Sonetos sobre Ombros

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Sonetos de ombros escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Soneto XXXII

Ao Reitor António de Mendonça

Famoso Alcides, que nos ombros altos
Esta soberba mĂĄquina sustentas,
E de Atlante a pessoa representas,
Que nunca de virtude os achou faltos.

Seguros sem temor, sem sobre saltos
Andem quantos por teus experimentas,
Que apesar de mil hĂłrridas tormentas,
Resistiram contigo a seus assaltos.

Com tais ombros soster o mundo podes,
E se hoje te deténs neste trabalho
É um ensaio para mores coisas,

Que como a todo peso sempre acodes,
E vas subindo acima por atalho,
Para cansares mais, aqui repousas.

Cheiro De EspĂĄdua

“Quando a valsa acabou, veio Ă  janela,
Sentou-se. O leque abriu. Sorria e arfava,
Eu, viração da noite, a essa hora entrava
E estaquei, vendo-a decotada e bela.

Eram os ombros, era a espĂĄdua, aquela
Carne rosada um mimo! A arder na lava
De improvisa paixĂŁo, eu, que a beijava,
Hauri sequiosa toda a essĂȘncia dela!

Deixei-a, porque a vi mais tarde, oh! ciĂșme!
Sair velada da mantilha. A esteira
Sigo, até que a perdi, de seu perfume.

E agora, que se foi, lembrando-a ainda,
Sinto que Ă  luz do luar nas folhas, cheira
Este ar da noite Ă quela espĂĄdua linda!”

Diferente

Buscando o vĂŁo Ideal que me seduz,
Sem que o atinja me disperso e gasto,
E ansiosamente aos braços duma cruz
Ergo o perfil de iluminado e casto.

JĂĄ tristemente desdenhoso afasto
O manto de burel dos ombros nus;
E a noite pisa a forma do meu rasto,
Se deixo atrĂĄs de mim passos de luz.

Na minha tez suave e nazarena,
Transparecem vislumbres dessa pena
Que Deus pelos estranhos hĂ  sentido…

E frio e calmo, a divergir da Raça,
Mal poiso os låbios no cristal da taça
Por onde as outras almas tĂȘm bebido!

ProdĂ­gio!

Como o Rei Lear nĂŁo sentes a tormenta
Que te desaba na fatal cabeça!
(Que o cĂ©u d’estrelas todo resplandeça.)
A tua alma, na Dor, mais nobre aumenta.

A Desventura mais sanguinolenta
Sobre os teus ombros impiedosa desça,
Seja a treva mais funda e mais espessa,
Todo o teu ser em mĂșsicas rebenta.

Em mĂșsicas e em flores infinitas
De aromas e de formas esquisitas
E de um mistĂ©rio singular, nevoento…

Ah! sĂł da Dor o alto farol supremo
Consegue iluminar, de extremo a extremo,
o estranho mar genial do Sentimento!

Ante Deus

Quando te vi eu fui o teu voar
E desci Deus pra me encontrar em mim.
Voei-me sobre pontes de marfim
E uma das pontes, Deus, em meu olhar!

Aureolei-me de oiro em sombra fria
E meus voos caĂ­ram destruĂ­dos.
Foram dedos de Deus os meus sentidos.
Meu Corpo andou ao colo de Maria.

Agora durmo Cristo em véus pagãos.
SĂŁo tapetes de Deus as minhas mĂŁos.
Regresso Ânsia pra alcançar os cĂ©us.

Ergo-me mais. Sou o perfil da Dor.
Sobre os ombros de Deus olho em redor
E Deus nĂŁo sabe qual de nĂłs Ă© Deus!

O IncĂȘndio De Roma

Raiva o incĂȘndio. A ruir, soltas, desconjuntadas,
As muralhas de pedra, o espaço adormecido
De eco em eco acordando ao medonho estampido,
Como a um sopro fatal, rolam esfaceladas.

E os templos, os museus, o CapitĂłlio erguido
Em mĂĄrmor frĂ­gio, o Foro, as erectas arcadas
Dos aquedutos, tudo as garras inflamadas
Do incĂȘndio cingem, tudo esbroa-se partido.

Longe, reverberando o clarĂŁo purpurino,
Arde em chamas o Tibre e acende-se o horizonte.
Impassível, porém, no alto do Palatino,

Nero, com o manto grego ondeando ao ombro, assoma
Entre os libertos, e ébrio, engrinaldada a fronte,
Lira em punho, celebra a destruição de Roma.

Primeiras VigĂ­lias

Dos revoltos lençóis sobre o deserto
Despejava-se, em ondas silenciosas,
O luar dessas noites vaporosas,
De seu lĂąnguido cĂĄlix todo aberto.

Rangia a cama, e deslizavam, perto
Alvas, femĂ­neas formas ondulosas;
E eu a idear, nas Ăąnsias amorosas,
Uns ombros nus, um colo descoberto.

E a gemer: – “Abeirai-vos de meu leito,
Ó sensuais visĂ”es da adolescĂȘncia,
E inflamai-vos na pira em que me inflamo!

Fervem paixÔes despertas no meu peito;
Descai a flor virgĂ­nea da inocĂȘncia,
E irrompe o fruto dolorido… Eu amo!”

Equu (Para O Poeta Rafael Courtoisie)

Nos astros me perdia logo cedo
enquanto a luz vestia-me de noites.
EntĂŁo chorava no meu ombro o enredo
grave galope breve com seus coices.

As éguas do destino cospem medos
sabendo-me alazĂŁo de muitas foices,
ou pangaré lunar dos meus degredos.
Por isso perseguiam-me nas noites

Ă quelas mais escuras sem estrelas
nas quais sou presa fĂĄcil sem que fosse
porque flechando verbos sei contĂȘ-las.

Não eram éguas mouras dos desertos
senão potrancas férteis com seus roces
estas que vinham mansas muito perto.

Sou Eu!

À minha ilustre camarada Laura haves

Pelos campos em fora, pelos combros,
Pelos montes que embalam a manhĂŁ,
Largo os meus rubros sonhos de pagĂŁ,
Enquanto as aves poisam nos meus ombros…

Em vĂŁo me sepultaram entre escombros
De catedrais duma escultura vĂŁ!
Olha-me o loiro sol tonto de assombros,
as nuvens, a chorar, chamam-me irmĂŁ!

Ecos longĂ­nquos de ondas… de universos..
Ecos dum Mundo… dum distante AlĂ©m,
Donde eu trouxe a magia dos meus versos!

Sou eu! Sou eu! A que nas mĂŁos ansiosas
Prendeu da vida, assim como ninguém,
Os maus espinhos sem tocar nas rosas!

Auréola Equatorial

A Teodoreto Souto

Fundi em bronze a estrofe augusta dos prodĂ­gios,
Poetas do Equador, artĂ­sticos Barnaves;
Que o facho — Abolição — rasgando as nuvens graves
De raios e bulcĂ”es — triunfa nos litĂ­gios!

— O rei Mamoud, o Sol, vibrou p’raquelas bandas
do Norte — a grande luz — elĂ©trico, explodindo,
Assim como quem vai, intrépido, subindo
À luz da idade nova — em claras propagandas.

— Os pĂĄssaros titĂŁs nos seus conciliĂĄbulos,
— Chilreiam, vĂŁo cantando em mĂ­sticos vocĂĄbulos,
Alargam-se os pulmÔes nevrålgicos das zonas;

Abri alas, abri! — Que em tĂșnica de assombros,
IrĂĄ passar por vĂłs, com a Liberdade aos ombros,
Como um colosso enorme o impĂĄvido Amazonas!

Soneto Presunçoso

Que forma luminosa me acompanha
quando, entre o lusco e o fusco, bebo a voz
do meu tempo perdido, e um rio banha
tudo o que caminhei da fonte Ă  foz?

Dos homens desde o berço enfrento a sanha
que os difere da abelha e do albatroz.
Meu irmĂŁo, meu algoz! No perde-e-ganha
quem ganhou, quem perdeu, nĂŁo fomos nĂłs.

O mundo nada pesa. Atlas, sinto
a leveza dos astros nos meus ombros.
Minha alma desatenta Ă© mais pesada.

Quer ganhe ou perca, sou verdade e minto.
Se pergunto, a resposta Ă© dos assombros.
No sol a pino finjo a madrugada.

Passional

És lñnguida e amorosa quando estás sozinha
e em teu corpo perfeito este amor apoteosas!
Nos teus olhos distantes, tudo se adivinha
e hĂĄ um teu beijo um sabor encarnado de rosas!

Nasceste com certeza para ser rainha,
e o serias na certa, das mais poderosas!
– no entanto, aqui te tenho escrava, e sendo minha
cabes toda e inteirinha em minhas mĂŁos nervosas!

Os teus cabelos louros, soltos sobre o leito
espalham-se em meu ombro, emolduram teu rosto,
e, quando assim te sinto abatida em meu peito

os teus olhos castanhos, mĂ­sticos, oblongos,
vĂŁo morrendo em desmaios roxos de sol posto
sob a noite de seda dos teus cĂ­lios longos!

Ternura

Desvio dos teus ombros o lençol,
que Ă© feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol nĂŁo vem mais nada…

Olho a roupa no chĂŁo: que tempestade!
HĂĄ restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobreveio…

Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lĂĄ fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo…

Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sĂłs!