Sonetos sobre Seguros

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Sonetos de seguros escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

De Vós Me Aparto, Ó Vida! Em Tal Mudança

De vós me aparto, ó vida! Em tal mudança,
sinto vivo da morte o sentimento.
NĂŁo sei para que Ă© ter contentamento,
se mais há de perder quem mais alcança.

Mas dou vos esta firme segurança
que, posto que me mate meu tormento,
pelas águas do eterno esquecimento
segura passará minha lembrança.

Antes sem vós meus olhos se entristeçam,
que com qualquer cous’ outra se contentem;
antes os esqueçais, que vos esqueçam.

Antes nesta lembrança se atormentem,
que com esquecimento desmereçam
a glĂłria que em sofrer tal pena sentem.

XLV

A cada instante, Amor, a cada instante
No duvidoso mar de meu cuidado
Sinto de novo um mal, e desmaiado
Entrego aos ventos a esperança errante.

Por entre a sombra fĂşnebre, e distante
Rompe o vulto do alivio mal formado;
Ora mais claramente debuxado,
Ora mais frágil, ora mais constante.

Corre o desejo ao vĂŞ-lo descoberto;
Logo aos olhos mais longe se afigura,
O que se imaginava muito perto.

Faz-se parcial da dita a desventura;
Porque nem permanece o dano certo,
Nem a glória tão pouco está segura

Quando O Sol Encoberto Vai Mostrando

Quando o Sol encoberto vai mostrando
ao mundo a luz quieta e duvidosa,
ao longo de ĂĽa praia deleitosa,
vou na minha inimiga imaginando.

Aqui a vi, os cabelos concertando;
ali, co a mĂŁo na face tĂŁo fermosa;
aqui, falando alegre, ali cuidosa;
agora estando queda, agora andando.

aqui esteve sentada, ali me viu,
erguendo aqueles olhos tĂŁo isentos;
aqui movida um pouco, ali segura;

qui se entristeceu, ali se riu;
enfim, nestes cansados pensamentos
passo esta vida vĂŁ, que sempre dura.

Havendo Escapado de uma Grande Doença

Foi tĂŁo cruel, tĂŁo duramente forte
A que passei tormenta repetida,
Que não fazendo já conta da vida,
SĂł chegava a fazer caso da morte.

Mas lastimada de meu mal a sorte,
Quando já me notava na partida,
Propícia e favorável me convida
Com porto alegre, com seguro norte.

Altiva torre fabriquei no vento,
Mas a esperança, vã que nela tive
O vento ma levou que sempre corre.

Do mundo o céu nos dê conhecimento,
Que a desgraça é morrer como quem vive,
E a ventura Ă© viver como quem morre.

O Sábio não Vai em Grossos Rios

QuĂŁo bem aventurado e quĂŁo ditoso
O sábio é, que parco passa a vida
Medindo, alegre, a entrada co’a saĂ­da
Do Mundo vĂŁo, sem medo do invejoso!

Quem c’o pouco que tem vive gostoso,
Cos desejos nĂŁo tem sĂ´frega lida.
Como subir nĂŁo quer, nunca a caĂ­da
Teme, do vĂŁo Faetonte desejoso.

Se tem sede, nĂŁo vai em grossos rios
Beber, sĂ´frego, a farto nas correntes,
Porque teme cair em seus baixios.

Pequena fonte vai buscar, prudente,
Onde bebe, seguro dos bravios
Enrolados cachões da altiva enchente.

Supremo Anseio

Esta profunda e intérmina esperança
Na qual eu tenho o espĂ­rito seguro,
A tão profunda imensidade avança
Como é profunda a idéia do futuro.

Abre-se em mim esse clarĂŁo, mais puro
Que o céu preclaro em matinal bonança:
Esse clarĂŁo, em que eu melhor fulguro,
Em que esta vida uma outra vida alcança.

Sim! Inda espero que no fim da estrada
Desta existência de ilusões cravada
Eu veja sempre refulgir bem perto

Esse clarĂŁo esplendoroso e louro
Do amor de mĂŁe — que Ă© como um fruto de ouro,
Da alma de um filho no eternal deserto.

Soneto XXV

Do bravo mar onde Ă s voltas ando
Ora temendo as ondas, ora o vento,
Na esperança maior de salvamento,
A minha barca vai Ă  costa dando.

Pus os olhos na costa, imaginando
Achar remanso de pirigo isento,
Vendo, porém, frustrado o pensamento,
Louvo o mar já demais seguro e brando.

Ai fementido amor, amor tirano,
Que onde minha esperança tinha posta
Me trouxeste a fazer naufrágio amargo.

Porém ainda comigo foste humano,
Que mais quero perder-me dando Ă  costa,
Que andar com mil temores em mar largo.

XXXIX

Breves horas, Amor, há, que eu gozava
A glĂłria, que minha alma apetecia;
E sem desconfiar da aleivosia,
Teu lisonjeiro obséquio acreditava.

Eu sĂł Ă  minha dita me igualava;
Pois assim avultava, assim crescia,
Que nas cenas, que entĂŁo me oferecia,
O maior gosto, o maior bem lograva;

Fugiu, faltou-me o bem: já descomposta
Da vaidade a brilhante arquitetura,
VĂŞ-se a ruĂ­na ao desengano exposta:

Que ligeira acabou, que mal segura!
Mas que venho a estranhar, se estava posta
Minha esperança em mãos da formosura!

Morte, JuĂ­zo, Inferno e ParaĂ­so

Em que estado, meu bem, por ti me vejo,
Em que estado infeliz, penoso e duro!
Delido o coração de um fogo impuro,
Meus pesados grilhões adoro e beijo.

Quando te logro mais, mais te desejo;
Quando te encontro mais, mais te procuro;
Quando mo juras mais, menos seguro
Julgo esse doce amor, que adorna o pejo.

Assim passo, assim vivo, assim meus fados
Me desarreigam d’alma a paz e o riso,
Sendo sĂł meu sustento os meus cuidados;

E, de todo apagada a luz do siso,
Esquecem-me (ai de mim!) por teus agrados
Morte, JuĂ­zo, Inferno e ParaĂ­so.

Ah! Imiga Cruel, Que Apartamento

Ah! imiga cruel, que apartamento
é este que fazeis da pátria terra?
Quem do paterno ninho vos desterra,
glĂłria dos olhos, bem do pensamento?

Is tentar da fortuna o movimento
e dos ventos cruéis a dura guerra?
Ver brenhas d’água, e o mar feito em serra,
levantado de um vento e d’outro vento?

Mas já que vos partis, sem vos partirdes,
para convosco o CĂ©u tanta ventura,
que seja mor que aquela que esperardes.

E sĂł nesta verdade ide segura:
que ficam mais saudades com partirdes,
do que breves desejos de chegardes.

SolilĂłquio

Já que o sol pouco a pouco se desmaia
E meu mal cada vez mais se desvela,
Enquanto a pena, a ânsia, a mágoa vela,
Quero aqui estar sozinho nesta praia.

Que bravo o mar se vĂŞ! Como se ensaia
Na fĂşria e contra os ares se rebela!
Como se enrola! Como se encapela!
Parece quer sair da sua raia.

Mas também que inflexível, que constante
Aquela penha está à força dura
De tanto assalto e horror perseverante!

Ă“ empolado mar, penha segura,
Sois a imagem mais prĂłpria e semelhante
De meu fado e da minha desventura.

LXXVII

Não há no mundo fé, não há lealdade;
Tudo é, ó Fábio, torpe hipocrisia;
Fingido trato, infame aleivosia
Rodeiam sempre a cândida amizade.

Veste o engano o aspecto da verdade;
Porque melhor o vĂ­cio se avalia:
Porém do tempo a mísera porfia,
Duro fiscal, lhe mostra a falsidade.

Se talvez descobrir-se se procura
Esta de amor fantástica aparência,
É como à luz do Sol a sombra escura:

Mas que muito, se mostra a experiĂŞncia,
Que da amizade a torre mais segura
Tem a base maior na dependĂŞncia!

Tomava Daliana Por Vingança

Tomava Daliana por vingança
da culpa do pastor que tanto amava,
casar com Gil vaqueiro; e em si vingava
o erro alheio e pérfida esquivança.

A discrição segura, a confiança,
as rosas que seu rosto debuxava,
o descontentamento lhas secava,
que tudo muda üa áspera mudança.

Gentil planta disposta em seca terra,
lindo fruito de dura mĂŁo colhido,
lembranças d’outro amor, e fĂ© perjura,

tornaram verde prado em dura serra;
interesse enganoso, amor fingido,
fizeram desditosa a fermosura.

Que Pode Já Fazer Minha Ventura

Que pode já fazer minha ventura
que seja para meu contentamento.,
Ou como fazer devo fundamento
de cousa que o nĂŁo tem, nem Ă© segura?

Que pena pode ser tĂŁo certa e dura
que possa ser maior que meu tormento?
Ou como receará meu pensamento
os males, se com eles mais se apura?

Como quem se costuma de pequeno
com peçonha criar por mão ciente,
da qual o uso já o tem seguro;

assi de acostumado co veneno,
o uso de sofrer meu mal presente
me faz não sentir já nada o futuro.

Quem Quiser Ver D’amor Ăśa ExcelĂŞncia

Quem quiser ver d’Amor ĂĽa excelĂŞncia
onde sua fineza mais se apura,
atente onde me põe minha ventura,
por ter de minha fé experiência.

Onde lembranças mata a longa ausência,
em temeroso mar, em guerra dura,
ali a saudade está segura,
quando mor risco corre a paciĂŞncia.

Mas ponha me Fortuna e o duro Fado
em nojo, morte, dano e perdição,
ou em sublime e prĂłspera ventura;

Ponha me, enfim, em baixo ou alto estado;
que até na dura morte me acharão
na lĂ­ngua o nome, n’alma a vista pura.

Mil Anos Há que Busco a Minha Estrela

Mil anos há que busco a minha estrela
E os Fados dizem que ma tĂŞm guardada;
Levantei-me de noite e madrugada,
Por mais que madruguei, nĂŁo pude vĂŞ-la.

Já não espero haver alcance dela
SenĂŁo depois da vida rematada,
Que deve estar nos céus tão remontada
Que só lá poderei gozá-la e tê-la.

Pensamentos, desejos, esperança,
NĂŁo vos canseis em vĂŁo, nĂŁo movais guerra,
Façamos entre os mais uma mudança:

Para me procurar vida segura
Deixemos tudo aquilo que há na terra,
Vamos para onde temos a ventura.

Verdade, Amor, RazĂŁo, Merecimento

Verdade, Amor, RazĂŁo, Merecimento,
qualquer alma farĂŁo segura e forte;
porém, Fortuna, Caso, Tempo e Sorte,
tĂŞm do confuso mundo o regimento.

Efeitos mil revolve o pensamento
e nĂŁo sabe a que causa se reporte;
mas sabe que o que Ă© mais que vida e morte,
que não o alcança humano entendimento.

Doctos varões darão razões subidas,
mas sĂŁo experiĂŞncias mais provadas,
e por isso Ă© melhor ter muito visto.

Cousas há i que passam sem ser criadas
e cousas criadas há sem ser passadas,
mas o melhor de tudo Ă© crer em Cristo.

O tempo acaba o ano, o mĂŞs e a hora

O tempo acaba o ano, o mĂŞs e a hora,
A força, a arte, a manha, a fortaleza;
O tempo acaba a fama e a riqueza,
O tempo o mesmo tempo de si chora;

O tempo busca e acaba o onde mora
Qualquer ingratidĂŁo, qualquer dureza;
Mas nĂŁo pode acabar minha tristeza,
Enquanto nĂŁo quiserdes vĂłs, Senhora.

O tempo o claro dia torna escuro
E o mais ledo prazer em choro triste;
O tempo, a tempestade em grão bonança.

Mas de abrandar o tempo estou seguro
O peito de diamante, onde consiste
A pena e o prazer desta esperança.

Cantando Estava Um Dia Bem Seguro Quando

Cantando estava um dia bem seguro quando,
passando, SĂ­lvio me dizia
(SĂ­lvio, pastor antigo, que sabia
pelo canto das aves o futuro):

-MĂ©ris, quando quiser o fado escuro,
oprimir-te virĂŁo em um sĂł dia
dous lobos; logo a voz e a melodia
te fugirĂŁo, e o som suave e puro.

Bem foi assi: porque um me degolou
quanto gado vacum pastava e tinha,
de que grandes soldadas esperava;

E outro por meu dano me matou
a cordeira gentil que eu tanto amava,
perpétua saudade da alma minha!

Mais Há-de Perder quem Mais Alcança

De vós me parto, ó vida, e em tal mudança
Sinto vivo da morte o sentimento.
NĂŁo sei para que Ă© ter contentamento,
Se mais há-de perder quem mais alcança!

Mas dou-vos esta firme segurança:
Que, posto que me mate o meu tormento,
Pelas águas do eterno esquecimento
Segura passará minha lembrança.

Antes sem vós meus olhos se entristeçam,
Que com cousa outra alguma se contentem:
Antes os esqueçais, que vos esqueçam.

Antes nesta lembrança se atormentem,
Que com esquecimento desmereçam
A glĂłria que em sofrer tal pena sentem.