Sonetos sobre Lados de Cruz e Souza

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Sonetos de lados de Cruz e Souza. Leia este e outros sonetos de Cruz e Souza em Poetris.

Presa Do Ódio

Da tu’alma na funda galeria
Descendo às vezes, eu às vezes sinto
Que como o mais feroz lobo faminto
Teu ódio baixo de alcatéia espia.

Do Desespero a noite cava e fria,
De boêmias vis o pérfido absinto
Pôs no teu ser um negro labirinto,
Desencadeou sinistra ventania.

Desencadeou a ventania rouca,
surda, tremenda, desvairada, louca,
Que a tu’alma abalou de lado a lado.

Que te inflamou de cóleras supremas
e deixou-te nas trágicas algemas
Do teu ódio sangrento acorrentado!

O Final Do Guarani

(Santos, 15 jul. 1883)

Ceci — é a virgem loira das brancas harmonias,
A doce-flor-azul dos sonhos cor de rosa,
Peri — o índio ousado das bruscas fantasias,
O tigre dos sertões — de alma luminosa.

Amam-se com o amor indômito e latente
Que nunca foi traçado nem pode ser descrito.
Com esse amor selvagem que anda no infinito.
E brinca nos juncais, — ao lado da serpente.

Porém… no lance extremo, o lance pavoroso,
Assim por entre a morte e os tons de um puro gozo,
Dos leques da palmeira a note musical…

Vão ambos a sorrir, às águas arrojados,
Mansos como a luz, tranqüilos, enlaçados
E perdem-se na noite serena do ideal!…

Clamor Supremo

Vem comigo por estas cordilheiras!
Põe teu manto e bordão e vem comigo,
Atravessa as montanhas sobranceiras
E nada temas do mortal Perigo!

Sigamos para as guerras condoreiras!
Vem, resoluto, que eu irei contigo
Dentre as Águias e as chamas feiticeiras,
Só tendo a Natureza por abrigo.

Rasga florestas, bebe o sangue todo
Da Terra e transfigura em astros lodo,
O próprio lodo torna mais fecundo.

Basta trazer um coração perfeito,
Alma de eleito, Sentimento eleito
Para abalar de lado a lado o mundo!

Mãe E Filho

Às mães desamparadas

Jesus, meu filho, o encanto das crianças,
Quando na cruz, de angustia espedaçado,
Em sangue casto e límpido banhado,
Manso, tão manso como as pombas mansas;

Embora as duras e afiadas lanças
Com que os judeus, tinham, de lado a lado,
Seu coração puríssimo varado,
Inda no olhar raiavam-lhe esperanças.

Por isso, ó filho, ó meu amor — se a esmola
De algum conforto essencial não rola
Por nós — é forca conduzir a cruz!…

Mas, volta ó filho, pesaroso e triste.
Se a nossa vida só na dor consiste,
Ah! minha mãe, por que morreu Jesus?…

Celeste

Aos corações ideais

Lembra-me ainda — ao lado de um repuxo,
Pela brancura de um luar de agosto,
O teu maninho, um loiro pequerrucho
Brincava, rindo, te afagando o rosto…

Lembra-me ainda — as sombras do sol posto,
Numa saleta sem brasões de luxo,
De alguns bordados de fineza e gosto
Delineavas o gentil debuxo…

E o gás que forte e cintilante ardia,
Te iluminava, te alagava… ria…
Da luz ficavas no imponente abrigo.

E agora… deixa que ao cair da noite,
Esta lembrança dentro de mim se acoite,
Como a andorinha no telhado amigo!

Na Fonte

Bem ao lado da gruta a fonte corre
Trepidamente, as águas encrespando,
Em murmúrios crebos, levantando
Uns chamalotes prateados — morre

No monte o sol que a luz no oceano escorre
E ainda eu vejo, as sombras afrontando,
Uma mulher que lava, mesmo quando
O sol mais rubro, mais vermelho jorre.

— É num sítio afastado, um sítio ermo…
Pássaros cortam vastidões sem termo,
Borboletas azuis roçam nas águas.

— E a mulher lava, enrubescida a face;
Lava, cantando, como se lavasse
As suas tristes e profundas mágoas.

Minh’alma Está Agora Penetrando

Minh’alma está agora penetrando
Lá na etérea plaga, cristalina!
Que música meu Deus febril, divina
Nos páramos azuis vai retumbando!

Além, d’áureo dossel se está rasgando
Custosa, de primor, esmeraldina
Diáfana, sutil, longa cortina
Enquanto céus se vão duplando!

Em grande pedestal marmorizado
De Paiva se divisa o busto enorme
Soberbo como o sol, de luz croado

De um lado o porvir — Antheu disforme
Dos lábios faz soltar pujante brado
Hosanas! não morreu! apenas dorme.