céu maravilhosas.

Procuro ansioso, inquieto, alvoroçado,
Mas tudo na tu’alma está calado,
No silêncio fatal das nebulosas.

XXXII

Como quisesse livre ser, deixando
As paragens natais, espaço em fora,
A ave, ao bafejo tépido da aurora,
Abriu as asas e partiu cantando.

Estranhos climas, longes céus, cortando
Nuvens e nuvens, percorreu: e, agora
Que morre o sol, suspende o vôo, e chora,
E chora, a vida antiga recordando …

E logo, o olhar volvendo compungido
Atrás, volta saudosa do carinho,
Do calor da primeira habitação…

Assim por largo tempo andei perdido:
– Ali! que alegria ver de novo o ninho,
Ver-te, e beijar-te a pequenina mão!

O Grande Momento

Inicia-te, enfim, Alma imprevista,
Entra no seio dos Iniciados.
Esperam-te de luz maravilhados
Os Dons que vão te consagrar Artista.

Toda uma Esfera te deslumbra a vista,
Os ativos sentidos requintados.
Céus e mais céus e céus transfigurados
Abrem-te as portas da imortal Conquista.

Eis o grande Momento prodigioso
Para entrares sereno e majestoso
Num mundo estranho d’esplendor sidéreo.

Borboleta de sol, surge da lesma…
Oh! vai, entra na posse de ti mesma,
Quebra os selos augustos do Mistério!